O país é menos civilizado que os vizinhos malaios, tailandeses ou, principalmente, de Singapura. Aqui já se vê muito lixo nas ruas, embora não atinja as proporções indianas, rios transformados em enormes esgotos e um transito caótico onde voltamos a ouvir o barulho das buzinas. Os motoristas de táxi já escarram para fora da janela e dão arrotos.
Os processos burocráticos para a moto entrar nos muitos países que tenho atravessado é o que podemos chamar um 8 ou 80. Na Malásia, por exemplo, mal olharam para a moto e não me pediram qualquer documento. Em Singapura também entrei sem qualquer problema embora à saída me dissessem que deveria ter carimbado o Carnet na entrada. Aqui na Indonésia foi um processo complicado que durou vários dias e incluiu pedidos de papelada a múltiplas instituições. Ontem felizmente resolveu-se, até porque quando estou sem a moto me sinto como que descalço.
Mas o dia não começou bem. Ao sair do hotel de fraca qualidade situado nos últimos três andares de uma espécie de enorme centro comercial para ferramenta e material mecânico e eletrónico, o elevador travou de repente entre dois andares levando a que eu e um casal que também ali viajava, quase fôssemos atirados ao chão. A mulher assustou-se mas o namorado ainda estava com mais medo. O que vale é que a cena durou pouco tempo. Sem tocarmos em qualquer botão o elevador voltou a arrancar e parou tranquilamente no rés-do-chão. Felizmente era a última vez que tinha que andar nele. Apanhei um táxi à porta já munido do que pensava serem todos os papéis necessários para levantar a moto, mas o taxista não deu com o local onde estava a moto no caos que é o porto de Jakarta e acabou por me deixar noutro táxi local, que dizia saber muito bem onde eu queria ir. Não tínhamos andado mais de cinco minutos quando percebi que me estava a levar para longe do sítio previsto. Fartei-me de refilar e insultar o homem, mas às tantas comecei a achá-lo com um ar estranho. Só me dizia “slow, slow”, revirava a cabeça e quando eu me chegava à frente e olhava para ele puxava a camisa para cima a tapar-lhe a cara até aos olhos.
Fiquei preocupado, até porque me estava a levar para uma zona do porto com muito mau aspeto. Comecei então a tratá-lo bem e a dizer-lhe que era exatamente ali onde estávamos que eu queria ficar. “Pode parar aqui que é aqui mesmo”.
“No, no, slow, slow” e o homem não havia maneira de me deixar em lado nenhum. Eu a ver-me cada vez mais afastado do local onde estavam os escritórios da alfândega ia-lhe dizendo para parar junto a cada edifício que eu ficava ali mas o homem não parava mesmo. Sem saber falar inglês só repetia “slow, slow”. Passados três quartos de hora foi ter ao sítio onde eu realmente queria ir e só então percebi que nunca tinha estado perdido nem era maluco, mas quis apenas dar uma martelada no taxímetro.Cheguei ao escritório da alfândega eram uma e meia da tarde e só tinha tomado o pequeno-almoço. Só consegui sair do porto com a moto às oito e meia da noite. Nessa manhã tinha deixado a mala num hotel pior do que aquele em que estava antes mas mais barato e, quando lá regressei com a moto, duas raparigas que bebiam um chá numa pequena esplanada de rua em frente, meteram conversa e por ali fiquei a beber uma cerveja antes de ir jantar.
Uma delas falava pouco inglês mas convenceu-me que era muito boa massagista, e era. No dia seguinte tinha aprendido a dizer “I want to ride your motorcycle”, de maneira que a levei a dar um passeio pela cidade. Fomos ver um teatro e uma exposição de pintura e a seguir pretendíamos ir até à praia, mas perdemo-nos no caos da cidade. Quando parei para pôr gasolina caiu uma carga de água daquelas que parece que o céu nos vai cair em cima. Fiquei um quarto de hora à espera que passasse, mas um homem avisou-nos que as ruas da cidade estavam a ficar intransitáveis e então lá arrancámos debaixo de chuva torrencial. Talvez por não chover há uns tempos e os esgotos estarem entupidos houve ruas em que a água chegava a meio das rodas da “Cross Tourer”.
___________________________________________________________________
*Francisco Sande e Castro está a dar a volta ao mundo de moto e M24 publica o seu diário de bordo. Acompanhe-o nesta grande aventura