Autor de uma temporada brilhante na temporada passada de Fórmula E, António Felix da Costa parte para a temporada número sete deste campeonato como o ‘alvo’ a abater por todos os outros pilotos, a começar pelo seu companheiro de equipa, Jean-Eric Vergne, também ele um campeão da modalidade. Um facto que poderia colocar sobre os ombros do piloto luso uma maior pressão, mas Félix da Costa garante que isso está longe de ser uma realidade.

A DS Techeetah é caso único na Fórmula E: pela primeira vez, uma equipa conta no seu plantel com dois campeões, o que permite desde já antecipar uma batalha interna bastante renhida entre Félix da Costa e Vergne. No entanto, pressão é palavra que não conta do dicionário do português.

“Se fosse há uns anos atrás talvez sentisse mais a pressão, mas estou numa outra fase da minha vida – tive um trabalho muito bom com psicólogos do desporto que continuo a fazer – em que a maneira com que abordei a época passada e com que vou continuar a abordar é que ponho o capacete com um sorriso na cara e estou-me a divertir a guiar, quando estou a ganhar e quando estou a perder. As coisas saem de forma muito mais natural quando gostamos do que fazemos. Vai ser essa a abordagem e, se ganhar, porreiro, é para isso que trabalhamos e que cá estamos. Se perdermos, voltamos para o ano e tentamos outra vez”, referiu o piloto em conferência de imprensa virtual na qual o Motor24 marcou presença. De facto, se o modo de estar diz muito sobre o estado de espírito de um piloto, Félix da Costa parece muito mais liberto, mesmo perante jornalistas interessados em ‘extraviar’ segredos.

Félix da Costa assume que é fundamental encontrar um bom equilíbrio entre calculismo e agressividade. “Essa foi uma grande diferença de quando pilotei pela BMW, quando estávamos a lutar pelo campeonato, e a época que fiz agora. Com a BMW ganhei a primeira corrida do ano e depois foi o ano todo à defesa. Obviamente, tem de haver um equilíbrio, mas gostei muito mais da minha abordagem em pista no campeonato deste ano, em que era líder do campeonato mas continuei a ser agressivo e a atacar. Sem dúvida essa é a maneira mais eficiente. Se começamos a mostrar medo e cautela a mais, somos comidos por todo o lado, somos comidos vivos. Obviamente tem de haver um equilíbrio, com agressividade q.b. mas com outro cuidado”.

Carro novo tem de esperar

Para o arranque da temporada, a formação contará com o mesmo monolugar da época passada, embora com algumas melhorias ligeiras, enquanto aguarda a homologação do monolugar que irá competir nas temporadas sete e oito, o que deverá acontecer no regresso da Fórmula E à Europa.

Sobre este atraso, o piloto de Cascais indica que “a razão é relativamente simples”, prendendo-se com o facto óbvio de que “todos fomos afetados pela pandemia”, o que levou a Federação Internacional do Automóvel (FIA) a dar a possibilidade às equipas para homologarem os seus carros até mais tarde, em abril, já com todos os sistemas testados e comprovados.

“A DS aceitou – e bem – a oferta da FIA para garantir que a nível de fiabilidade vamos estar numa zona segura e confiantes, porque não vamos ter só de fazer a época sete, mas também a época oito com esse carro. O novo carro está pronto e até tenho testado nele, mas nós ainda não conseguimos meter todos os quilómetros em todas as peças que precisamos para serem validadas e até isso estar feito não queremos validar nada a 100%. Daí adiarmos um pouco a entrada do carro novo, que vai fazer também a temporada oito”, afirmou o campeão.

Apesar de não ter o material mais recente à sua disposição, Félix da Costa garante até que isso pode ser benéfico para as aspirações da DS Techeetah. “As perspetivas para a nova temporada são boas. À partida, iríamos só fazer duas corridas com o carro atual, em Santiago e México, mas agora que as duas corrida ficaram rondas duplas, teremos de fazer quatro, no Chile e na Arábia Saudita. Acho que temos uma vantagem, vamos por o carro no chão com todo o conhecimento. As outras equipas ainda vão estar a trabalhar com carros novos e, possivelmente, enfrentar alguns problemas de fiabilidade. Por isso, vamos ter a certeza de que o que vamos levar para as primeiras corridas é um carro que conhecemos bem. Vai ser mais duro, é certo, os outros deram um passo em frente, mas tenho a certeza de que não vamos estar mal, de que vamos ter um carro ganhador e todas as hipóteses de lutar por pódios e por vitórias”.

Equipa com “ideias fora da caixa”

Sem querer ‘abrir o jogo’ para não revelar segredos do novo monolugar (ainda que muitos dos elementos não possam ser alterados pelas equipas), Félix da Costa destaca o empenho e o espírito de inovação contínuo da DS Techeetah.

“Esta equipa… Quase que os poderia chamar de loucos, porque têm ideias tão fora da caixa. É contagiante ver esta vontade de inovar, de querer fazer melhor. O carro novo é muito bom, um grande passo em frente, não só em termos de potência, [mas] mais leve e mais eficiente. Infelizmente, não posso dizer algumas coisas que o carro tem, mas são algumas maluqueiras que estão lá e que estão a funcionar e que poderão ver ao vivo que é uma grande vantagem”, aponta, indicando que mudaram alguns elementos da unidade motriz, como o motor, o inversor (que é o que faz regenerar a energia) e a caixa de velocidades.

“Fomos à procura da eficiência com menos peso, pelo que creio que foi um passo em frente em todas as áreas”, afiançou, adiantando ainda que outro dos objetivos foi fazer com que o carro seja “o mais inteligente possível”.

“Basicamente, tentamos que, se em corrida, eu perder toda a comunicação rádio com a boxe, o carro quase que me diz o que tenho de fazer, se posso ir mais depressa, se é altura do ‘Attack mode’ ou alguma mensagem da FIA para as equipas. Quando falamos de um novo software, é muito sobre na temática da eficiência, a maneira como se poupa a energia numa curva rápida, tem muito que ver com o software. E depois temos também o software que a equipa tem nas boxes que ajuda a definir a melhor estratégia, consegumos ter uma imagem melhor de quem vão ser os nossos concorrentes a meio da corrida”.

Respeito mútuo entre Félix da Costa e Vergne

A ideia de que dois campeões na mesma equipa poderá acarretar um desafio suplementar é alimentada pelo piloto luso, admitindo, entre risos, que “é giro para vocês, que estão desse lado a ver”. Garante, porém, que o respeito é grande entre os dois campeões da Fórmula E.

“No ano passado passámos por algumas fases complicadas, [mas] fomos capazes de recuperar. O respeito que temos um pelo outro ‘encheu’ e é maior ainda e tenho a certeza de que não vão existir problemas de maior. Obviamente ele quer ganhar, eu quero ganhar, por isso é deixar o melhor vencer”.

Mas, Vergne será apenas o primeiro dos seus adversários, o mesmo se passando no caso da equipa, que venceu os dois últimos campeonatos de pilotos e o último de equipas. “Quando ganhas tantos anos seguidos, passas a ter um grande alvo nas costas. Há um grande ego dos construtores e é importante para uma marca ficar à frente das outras. Por exemplo, há a guerra entre as quatro marcas alemãs. A competitividade vai aumentar. A questão da pandemia torna a solução mais complicada. Se calhar vai haver mais jornadas duplas com menos tempo para voltar à fábrica, analisar as coisas e ir de novo correr, mas acho que isso pode jogar a nosso favor, porque temos uma equipa muito bem preparada”.

Seja como for, Félix da Costa parte para a temporada sete da Fórmula E como um dos favoritos, atendendo às suas prestações na época passada, tendo tudo do seu lado para repetir a façanha histórica para o automobilismo português.


Mark Preston (Diretor da DS Techeetah): “A pressão está do lado dos outros para nos bater”

Diretor da equipa DS Techeetah, Mark Preston sabe bem o que é vencer e o que é lidar com a pressão acessória de ter um campeão da Fórmula E no seu seio. Mas, agora, para a temporada de 2020/2021, contará com dois, naquela que será a primeira vez que isso sucede nesta categoria, que também será, pela primeira vez uma prova com a chancela de campeonato do mundo da FIA.

Olhando para os seus rivais e para o que espera a DS Techeetah nesta nova época, o britânico é perentório.

“Se tiverem visto as últimas corridas, a Mercedes e a Nissan estavam mesmo atrás de nós, em especial estes últimos. Obviamente, não vão desaparecer e vão continuar a forçar, como todos os outros. Mas, se o facto de ser um campeonato do mundo é uma pressão adicional? Não creio, temos os dois melhores pilotos, o melhor motor e a melhor equipa. Não vamos mudar muito entre o ano passado e este e é bom entrar no novo ano com muita experiência. A pressão está do lado dos outros para nos bater”.

Interrogado quanto à abordagem para os dois pilotos na equipa, a resposta saiu mais politicamente correta: “Neste momento, temos de nos focar nos rivais e depois logo vemos como se desenrola”.

Para garantir que tudo corre bem em pista, Preston destaca ainda o valor da simulação para conseguir ter todos os elementos na sua melhor forma.

“A importância da simulação é imensa, porque não podemos fazer muitos testes em pista. Por isso, é cada vez mais importante trabalhar virtualmente para evitar que se façam erros na pista. Cometer o menor número de erros na pista é uma vantagem competitiva. O simulador ajuda a preparar-nos”.

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