Um chá e um cachimbo em Isfahan

05/01/2017

Ontem, quando o Hoseeini me acompanhou na sua scooter à saída de Arak e parámos na última rotunda para nos despedirmos um homem, dos seus sessenta anos, parou junto a nós e ficou a olhar para a moto até eu partir. Veio depois atrás de mim e, quando eu hesitei num cruzamento, fez sinal para o seguir. Guiou-me mais uns quilómetros e parou noutra rotunda para me indicar a saída que devia tomar, mas insistiu para que fosse almoçar à fábrica dele ali perto. Disse-lhe que não almoçava, mas aceitava beber um chá, até por curiosidade em saber como era uma industria privada no Irão.

Bebemos um chá, ficamos um pouco à conversa e depois foi mostrar-me a fábrica. Ali transformam lingotes de alumínio em perfis para portas, janelas, etc. Têm primeiro uma caldeira onde a temperatura dos lingotes é elevada até 400 graus, depois uma enorme prensa onde, a pressões de 2000 toneladas p.s.i os lingotes são transformados em vários tipos de perfis.

Ao lado, numa outra fábrica, o filho deste homem coordena a construção de estruturas para portas e janelas. Vendem essencialmente no Irão mas também exportam para os países que conseguem, depois das restrições internacionais, ou seja, algumas das antigas repúblicas russas, Afeganistão e Iraque.

É interessante saber como, embora este país seja controlado por um regime totalitário, têm industrias privadas a funcionarem bem. Acabei por almoçar por lá e segui depois rumo a Isfahan. De início apanhei um pouco de chuva e depois frio, com a temperatura a baixar até aos 3 graus. A essas temperaturas não há punhos aquecidos que nos valham e os dedos começam a regelar. O fato da Spidi aguenta bem e mais camisola, menos camisola a coisa resolve-se.

O meu amigo em casa de quem tinha ficado, ligou a um primo que vive em Isfahan antes de eu sair e disse-lhe que tratasse de arranjar estadia para mim. Quando liguei ao primo à chegada à cidade ele disse que uma senhora me ligaria de seguida. Passado um minuto tinha a Mahid ao telefone a dizer que tinha muito gosto que ficasse em casa dela.

É fantástico como esta gente é tão hospitaleira que se prontificam rapidamente a dar acolhimento a um estrangeiro perdido neste mundo. Pedi a um táxi que me guiasse até casa da Mahid, que vive com o marido e um filho. Ela recebeu-me lindamente e passado meia hora, quando o marido chegou é que lhe anunciou: “Este é o Francisco, que conhece o Sr. Reza e vai cá ficar a dormir”. O marido era simpático e achou a situação normalissima.

No fundo estas pessoas vivem sem grande coisa que fazer a não ser trabalhar e voltar para casa e quando têm alguém de outro país que lhes fala de coisas que só vêm nos filmes ficam fascinados. Mesmo as pessoas que encontramos na rua recebem-nos o melhor possível e não se cansam de repetir “welcome to Iran”.

Depois do jantar levaram-me a visitar a cidade. Fomos ver uma das fantásticas pontes com seis séculos de existência onde o Rei tinha um terraço particular de onde via as águas do Zayandehrood correrem e visitámos a extraordinária praça Imam onde há mais de quinhentos anos já se jogava Polo. Aqui o rei tinha não só um palácio no centro da praça, para quando queria ver o jogo, como uma mesquita particular, reservada para ele e as muitas mulheres.
Acabámos a noite num extraordinário “coffee shop” cheio de peças antigas de tudo quanto há nas paredes e tecto e pessoas sentadas a fumarem cachimbos de água e a beberem chá. Aqui, numa das zonas as mulheres podiam entrar e fumavam tanto ou mais que os homens. Um ambiente girissimo.

Hoje fui ver outra das antigas pontes e regressei à praça. Dois rapazes convidaram-me para beber chá na loja de tapetes deles, junto à Mesquita que era como que um clube onde vários clientes se sentavam a tomar chá em amena cavaqueira. Às tantas entrou um que me disse: “eu vi-o ontem na “coffe shop” com uma família iraniana”.

Por ali fiquei até regressar a casa pelas cinco da tarde.