Hoje vou atravessar 70 quilómetros de um lago gelado na Sibéria

21/03/2018

O Lago Baikal na Sibéria é um gigantesco monumento natural. Em extensão tem quase o tamanho de Portugal (680 km) e em largura, cerca de 80 km. É precisamente essa largura que hoje vou atravessar ao volante, não de um trenó de huskies, o mais ancestral e eficaz meio de transporte desta inóspita região da Grande Rússia, mas sim ao volante de um Mazda CX5 com tração integral e uns pneus de pregos que davam para lavrar um latifúndio.

Depois do Circulo Polar Ártico, da Noruega, da Islândia, e dos Açores a Mazda montou aqui nos confins da Ásia mais uma das suas #Epic Drives, que pretendem pôr à prova as capacidades dos seus modelos em ambientes extremos ou em cenários de condução do outro mundo, como é o caso do Lago Baikal.

Trata-se do lago mais profundo, antigo e com maior volume de água doce do mundo. São 25 milhões de anos a receber água de cerca de 300 rios para ter a maior reserva de água doce não gelada do mundo, maior que a bacia Amazónica e com uma profundidade que pode chegar aos 1600 metros.

Situado já perto da fronteira com a Mongólia, na Sibéria oriental, o Lago Baikal é também um destino balnear muito procurado no verão pelos russos. O recém-eleito presidente Putin, por exemplo, costuma pescar aqui no verão e caçar ursos no inverno. Aqui encontra-se a maior população de ursos castanhos do planeta.

Calcula-se que nas montanhas que rodeiam o Lago Baikal vivam cerca de 13 mil ursos, que nesta época do ano ainda estarão, espero eu, a hibernar. Isto porque as temperaturas aqui estão a subir e o gelo começa a derreter. Ao contrários dos 20 graus negativos que esperávamos, está um autêntico sol da Caparica, com 4 ou 5 graus positivos. Começa a chegar a hora dos ursos acordarem e não me apetecia nada ser servido como “breakfast in bed” a um destes colossais animais.

O outro perigo, bem mais real, são as rachas que a superfície do lago gelado começa a abrir e que podem ser armadilhas mortais para um condutor distraído com a paisagem, como eu costumo ser. Uma das particularidades deste lago é o facto das suas camadas de gelo serem completamente transparentes e podermos olhar para a profundidade do lago como se estivesse a trespassar um copo de vodka com o olhar. A partida para esta épica aventura é daqui a meia hora.

Acordei às 4.00 h da madrugada consumido por uma excitação quase infantil, afinal não é todos os dias que se vai conduzir ao longo de 70 quilómetros num lago gelado da Sibéria. Sinto-me quase numa aventura do Corto Maltese.

A partida é daqui da cidade de Ulan-Ude, uma cidade entreposto criada pelos cossacos para receber as rotas mongóis e chinesas do comércio. Da janela do quarto do hotel escuto os altifalantes da estação do comboio. Esta é uma das estações por onde passa o mítico Transiberiano, bem a meio da mais longa linha de comboio do mundo, que liga Moscovo a Vladivostock e ao mar do Japão.

Hoje, depois de atravessarmos o lago Baikal, e caso não acabe a servir de pequeno-almoço a um urso ou a tomar um banho extraordinariamente gelado, chegarei a Irutsk, do outro lado do lago, a Paris da Sibéria, para onde os czares deportavam artistas, e os comunistas, opositores ao regime.

Se sobreviver, cá estarei para contar. A viagem, essa vai ser feita ao som de “Idiot Wind”, do Sr. Bob Dylan, a minha forma de estar aí em Lisboa no concerto de logo à noite.