Quando um piloto se ‘reforma’ porque a filha ainda não sabe andar de bicicleta

19/03/2017

Carlos Sainz anunciou a sua retirada dos ralis no final da temporada de 2004. Volvidos 13 anos, sabe-se que o piloto ainda continua ativo ao mais alto nível, já tem ‘sucessor’ na alta roda, curiosamente, não nos ralis, como se sabe, mas sim na Fórmula 1, mas quando ‘El Matador’ descalçou as luvas, poucos esperavam que dissesse o que disse. Na verdade a notícia não apanhou ninguém de surpresa, na altura, já que desde o ano anterior se sabia que o espanhol se preparava para sair. No último momento, Sainz recuou para cumprir a última vénia ao “Mundial” de Ralis e despedir-se em definitivo e em apoteose. Com 42 anos e 18 de carreira, era fácil adivinhar as razões do abandono. Com a calma que lhe é reconhecida, a Sainz bastou afirmar: “A minha filha disse-me que não sabe andar de bicicleta… ela tem seis anos, imaginem!” Não foi preciso explicar muito mais. As razões de ordem familiar juntam-se a insustentável pressão de participar em 16 rondas do calendário. Já no início desse ano, o espanhol declarava: “há uma inaceitável cultura na FIA de mudar, mudar, mudar”, até que no final do Rali de França/Córsega Sainz confidenciava aos amigos: “não são os 16 ralis do campeonato que me aborrecem, é o trabalho de preparação, o longo tempo passado nos reconhecimentos, os testes entre as provas”. Depois de guiar para a Ford, Toyota, Subaru, Lancia (Jolly Club) e Citroën, de estabelecer o recorde de 26 vitórias (na altura) no Campeonato do Mundo de Ralis, de ter pisado por 94 vezes o pódio nos teu ralis disputados até à Córsega e de se ter sagrado por duas vezes Campeão do Mundo (1990 e 1992 sempre com a Toyota), o piloto madrileno colocou o ponto final da sua carreira. Antes disso, ajudou ainda a Citroën na conquista do seu segundo título de Marcas e amparou Sebastien Loeb na chegada ao seu primeiro título de Pilotos (vejam lá ao tempo e foi e quanto mais o francês somou depois). Foi também por isso que a decisão foi tão difícil de tomar já que a casa-mãe francesa lhe ofereceu todas as possibilidades para continuar a colaboração. Mas Sainz, colocou o profissionalismo a falar uma vez mais alto, renunciando, sem deixar de agradecer a ‘amabilidade’: “na minha vida fiz sempre as coisas com muita paixão e a 100 por cento, talvez seja esse o meu segredo. Fazer as coisas a meio termo nunca foi a minha filosofia de vida!”. Respeitado por todas as equipas por onde passou e por todos os seus rivais, Carlos Sainz encerra em si mesmo um capítulo importante da história do Campeonato do Mundo de Ralis. Por muitos e melhores “Sainz’s” que possam aparecer no futuro, o “genuíno” Sainz nunca perderá o seu lugar no coração dos amantes dos ralis. Pelo menos passou a ter tempo para ensinar a filha a andar de bicicleta, como se prova pela foto, com a jovem Blanca Sainz a ter bem mais do que seis anos.

José Luís Abreu/AutoSport