Dois carros para conduzir antes do apocalipse? Escolha difícil…

19/03/2020

Tantas vezes Hollywood insistiu no tema que um dia a realidade haveria de superar a ficção. Um vírus nascido na longínqua China estava a causar o pânico naquele país, mais concretamente na região de Wuhan. Parecia longínquo para preocupações. Demasiado longe deste oásis turístico que é Portugal e, até mesmo, da velha Europa, já tão habituada a guerras, surtos de peste e a outras enfermidades que noutros tempos dizimavam população e sociedades a ‘torto e a direito’.

O que eles não tinham então era a ciência e a tecnologia, aliadas nesta causa contra o coronavírus, como noutras tantas, mais ou menos nobres – sim, estou a pensar em sites de atividades excessivamente físicas… Mas, aquilo que nós, sociedades do século XXI, não temos é forma de sustentar o nosso modo de vida com a economia em suspenso.

Adiante. Neste cenário de pseudo-apocalipse dei por mim a pensar que carro é que escolheria para conduzir uma última vez antes de o mundo ir ‘desta para melhor’ numa espécie de evento apocalíptico definitivo, como um asteroide sem um Bruce Willis que nos salvasse (‘Armageddon’, para quem estiver perdido na referência…). Para quem é apaixonado por automóveis a escolha é imensa e atravessa tantas gerações que, de facto, o mais difícil é tomar uma decisão. Poderia ajudar o facto de ter conduzido cerca de 95% do parque automóvel lançado em Portugal nos últimos 12 anos ou assim. Na verdade, complica. Tanta coisa boa para apenas se poder escolher um. Vá, dois…

Após aturada batalha mental, reduzi o lote a dois candidatos, os quais, por sinal, nunca conduzi. De um deles, aliás, nunca cheguei mais perto do que cinco metros, dada a sua raridade e exclusividade. Estava atrás de uma barreira para evitar aproximações excessivas de um qualquer louco de mãos malandras. O primeiro candidato trata-se do Ferrari F40. Há quem diga que nunca se deve conhecer os ídolos, sob pena de se ficar desiludido. Mas, valia a pena o risco. Hoje, é relativamente simples produzir um superdesportivo – sobretudo agora que os motores elétricos abrem múltiplas possibilidades neste campo –, mas em 1986 quando Enzo Ferrari decidiu lançar o F40 em comemoração do 40º aniversário da marca italiana, havia pouca experiência nessa área.

Aliás, oferece-se ao quadrangular carro italiano o epíteto de fundador do segmento dos superdesportivos, com a sua inspiração na Fórmula 1, como o chassis produzido com painéis em kevlar, fibra de carbono e alumínio, mantendo rigidez e baixo peso. É certo que nem sequer tem comodidades como uma simples mecanismo de pega interior para abrir as portas (usa uma correia para o efeito), mas o seu peso histórico, o seu motor V8 biturbo de 478 CV e a responsabilidade de ser o derradeiro dos carros imaginados por Enzo compensam isso e tudo o resto.

A segunda escolha é algo mais mundana, se é que se pode chamar isso a um carro que também representou um marco na gama dos desportivos. Um Honda NSX Type R de primeira geração era máquina com potencial para impressionar nas últimas curvas do planeta. Concebido como uma forma de demonstrar a capacidade de engenharia dos japoneses, o NSX contou com a ligeira participação de Ayrton Senna no seu desenvolvimento, o que lhe atribui também uma aura especial.

Aliás, os seus pergaminhos dinâmicos estão para lá de qualquer dúvida, quando se recorda que um dos pilotos mais talentosos do Japão e apelidado ‘rei do drift’, Keichi Tsuchiya, tinha um na sua garagem depois de testar centenas de outros carros.

É um selo de competência difícil de ignorar.

O que vale é que o apocalipse não há de aparecer, ao contrário das oportunidades para chegar perto de qualquer uma daquelas máquinas. Já agora, gostaria de saber a opinião dos leitores sobre as vossas escolhas…

PS: Em estado de emergência, há que tentar preencher o cérebro. Tenta-se, pelo menos. Mas é um momento inédito e estranho, do qual sobram muitas dúvidas sobre o que irá sair daqui. Até mesmo para os meios de comunicação, que enfrentam mais uma batalha quando nenhuma das outras se demonstrou resolvida: a concorrência das ‘fake news’ e a sua desinformação, a desvalorização do jornalista, cada vez mais equiparado pela opinião pública (e infelizmente, por gente até com alguma responsabilidade) a um influenciador ou até mesmo a questão fundamental da rentabilidade. Neste cenário, o maior bem que cada um de nós pode ambicionar é confiar. Confiar nos outros, confiar nos meios certos. É isso que fazemos e é sempre essa a batalha que tentamos manter, mesmo em dias de incerteza como estes.

Que ao menos o coronavírus pestilento tenha a virtude de refundar a confiança e a dependência das pessoas nos órgãos de comunicação social (sejam eles no digital ou no papel) – nos verdadeiros com jornalistas credenciados e não naqueles que nascem e pululam com informação parcial e enviesada feita por quem acha que também pode opinar. Também terá o seu lugar, mas não confundam uma coisa com a outra. Que o Governo também não se esqueça disso…