Este tipo de avião era uma verdadeira raridade e logo despertou a atenção de todos os frequentadores do aeroporto, este vosso amigo incluído. De facto, entre 1959 e 1962 foram construídos apenas 65 exemplares do Convair 880, um deles para Elvis Presley. O projecto terá falhado devido à concorrência do Boeing 707 e Douglas DC8, bem mais económicos e fiáveis.
Mas voltemos ao nosso Convair, que a partir daquele dia de Março passou a ficar estacionando em permanência no parque Foxtrot da Portela. Como na época era director adjunto da revista Sirius armei-me em jornalista e fui investigar. Não imaginava eu a história “picante” que iria encontrar.
Como já foi dito, o avião chegou dos EAU, estacionou no parque F e nunca mais houve notícias do comandante Gatrell e respectivos colegas. Soube-se que pertencia à Onyx Aviation, uma companhia de “leasing” americana, mas operava sob licença da Santo Domingo Aviation, S.A., da República Dominicana. A empresa fretadora era a Natariega Inversionista S.A., com sede no Panamá, que pretendia carregar em Lisboa “equipamentos não especificados” com destino a uma organização que dava pelo curioso nome de Commandant Embarkation baseada em Karachi, Paquistão. O destinatário final não era mencionado mas sabia-se que estava no … Afeganistão! Nem um filme do James Bond teria protagonistas tão interessantes.
O primeiro-ministro era Sá Carneiro e o seu Ministro dos Transportes era o engenheiro Viana Baptista, que fizera carreira na TAP no Departamento de Manutenção e Engenharia que chegou a chefiar. Ora Viana Baptista conhecia bem o negócio da aviação e veio lembrar que Portugal era signatário da Convenção de Chicago de 1944 que, entre muitas outras coisas, proibia o transporte de material militar em aviões civis. Grande decepção. O negócio estava estragado e os militares ficaram furiosos mas Sá Carneiro não brincava em serviço e tudo voltou à estaca zero.
E o avião? Depois de semanas à espera, sem dinheiro nos bolsos, o comandante Gatrell e “sus muchachos” decidiram que era de mais. Resolveram então pegar no Convair e tentar chegar aos Estados Unidos. Conseguiram – ninguém sabe como – que os autorizassem a partir sem terem pago o combustível, o “handling” e o estacionamento do avião e no dia 4 de Maio descolaram da Portela com destino a Nova Iorque. Só que já sobre o Atlântico o comandante Gatrell foi informado que todas as empresas envolvidas no negócio tinham, como que por “milagre”, deixado de existir e o avião não poderia aterrar nos Estados Unidos. A partir daquele momento o Convair transformou-se num avião “fantasma” que ninguém queria nem dado.
Decidiram então regressar a Lisboa, terra de gente santa que a todos recebe bem, e o velho avião lá voltou ao parque Foxtrot que tão bem conhecia. Há quem diga que os tripulantes “sacaram” de bordo tudo o que havia para sacar, nomeadamente os rádios e outros equipamentos do cockpit que se presume tenham acabado na Feira da Ladra.
O Convair ficou anos estacionado no mesmo local sem que ninguém o reclamasse. As taxas de estacionamento chegaram aos muitos milhares de contos e a partir de certa altura tornou-se óbvio que aquele avião nunca mais voltaria a voar, tal o estado de degradação que atingira.
A administração do aeroporto, sem esperanças de receber um tostão por aquele pedaço de sucata, decidiu fazer um leilão. Foi então que apareceu um empresário da noite e arrematou o Convair por tuta e meia para o transformar em bar de alterne. Conseguiu a respectiva autorização da Câmara Municipal de Lisboa, sabe-se lá como, e rebocou o avião para um terreno adjacente à Segunda Circular que lhe pertencia ou arrendava. Assim nascia O Avião – Bar de Alterne e por ali ficou durante anos e anos para grande vergonha de todos nós.
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