As novas pragas urbanas

20/11/2019

Estão à vista de todos e começam a ser altamente incomodativas. Servem a comodidade dos utilizadores, mas, como diz o ditado popular, o que é demais enjoa. Sobretudo quando se instala o desrespeito.

São as novas formas de transporte e mobilidade urbana. São geralmente acessíveis através de plataformas eletrónicas, são fáceis de usar, relativamente baratos e altamente convenientes. Dão pelo nome de ‘TVDE’, ‘trotinetes elétricas’ e ‘bicicletas híbridas’, sem esquecer os epidémicos ‘tuk-tuks’. Nunca a indústria de Turismo em Lisboa esteve tão efervescente, lucrativa e concorrida. Nunca antes houve tanta variedade na escolha da mobilidade, e nunca o caos esteve tão instalado. Mas vamos por partes.

Taxistas, voltem!
Quando o setor taxista declarou guerra à Uber, muitos aplaudiram a forma como uma plataforma eletrónica veio pôr em causa o status quo do transporte privado nas grandes cidades da Europa e de outras partes do globo. Em Portugal, em particular, era o confronto a um reinado manchado pelos abusos, más práticas e costumes mafiosos – que punham em causa a imagem da generalidade dos profissionais de táxi. Por isso, um pouco de concorrência era, aos olhos dos utilizadores, bem-vinda. E sendo mais barato, melhor ainda. A coisa foi legitimada e, agora, basta circular por vias urbanas para ganharmos a impressão de que um em cada três automóveis é um TVDE – seja Uber, Bolt, Cabify, Chauffeur Privé ou Kapten. Até aqui, nada a apontar. Os problemas começam quando observamos os deploráveis padrões de condução destes (supostos) profissionais do transporte: paragens no meio de vias (para receber ou largar passageiros), total ignorância para a utilidade do ‘pisca’, utilização constante e abusiva da faixa BUS, marchas lentas (em hora de ponta) em ruas de tráfego intenso… A cereja no topo do bolo revela-se quando ‘encomendamos’ um destes serviços de transporte e o condutor nem sequer fala Português. Não seria o mínimo?

Sem rei nem rock
Quem frequentador habitual de zonas históricas facilmente tropeça noutra praga chamada de tuk-tuks. Há de todas as formas e feitios, cores e lotação, movidos a gasolina ou a motor elétrico. São um sucesso junto dos turistas. E dos agentes da autoridade também, sobretudo pelas receitas que geram para o Estado em coimas pelas constantes infrações. Novamente: abusos de toda a ordem, desrespeito pelas mais básicas normas de trânsito e, acima de tudo, pela segurança de quem transportam e dos restantes utentes das vias públicas. E não estou a falar apenas dos automobilistas, mas sim dos peões…

Como pastilha elástica
A outra componente das novas formas de mobilidade muito em voga são as fantásticas trotinetes elétricas e bicicletas híbridas – movidas como apoio de motor elétrico. Fáceis de usar, são ainda mais fáceis de abandonar. Não interessa onde. Se for à porta de prédios e garagens, em arbustos e canteiros de jardins públicos ou mesmo no meio da estrada, tanto melhor. E como é um aluguer sob o princípio do vehicle sharing, não há responsabilidade. Quem vier a seguir que o tire.

Por outro lado, não requerem, aparentemente, capacete, e podem usar qualquer faixa de terreno em que consigam rodar – seja estrada, passeio ou passadeira – pondo em causa a integridade física de outros utentes.

É neste cenário de ganância e falta de bom senso que brotam estes modernos e práticos meios de mobilidade urbana, e é costume dizer-se que a seguir à tempestade vem a bonança – leia-se legislação. Mas, até lá, será isto que queremos para as nossas cidades e vilas?