Novembro de 1989, Wolfsburgo, fronteira com a antiga RDA. O muro de Berlim caiu há pouco mais de duas semanas e este é o primeiro fim de semana de abertura. As autobahn junto à fronteira estão pejadas de Trabant que deixam um rasto de fumo branco e aquele odor inconfundível do motor a dois tempos. Os autocolantes “DDR” colados na traseira dos “trabis” são rapidamente ajustados aos tempos que aí vêm: o D de Demokratische o R de Republike são tapados com fita isoladora. Sobra, como nos carros do lado de cá da fronteira, o D de Deutschland… A unificação das duas Alemanhas começava ali mesmo, na beira da estrada.

Nas áreas de serviço, famílias vindas de Leste olham para os menus coloridos com o deslumbre de quem lê uma história colorida pela primeira vez na sua vida. E, na verdade, faz-se História naquele dia ensolarado e frio.

Um grupo de jornalistas portugueses viaja de carro até à fábrica-mãe da Volkswagen, precisamente em Wolfsburgo. Presencia tudo isto antes de cruzar os portões da unidade fabril onde vai assistir à produção do Passat B3, um modelo que, na sua terceira geração, estava finalmente a impor a marca no difícil segmento D. Também aqui se assistia ao começo de uma das mais bem-sucedidas histórias do mercado automóvel dos tempos modernos.

Mas havia mais surpresas reservadas para aquele grupo de profissionais da comunicação social portuguesa, ainda meio atónito com tudo o que se estava a passar: fosse pelo ambiente de abertura, fosse pela visível comoção generalizada entre os alemães, os responsáveis de Wolfsburgo decidiram também eles oferecer àqueles profissionais vindos de Portugal uma súbita glasnost (transparência, em russo). Numa pequena pista entregue ao departamento de R&D, um Polo e um Golf esperam por eles. Aparentemente iguais por fora, escondem no seu interior alguns dos mais recentes trabalhos do grupo VW em matéria de eficiência. O Polo presenteia-os com a mais moderna versão do sistema start-stop, enquanto o Golf, uma unidade da geração II, anuncia logo no exterior ao que vem: trata-se da mais nova evolução do motor elétrico.

Para a Volkswagen, os sistemas start-stop não eram novidade: os inovadores Polo Formel E (a partir de 1985) e os Passat B2 (geração de 1981) já os ofereciam como opcional, mas o público via este equipamento como pouco útil e demasiado caro… E a mobilidade elétrica, no arranque dos anos 90, uma década que haveria de ser uma das prósperas do século, era algo que estava mais reservado aos departamentos de R&D do que a uma necessidade ou imperativo ditado pela consciência coletiva da sociedade.

No principio era a Transporter…

Mas o percurso de procura pela mobilidade e novas soluções de transporte é longo e começa muito antes, mais precisamente em 1970, três anos antes da crise petrolífera que durante quase um ano haveria de deixar os postos de abastecimento à beira do colapso e os preços inflacionados. A marca alemã decidiu criar um grupo de trabalho chamado Zukunftsforschung – que em português significa (numa tradução muito livre) Investigação para o Futuro – liderado por Albert Karbelah, um engenheiro que não esconde ainda hoje o seu orgulho por ter feito parte desta geração de pioneiros de Wolfburgo: “Éramos apenas 10 pessoas, mas dois anos depois, em 1972, conseguimos apresentar o nosso primeiro projeto, uma Transporter T2. As baterias eram acondicionadas no piso e podiam ser removidas como uma gaveta por um empilhador…”

Um ano depois, em 1973, fruto do embargo decretado pelos países árabes produtores de petróleo em protesto contra a intervenção dos EUA na guerra do Yom Kippur, surge a crise petrolífera, que se iria prolongar até março do ano seguinte.

Na Volkswagen, o grupo de engenheiros do Zukunftsforschung ganha um inesperado e rápido protagonismo graças ao interesse manifestado por empresas de distribuição de variadas áreas: A autonomia da T2 elétrica era de 50 quilómetros e isso entrava dentro do raio de ação que essas empresas pretendiam. Entre 1973 e 1975 testámos nada menos do que 70 unidades da T2, que foram construídas na fábrica de comerciais de Hanover”, recorda Karbelah.

A primeira viatura de serie elétrica com a marca Volkswagen seria apresentada no Salão de Frankfurt de 1977, precisamente uma T2 com autonomia de meia centena de quilómetros e um slogan a condizer: “Elektro-Transporter: 0 litros aos 100 km”. Este modelo atraiu as atenções, mas, naquela altura em que o mundo começava a respirar fundo depois da crise, o seu apelo já não se fazia sentir de forma tão entusiástica: para a história fica o primeiro modelo de série elétrico e a venda de apenas 20 unidades.

Veja a parte 2 deste especial sobre os elétricos da Volkswagen.

 

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