A definição daquilo que será o carro do futuro voltou a ser debatida em Lisboa e, se respostas concretas ainda são difíceis de encontrar, aquilo que já é certo é que o automóvel do futuro será obrigatoriamente diferente dos padrões que hoje estão estabelecidos. Neste cenário, Portugal quer voltar a assumir uma posição cimeira no que à mobilidade elétrica diz respeito.

Esta foi apenas uma das conclusões retiradas da primeira Conferência realizada pelo site Automonitor, que decorreu na sede da EDP em Lisboa, na qual se reuniram especialistas e membros da indústria automóvel para debater os moldes do automóvel do futuro, contando igualmente com a presença de José Mendes, Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente.

O membro do executivo enfatizou a importância de se apostar, cada vez mais, num modelo de transportes sustentáveis, elaborando igualmente a sua ideia de mudança de paradigma em relação à posse do automóvel nos moldes tradicionais: “o sistema de propriedade pessoal será alterado, as pessoas tenderão a deixar de ter carros particulares para ter um carro à medida das suas necessidades do momento, ao jeito de um serviço”, referiu José Mendes, para quem as tecnologias de mobilidade autónoma trarão igualmente novas liberdades para cidadãos hoje mais limitados em termos de mobilidade.

Com a “paisagem da mobilidade em constante alteração em todo o mundo”, as plataformas de ‘car-sharing’ e partilha de veículos foram também abordadas pelo responsável do Governo, fazendo questão de notar que as leis não devem travar o progresso protagonizado pela tecnologia, referindo-se à lei dos transportes em carros descaracterizados a partir de plataformas digitais, atualmente em apreciação no Parlamento, e que permitirá uma nova abordagem aos serviços de transportes. “Queremos dar mais enquadramento legal para mais oferta para o consumidor e a opção final será sempre deste. Não queremos cristalizar um serviço apenas por uma razão de implementação da lei. As leis não têm de ser inibidoras do avanço e do progresso”, garantiu.

Recordando que os veículos privados passam hoje “92% do seu tempo parado nas garagens ou na rua a desvalorizar”, José Mendes advoga que a alteração de paradigma trará assim uma redução das despesas para as famílias relacionadas com o automóvel. Para Mendes, é uma abordagem em que a mobilidade é vista “como um serviço, com benefícios energéticos e na redução das emissões”.

Por outro lado, explicando que em Portugal, a Convenção de Viena traz algumas limitações aos ensaios de condução autónoma, foi revelado que, existe já uma equipa incumbida de desenvolver testes com condução autónoma de nível 2 e 3, os quais serão levados a cabo com parceiros tecnológicos. Mas há passos em frente a serem dados pelo Executivo também ao nível dos incentivos para a investigação, com o exemplo da Bosch de Braga e da sua parceria com a Universidade do Minho a ser apontado como diferenciador para o panorama nacional.

A aposta nos veículos elétricos, por outro lado, é para continuar, mesmo que, uma vez mais, se tenha mantido o foco longo dos incentivos para os particulares, ao contrário do esforço feito ao nível dos incentivos para as empresas na compra de elétricos. Ainda assim, recordando o pioneirismo de Portugal na mobilidade elétrica no final da primeira década de 2000, José Mendes diz que o país “quer regressar ao caminho de inovação e de pioneirismo”, estabelecendo ainda como objetivos o estabelecimento de uma rede de carregamento a nível nacional.

No âmbito do programa ECOMOB, garantida está a compra de 1.200 veículos elétricos para serviços do Estado, dos quis 170 chegarão já em 2017.

Nissan promove visão integrada

Gareth Dunsmore, diretor de veículos elétricos da Nissan, foi um dos oradores desta conferência, com o responsável pela gama de modelos a eletrão da marca nipónica a explorar as potencialidades desta tecnologia para a obtenção de um futuro mais ecológico e sustentável numa era em que as cidades tendem a crescer nas suas dimensões e na população.

Assim, passando em revista o esforço feito pela marca na divulgação dos elétricos, mas também na propagação de postos de carregamento a nível europeu, Dunsmore estabeleceu para a companhia nipónica uma visão integrada da mobilidade para resolver os problemas dos automóveis, mas sobretudo a das próprias cidades atuais.

Enaltecendo que as emissões poluentes são um dos principais problemas, Dunsmore recordou o princípio da integração Nissan Intelligent Mobility, com três focos: Intelligent Power (relacionado com as motorizações elétricas de que foram grande apostadores com o Leaf e com os próprios postos de carga para particulares e rede pública), Intelligent Drive (com a mobilidade autónoma bem preparada e na qual as pessoas possam confiar, sendo este um elemento importante para a sua implementação, sendo também recordado que o próximo Leaf já terá elementos de condução semiautónoma) e Intelligent Integration (com funcionalidades interligadas e conectadas que permitem a execução de ordens remotamente por via de aplicações de smartphone).

Mas não só. Há outros exemplos de integração inteligente, conforme explicou Dunsmore. Outro exemplo desta capacidade de integração da solução elétrica na sociedade passa projeto xStorage, que prevê aplicações para Casa, Empresas e Rede e do qual é exemplo o recente acordo firmado com a Arena de Amesterdão para a aquisição de baterias elétricas do Leaf, que serão carregadas através de painéis solares na cobertura, para utilização nos dias de jogo ou quando necessário e para suplemento na rede elétrica comum quando não seja necessária para o funcionamento do estádio.

Brisa “operadora de mobilidade e não de infraestruturas”

Enquanto concessionária de uma larga franja da rede viária nacional de autoestradas, a Brisa mostrou-se confiante na adaptação ao novo paradigma do automóvel, com Franco Caruso, porta-vez da empresa, a observar que a Brisa terá de passar a ser vista como uma “operadora de mobilidade e não como uma empresa de infraestruturas” à medida que passa a ter de responder a uma série de exigências relacionadas com o automóvel, ao nível do carregamento e planeamento da viagem. Ou seja, “desenvolver serviços de forma diferente para observar a mobilidade como um todo. O tema das tecnologias de transportes inteligentes (ITS) é uma peça chave para a integração dos serviços de mobilidade”, explicou.

Em termos práticos, revelou que uma primeira experiência de ‘platooning’ de camiões, em que um primeiro camião conduzido por um humano lidera um comboio de veículos autónomos ligados entre si, poderá estar para breve, embora seja necessária a conjugação de esforços de diversas áreas. Porém, antes da chegada ao mercado de soluções de tecnologia autónoma, o primeiro passo “será dado no foco do planeamento e otimização das viagens”, com um elevado impacto da digitalização de serviços e na forma de a aplicar à condução.

Caruso destacou, ainda, que existe um obstáculo para avanços mais significativos na área automóvel e que passa pela “lentidão da adaptação da legislação aos novos modelos de mobilidade, com o peso dos governos centrais e da própria Comunidade Europeia a jogar contra a implementação mais rápida da tecnologia”.