A pressão no botão de ignição é acompanhado do silêncio tão comum dos automóveis elétricos, mas o primeiro arranque traz consigo a melodia do filme ‘Amarcord’, de Federico Fellini, outro símbolo de uma Itália que já passou. Que outro automóvel é que arriscaria tal coisa? Um ‘truque’ tão simples e tão capaz de arrancar um olhar e um sorriso a alguém do lado de fora, tornando o ambiente mais alegre, tanto quanto a banda sonora composta por Nino Rota para a película de 1973. O novo 500 é assim – um arrojo que mantém os créditos do anterior modelo, mas com a diferença fundamental da eletrificação.

A marca italiana dá um passo decisivo rumo à nova fase da sua história, com recurso à eletrificação para ir ao encontro de uma maior sustentabilidade. Ao invés de arriscar a produção de um novo modelo 100% elétrico, a Fiat decidiu que o melhor caminho para disseminar aquele tipo de motorizações era com a sua coqueluche, o 500, citadino de grande sucesso desde o lançamento da versão moderna.

Na verdade, o 500 elétrico que agora chega ao mercado (por enquanto apenas nas versões Icon e La Prima) não é o primeiro da marca, mas o sucessor de um primeiro Fiat 500, lançado no início da década de 2010 e do qual o malogrado líder da Fiat Chrysler Automobiles, Sergio Marchionne, chegou a pedir que não o comprassem devido ao prejuízo que a sua produção acarretava para a marca. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades…

Menos de uma década volvida, a Fiat escolhe agora o 500 de nova geração, dotado de uma nova plataforma, para albergar o seu esforço de eletrificação progressivo, com três carroçarias disponíveis (berlina, cabrio e ‘3+1’ com duas portas laterais), estilo evolutivo muito bem conseguido (repleto de ótimos pormenores) e com capacidade avançada no campo da motorização elétrica.

No campo da motorização, disporá de duas variantes, uma com 95 CV e outra de 118 CV (a que pudemos já ensaiar). A primeira está associada unicamente a uma bateria de iões de lítio de 13.7 kWh, enquanto a segunda terá ao seu dispor uma bateria de 42 kWh, o que lhe permite apresentar autonomia combinada (WLTP) de 180 e de 320 quilómetros, respetivamente. Em ambos os casos, porém, a autonomia em ciclo urbano é bastante maior, chegando a superar os 400 quilómetros na versão de maior potência (460 quilómetros para maior precisão). A Samsung fornece este componente, situado em posição baixa entre os eixos para baixar o centro de gravidade.

Essas combinações de motor/bateria estão também associadas aos níveis de equipamento, com o conjunto de menor alcance a ser dedicado ao nível de entrada Action, dedicado essencialmente a um cliente mais urbano, que precisa do básico no seu dia-a-dia, com ligação intuitiva e imediata ao smartphone, não precisando de grande autonomia para as suas necessidades nos centros urbanos – a Fiat aponta uma média diária em redor dos 50 quilómetros diários.

Com motor elétrico de 70 kW, acelera dos zero aos 100 km/h em 9,5 segundos e aponta uma velocidade limitada a 135 km/h. Recorre a uma bateria de iões de lítio com uma capacidade de 23.8 kWh, resultando numa autonomia de mais de 180 km no ciclo WLTP, ou mais de 240 km a conduzir apenas em cidade. Pode ser carregado a 50 kW, ganhando cerca de 50 quilómetros em menos de dez minutos.

Depois, há ainda os níveis Passion e Icon com mais potência e autonomia, este último o mais elaborado e requintado (se descontarmos a versão de lançamento especial La Prima), com ecrã central tátil central de 10 polegadas com o sistema Uconnect 5, tablier diferente, bancos específicos ou os materiais mais cuidados no habitáculo. Nota para o avanço significativo da tecnologia UConnect 5, que apresenta sistema de interface de Linguagem Natural com reconhecimento avançado de voz, para que possa falar com o carro usando a palavra “Hey Fiat”, para controlar as suas definições de autonomia e carregamento, programar o ar condicionado e escolher as faixas de áudio. Há ainda a possibilidade de contar com um ecrã central de menores dimensões, com 7.0 polegadas. A instrumentação igualmente digital e configurável é completa e informativa.

Nas versões mais potentes, o motor de 118 CV/ 87 kW permite velocidade máxima de 150 km/h (autolimitada) e aceleração dos zero aos 100 km/h em 9,0 segundos e zero aos 50 km/h em 3,1 segundos.

No momento de recarregar a bateria, importa saber que o recurso a um carregador AC a 11 kW permite ‘encher’ a carga em 4h15m. O sistema de carregamento oferece também a opção de carregar a viatura durante a noite na garagem em casa, usando o cabo Modo 2 (3 kW) incluído, mas leva mais de 15 horas para um carregamento completo. A tomada ‘Combo 2’ localizada no painel traseiro do lado direito da viatura proporciona um carregamento rápido, tanto em CA como em CC. Para carregar tanto em casa como em postos públicos, os clientes podem também adquirir um cabo Modo 3 trifásico de 11 kW ou uma Wallbox Mopar.

O carregamento rápido DC permite até 85 kW, para que possa carregar a bateria até 80% de autonomia em 35 minutos, ou até 50 quilómetros – a distância média diária percorrida – em cerca de cinco minutos. A bateria, com um peso de 270 kg, tem uma garantia de oito anos os de 160 mil quilómetros.

Em termos de dimensões, o novo modelo cresce moderadamente, com mais 29 mm de altura (1527 mm), mais 61 mm no comprimento (3632 mm), mais 22 mm na distância entre eixos (2322) e mais 56 mm na largura (1683 mm). A distribuição de peso é quase ideal, com 52% à frente e 48% atrás, ao passo que a rigidez torsional foi muito melhorada.

Alinhando-se com uma causa mais sustentável, o novo 500 terá atenção a diversos detalhes na sua produção, incluindo-se a utilização de ‘Seaqual’, um material de revestimento no habitáculo feito a partir de plástico reciclado obtido nos oceanos do planeta, ou de tinta mais amiga do ambiente para as carroçarias. Mas, ainda assim, manterá o seu ‘universo’ de personalização, algo que será considerado muito importante. De igual forma, o novo 500 aposta também numa palete de cores que se inspira nas tonalidades da natureza, procurando fugir dos ‘básicos’ azul, verde, vermelho e afins.

Primeira viagem com o novo 500

Esta é a vertente teórica do mais recente lançamento da Fiat, pelo que importa perceber como se comporta este novo 500. O primeiro aspeto a destacar é a conceção mais madura do habitáculo. A versão ensaiada Cabrio La Prima contava com todas as mordomias de tecnologia, como o ecrã tátil de 10 polegadas ao centro, as jantes de 17″ e os elementos mais requintados do design a bordo. No puxador interior da porta uma primeira mensagem meio escondida quanto à sua génese – ‘Made in Torino’ (feito em Turim) – junto ao botão que permite abrir a porta.

A posição de condução melhorou substancialmente – algo que no 500 anterior era elemento pouco atrativo, sendo estranhamente alta para um citadino tão compacto -, bem como toda a ergonomia envolvente – há mais espaço, mais desafogo entre os passageiros da frente, havendo até um espaço livre entre os dois bancos mais junto à consola central. Os plásticos predominam, mas há rigor na construção dos principais painéis – mesmo tratando-se de modelo pré-série, ou seja, ainda com melhorias a fazer – e detalhes como a madeira que pode receber impressão tridimensional de padrões e grafismos. Pouco abaixo do ecrã central estão os grandes botões para os comandos de funcionamento do motor elétrico, em lugar de uma alavanca da caixa.

A condução inicia-se de forma tranquila, com o novo 500 a fazer ecoar – sempre ao primeiro arranque – a tal melodia de ‘Amarcord’. Não estamos num filme italiano, mas até que gostaríamos. A motorização de 118 CV é bastante ágil para que nos movimentemos com grande destreza, tanto na cidade, onde naturalmente o binário do motor elétrico está mais do que apto para todas as ocorrências. Progressivo nas acelerações, confirma a tendência de que as marcas estão a adaptar as suas opções de motores elétricos para paralelismo com os motores de combustão. Mais suaves a ganhar velocidade, já que um citadino não precisa de fazer os zero aos 100 km/h em seis segundos…

Seja como for, ótima destreza, sobretudo no modo ‘Normal’, que é um dos três modos de condução disponíveis. Aqui não há opção desportiva, mas sim ‘Normal’, ‘Range’ e ‘Sherpa’, esta última muito mais restritiva nas performances e nos gastos dos sistemas consumidores de energia, como a climatização, aumentando por outro lado o efeito de travagem da regeneração. A velocidade máxima passa a estar limitada a ‘apenas’ 80 km/h. O intuito é prolongar a autonomia.

No nosso contacto, com cerca de 100 quilómetros percorridos entre nacionais, cidade e até um pouco de via rápida, sentimos que o modo ‘Sherpa’ é útil na grande maioria das utilizações, ainda que se sinta uma diferença nas acelerações, sobretudo, para o modo ‘Normal’. A diferença de autonomia é de cerca de 20 quilómetros entre cada um deles – o ‘Sherpa’ pode representar, assim, mais ou menos, 40 quilómetros adicionais de autonomia face ao modo ‘Normal’, mais afoito e despachado. Vale a pena ainda mencionar que, sempre que o acelerador é pressionado a fundo, o binário total é entregue, mesmo no modo mais eficiente, com o sistema de comando eletrónico do 500 a entender que o condutor necessita daquele ‘boost’ naquele momento.

O ‘Range’ pretende oferecer um patamar intermédio entre autonomia e prestações. No total, obtivemos uma média de 13.0 kWh/100 km, com 168 quilómetros de autonomia restante (no modo ‘Sherpa’) e 66% da bateria.

O comportamento do 500 também está muito mais adulto e composto, com bom isolamento acústico do ruído exterior e uma sensação de maior robustez geral. Mais segurança, mais estabilidade e um compromisso muito acertado entre conforto e dinamismo, auxiliado pelas jantes de 17″ da unidade ensaiada.

Em suma, o novo 500 elétrico deixou uma ótima impressão geral, mostrando-se evolução correta e acertada do modelo anterior (que não sai de cena, ainda, atenção), ganhando em qualidade, tecnologia, eficiência e design, que continua a ser um ponto forte. Poderá não vir a ser o ‘bálsamo’ para todas as necessidades dos clientes – sobretudo, para quem pretende fazer viagens mais longas -, mas este 500 está na rota certa para o sucesso. As encomendas já estão abertas para os Icon e La Prima, com os restantes a chegarem ao longo do primeiro trimestre de 2021.

Falta ainda abordar a questão dos preços – a gama arranca nos muito apelativos 23.800€, numa medida que procura democratizar a eletrificação.

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