Carros cada vez maiores e com desenho em que as concessões ao design se sobrepõem às necessidades funcionais são uma tendência crescente nas estradas, dificultando, porém, alguns aspetos da condução. Um deles é o da visibilidade que, por vezes, acaba por ser limitada em determinados ângulos, o que pressupõe uma redução da segurança a nível geral.

Mas nem só por razões estéticas se pode dizer que os veículos oferecem alguns ângulos pouco interessantes no que à visibilidade diz respeito. Considerem-se os pilares A (que lateralizam o para-brisas), por exemplo, cuja grossura consegue ser, nalgumas vezes, obstrutiva para o campo de visão dianteira.

Tal prende-se com a questão da segurança, visando responder a uma maior exigência no capítulo dos embates e à proteção dos ocupantes, mas também com uma própria necessidade dinâmica, uma vez que ajudam à rigidez estrutural do veículo. Junte-se à equação o facto de os espelhos retrovisores não conseguirem mostrar toda a envolvência da secção traseira e o resultado é uma série de fatores que redundam em potenciais acidentes.

Motociclistas mais afetados

Neste cenário, num momento em que o número de motociclistas tem aumentado nas estradas (só este ano, entre janeiro e novembro, as vendas de motociclos aumentaram 11,1%, segundo dados da ACAP), acabam estes por serem também dos mais afetados pelas dificuldades de visibilidade dos condutores de automóveis ao não se aperceberem da sua presença naquilo que se convencionou apelidar de ‘ângulo morto’, ou seja, um ponto visual ao qual o condutor não consegue ter acesso pelo espelho retrovisor (por vezes, até mesmo por ‘culpa’ do pilar C).

Para resolver estes casos, é importante a ação dos construtores automóveis, que não têm poupado esforços na aplicação de sistemas tecnológicos de assistência à condução que visam minorar ou impedir, por completo, a ocorrência de acidentes, seja com outros carros, seja com motociclos. Cada vez mais comuns, os sistemas de deteção de objetos no ângulo morto revelam-se fulcrais para uma maior segurança, sobretudo em ambiente urbano.

Também ajuda, certamente, ter os espelhos retrovisores ajustados para que se obtenha sempre uma imagem nítida do que está atrás do veículo. Mas e se houver outras razões?

Biologia não ajuda

Como a própria visão também é falível e o seu grau de eficácia varia de pessoa para pessoa, os motociclistas acabam por ser, também, afetados por duas categorizações: são móveis e velozes (por vezes, bastante) e, além disso, ocupam uma dimensão reduzida na estrada, sendo quase impercetíveis a uma grande distância. Como o cérebro humano tende a ter dificuldades na compreensão de imagens visuais em locais inesperados, a ‘imagem’ de um motociclista apenas é apreendida, muitas vezes, numa franja de tempo já iminente a um embate.

A explicação é simples. Muitas vezes, para limitar a dispersão de atenção do cérebro, este órgão fornece ‘imagens’ guardadas em segundo plano para retratar a envolência (se se tratasse de um computador, poder-se-ia fazer uma comparação com ‘cache’) de forma a aumentar a concentração num aspeto singular à qual o olhar e o cérebro precisam de votar a sua total atenção. Esta situação é ainda mais evidente quando se está em território familiar, como por exemplo, no seu posto de trabalho ou em casa, onde as ocorrências não divergem do esperado. Como peças acessórias num puzzle. Em ambiente estranho, como num local em que se encontra pela primeira vez, tende a receber uma maior capacidade de informação para captar todos os detalhes que o olho alcança e compreendê-los, ou seja, torna-se mais desperto. Na estrada, sucede algo semelhante, sobretudo quando se está num local em que não se conta ter um motociclista em sentido contrário num cruzamento ou quando um peão atravessa a estrada num local inesperado: o cérebro pode não conseguir ‘antecipar’ uma situação de perigo.

Retomando o tema do cruzamento para exemplificar: imagine-se um condutor que pretende virar à esquerda numa estrada nacional e em sentido contrário vem uma moto a uma velocidade constante de 90 km/h que o condutor não identifica dada a distância a que se encontram um do outro. Mesmo que o condutor olhe para o lado correto e com o tempo que leva a olhar para o lado direito e de novo para o esquerdo, no momento em que identifica a moto, o cérebro é apanhado de surpresa, tardando a reagir.

Formas de melhorar

Durante a condução, a olhar humano é orientado quase automaticamente para a frente, o que torna a denominada visão periférica mais diminuta. Assim, fora do campo de visão são necessários estímulos para nos fazer virar a cabeça, seja um movimento lateral ou uma luz a piscar apreendida pelo espelho retrovisor.

Contornando de alguma forma este problema, uma boa maneira de ‘treinar’ a visão é através da análise constante do ambiente em redor, olhando amiúde e de forma rápida para tudo o que ladeia o automóvel (em locais em que tal seja seguro), votando para isso atenção à tríade de espelhos retrovisores que se encontram à disposição. Quanto mais imagens o cérebro conseguir apreender, melhor é a sua imagem mental e qualidade de interpretação de cada situação.