Um estudo europeu da Federação Europeia de Transportes e Ambiente, revelado na segunda-feira, caiu como uma bomba na indústria automóvel. Estará a Europa a braços com um novo dieselgate com os veículos híbridos plu-in, como sugere o relatório no seu próprio título? As reações não se fizeram esperar e a Associação Zero classifica estes modelos como um “desastre ambiental” e defende o fim dos apoios do Estado à sua aquisição. Em entrevista ao Motor 24, Henrique Sánchez, presidente da Associação dos Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE) admite que a Europa possa estar perante um novo “caso de polícia”, mas rejeita que os híbridos plug-in (e a sua eventual incorreta utilização) sejam o mau da fita.
Que comentário lhe merece o estudo europeu e o alegado “desastre ambiental” dos híbridos plug-in?
O relatório da Federação Europeia de Transportes e Ambiente (T&E – Transport & Environment) sobre os veículos híbridos plug-in publicado este mês de novembro com o título: “Híbridos Plug-in: Está a Europa a caminho de um novo dieselgate?” no original, “Plug-in Hybrids: Is Europe heading for a new dieselgate?” levanta um conjunto de questões que têm que ver com a fiabilidade e a transparência dos valores de emissões que as marcas referidas anunciam. Aliás o título é muito sugestivo e indicativo, podemos estar perante um novo escândalo através da manipulação dos valores das emissões publicitadas. Será, a confirmarem-se as suspeitas da T&E, um caso de polícia. A T&E foca-se numa utilização ineficiente do veículo híbrido plug-in que embora podendo existir não é a utilização para a qual os híbridos plug-in foram concebidos.
Uma comparação possível será com um veleiro. Um veleiro também é um veículo híbrido: funciona com as velas e a energia eólica e também tem um motor de combustão interna. Se alguém decidir usar o veleiro para navegar arraiando as velas e navegando com o motor de combustão não estará a dar o uso correto a este tipo de veículo. O veleiro tem velas para navegar e um motor de combustão para manobras de entrada/saída de uma marina ou de um porto ou para situações de emergência. Se navegar apenas com o motor a combustão estará na mesma situação de um utilizador de um veículo híbrido plug-in (PHEV) que só conduz com o motor de combustão interna – estará a dar uma utilização incorreta e ineficiente.
No extremo será o mesmo que alguém comprar um burro e uma carroça, colocar o burro em cima da carroça e começar a puxar a carroça com o burro sentado na mesma. Será eficiente?“Os veículos híbridos plug-in têm sido a porta de entrada para os 100% elétricos”
A Associação Zero, por exemplo, defende o fim dos benefícios fiscais para estes veículos. Qual a posição da UVE?
O Incentivo pela Introdução no Consumo de Veículos de Baixas Emissões, mais conhecido como Incentivo à Aquisição de um Veículo Elétrico, atribuído pelo Fundo Ambiental, são incentivos exclusivos para veículos 100% elétricos, estando excluídos os veículos híbridos plug-in. Os benefícios fiscais dividem-se em duas grandes áreas, uma de benefícios exclusivos aos veículos 100% elétricos: Isenção do Imposto sobre Veículos (ISV), Isenção do Imposto Único de Circulação (IUC) e são comuns aos particulares e às empresas, outra onde se incluem os veículos 100% elétricos e os veículos híbridos plug-in, exclusivos para as empresas e que incluem a Dedução do IVA e a Poupança em sede de IRC, com valores máximos de aquisição para os híbridos plug-in de 50.000€ (+IVA) e para os 100% elétricos de 62.500€ (+IVA).
Assistimos a um aumento exponencial das autonomias dos veículos 100% elétricos e das Redes de Carregamento (quer em quantidade, quer em velocidade de carregamento, com a consequente diminuição dos tempos de carga), começando a deixar de existir muitas das legítimas preocupações de quem adquiria este tipo de veículos, razão pela qual a UVE defende que os benefícios fiscais sejam gradualmente transferidos dos veículos híbridos plug-in para os veículos 100% elétricos, favorecendo e acelerando cada vez mais a eletrificação do parque automóvel em Portugal. Esta transformação continuará a ser um processo gradual que deve ter sempre presente a aceleração da transição energética. Note-se que esta transição dos benefícios que defendemos, contribuirá naturalmente para que os veículos híbridos plug-in tenham menos propensão a ser adquiridos por razões de índole mera ou exclusivamente fiscal, o que inequivocamente também potenciará um uso mais correto e eficiente dos mesmos.
“Desastre Ambiental” será o naufrágio de um petroleiro ou a explosão de uma plataforma de uma exploração petrolífera off-shore”
Na sua opinião, os híbridos plug-in podem ser um primeiro passo para a aquisição de um veículo elétrico?
O passo seguinte é quase sempre a passagem do veículo híbrido plug-in para o veículo 100% elétrico, é uma questão de fazer contas, mas também de preocupações ambientais a que todos nós estamos muito mais despertos nesta fase de pandemia da covid-19.
Em resumo, os veículos híbridos plug-in são um passo importante e uma porta de entrada para a mobilidade elétrica, para um número cada vez maior de utilizadores, sempre e quando lhe seja dada a utilização para a qual ele foi concebido. Tudo o resto, alterações de valores de emissões, informação incorreta, imprecisa ou negligente são casos de polícia e como tal devem ser tratados.
“Desastre Ambiental” será o naufrágio de um petroleiro ou a explosão de uma plataforma de uma exploração petrolífera off-shore e não tanto o uso por vezes incorreto ou ineficiente de um veículo híbrido plug-in, como nos fizeram crer.