Honda Civic 1.5 Turbo Sport: Espírito VTI em desportivo ‘light’

03/08/2017

Os entusiastas da Honda certamente que ainda hoje exprimem um sorriso largo ao ouvir a sigla VTI. Não aquela que o Grupo PSA também utilizou para um dos seus motores, mas aquela que surgia em junção à denominação Civic há alguns anos.

O motor de 160 CV granjeou grande sucesso, numa primeira instância quando saiu para o mercado, entre os condutores mais despachados e, numa fase posterior, entre os entusiastas da transformação automóvel, os tuners, que tinham nesse bloco B16A uma ferramenta privilegiada para as suas ‘obras’ de aprimoramento. Algumas décadas passadas, tecnicamente, muito se alterou. O antigo motor atmosférico que era simpático de ‘puxar’ até bem perto do ‘redline’ – com entrada em cena do comando variável das válvulas VTEC algumas rpm antes – deixou de ser apropriado para os tempos atuais e no seu lugar surge uma unidade turbo de injeção direta que apela a uma nova sensação de utilização.

Contudo, o seu espírito parece reabilitado. A ideia de que este é um familiar com rapidez e com ‘alma’ para ritmos fortes volta a estar bem presente, mesmo que agora a concorrência seja bem maior do que no início da década de 1990, quando a geração EG (1991-1995) ganhou o seu estatuto e tornou a Honda numa marca a ter em conta no momento de escolher um ‘sporty wannabe‘. O mesmo é dizer: aquele jeitinho desportivo de que se gosta tanto.

‘Bela’ com ou sem ‘senão’?

O novo Civic é um carro que tem uma premissa peculiar: é polarizador ao primeiro olhar. E ao segundo. Muitos gostarão, outros irão torcer o nariz em jeito de ‘escárnio e maldizer’. Mas ninguém ficará indiferente e isso acaba por ser uma característica bem interessante desta décima geração do Civic.

A frente é moldada pelos grandes faróis rasgados (com luzes diurnas LED) que se colam à grelha, enquanto na traseira, os farolins voltam a marcar presença com um estilo em formato ‘C’. O óculo posterior mantém a sua divisória na parte inferior, mas a visibilidade para trás é agora bem melhor do que nos dois Civic anteriores. Depois, há detalhes que deliciam: o spoiler superior tem pequenos geradores de vórtice no plano inferior e a dupla saída de escape central no caso da versão Sport remetem-nos para um outro patamar de arrojo estético que – lá está – ou se adora ou se detesta na mais subjetiva das apreciações que se pode fazer a um automóvel. Aos olhos do escriba de ‘serviço’ apenas as aberturas simuladas nos para-choques são um excesso algo disparatado. ‘Nem tanto ao mar, nem tanto à terra’, como se convencionou referir no adágio popular.

No interior, tal como já foi referido no ensaio ao modelo com motor 1.0 Turbo VTEC de 129 CV, foi abandonado o estilo demasiadamente futurista, adotando-se, ao invés, um visual mais moderno, mas sem exageros. A posição de condução é excelente, beneficiando do facto de esta nova geração permitir uma maior proximidade do banco ao solo, com os comandos perfeitamente integrados: volante de diâmetro reduzido logo ao lado da alavanca da caixa de seis velocidades com manuseamento sublime. Junto ao comando da caixa ficam ainda os botões de travão de parque, ativação do ECO, Start-Stop e suspensão adaptativa, um suplemento do qual falaremos mais adiante.

O sistema de infoentretenimento açambarca a grande maioria das funcionalidades do veículo, desde a conectividade aos smartphones (Android Auto e Apple CarPlay), à climatização, passando ainda pelos dados de consumos, por exemplo. Fica o lamento, uma vez mais, da passagem do botão do volume para teclas táteis no ecrã de 7″. Pouco intuitivo, acabei por ir demasiadas vezes ao botão de regulação da temperatura que fica situado logo abaixo do ecrã no lado esquerdo quando o objetivo era baixar o volume do rádio. Os comandos do sistema multimédia no volante (à esquerda) também requerem habituação…

A construção do interior é de muito bom nível na grande maioria dos aspetos, embora alguns dos detalhes ainda sejam melhoráveis, sobretudo com a utilização de alguns plásticos em posição muito evidente no habitáculo, além do posicionamento pouco funcional das entradas USB e HDMI num patamar inferior do túnel central.

Quanto à habitabilidade, muito sucintamente, o espaço para as pernas e em largura é muito bom (aproveitando o facto de ser mais comprido), mas peca por alguma limitação em altura, sobretudo nos bancos traseiros, onde pessoas de maior estatura poderão ter maiores dificuldades. Nota muito positiva, por outro lado, para a capacidade da mala com os seus cavernosos 478 litros que podem ainda ser ampliados com o rebatimento dos encostos dos bancos traseiros (mesmo que daí não resulte um piso plano de carga). Se gostava dos ‘bancos mágicos’ atrás poderá ficar triste em saber que os mesmos desapareceram para dar espaço a uma nova configuração do eixo traseiro – de regresso ao multibraços em lugar do eixo de torção. Uma troca muito benéfica em termos dinâmicos e que, em boa verdade, deixará poucas saudades do esquema de bancos ao estilo de bancos de cinema.

Motor+chassis = Diversão ao volante

Comece-se por uma premissa muito simples: este é um carro para quem gosta de conduzir. Beneficiando de uma plataforma inteiramente nova e mais leve em 16 kg, mas mais rígida estruturalmente, o novo Civic tem uma agilidade que o posiciona como uma das referências – se não ‘a’ referência – no segmento dos familiares compactos. Face a uma direção muito precisa e com bom ‘feedback’, a suspensão tem um desempenho de elevada competência, sobretudo quando se entra numa estrada sinuosa. A frente é incisiva e entra facilmente em curva, com o eixo traseiro a seguir de forma muito ordeira as ordens que lhe damos. É fácil explorar o Civic e querer levá-lo um pouco mais além, tal é a conivência que nos presenteia em condução mais veloz. Aliás, só isso já ajuda a explicar a eficácia do novo Civic Type R, desportivo compacto que chega ao mercado dentro de alguns meses e que é o atual recordista do Nürburgring Nordschleife para carros de tração dianteira. A base é a mesma. E é tão sólida que o resultado só poderia mesmo ser bom.

Mas o melhor de tudo é que o faz sem prejudicar em demasia o conforto. Aliás, é outras das suas premissas elementares: a conjugação entre dinâmica e conforto, uma vez que muito raramente os ocupantes se poderão queixar do estado do piso. No caso do modelo em ensaio, a suspensão adaptativa (modos Sport e Normal) tornam a condução algo diferenciada, valendo a pena para quem procura aquele pequeno extra suplementar ao volante, um pouco mais de firmeza em curva. Em modo Normal, a absorção das irregularidades é muito boa, sendo menos interessante no modo Sport, mas longe de dramático. Os pneus de 17″ também terão uma quota-parte de responsabilidade nessa capacidade. A travagem é muito eficaz.

Já o motor é uma grande surpresa. Não tendo um antecessor direto (o anterior 1.8 VTEC de 142 CV fica mais perto do bloco 1.0 de três cilindros), este 1.5 Turbo de 182 CV de potência e 240 Nm de binário entre as 1.900 e as 5.500 rpm (sim, até às 5.500 rpm…) afigura-se como uma opção enérgica para o Civic, contribuindo para esse seu carácter desportivo. Muito ‘redondo’, o motor com turbocompressor acaba por ser muito linear na entrega da potência, oferecendo respostas muito rápidas sobretudo em aceleração ou em qualquer uma das quatro primeiras relações de caixa em situação de recuperação. Célere, este motor permite imprimir ritmos fortes sem grande esforço, sendo até capaz de ser levado a rotações mais altas sempre a ‘debitar força’.

No que toca a relações de caixa, a quinta e, sobretudo a sexta, são mais pensadas para a eficácia dos consumos, que tendem a ser um pouco exagerados – no nosso ensaio era frequente andar pela casa dos sete litros de média, tendo terminado os 100 km de teste (com 60% de cidade e os restantes entre nacionais e vias rápidas sempre a velocidades legais) com uma média de 7,3 l/100 km. Nota, ainda, para a boa insonorização deste motor.

Resta falar dos aspetos de equipamento: a Honda propõe para o Civic um leque muito completo de tecnologias e de elementos, como o Honda Sensing que oferece uma série de sistemas de segurança como a travagem de emergência em cidade, o alerta de colisão dianteira, o alerta de saída de faixa, ar condicionado bi-zona, suspensão adaptativa, saída dupla central atrás, cruise control adaptativo, carregamento sem fios do smartphone, leitor de sinais de trânsito e sistema multimédia Honda Connect, entre outros. Tudo isto por um custo de 33.710 euros da variante Sport Plus (a variante Sport tem um custo de 31.710 euros, sendo também a porta de acesso ao motor 1.5 Turbo). A marca tem uma campanha de valorização de retoma de veículo na ordem dos 1.500 euros no caso de aquisição de um Civic novo, pelo que poderá ficar mais em conta.

VEREDICTO

O novo Honda Civic é aquele por que a marca esperou quase uma década. Solidamente construído, com uma plataforma rigorosa que permite condução exemplar, muito equipamento disponível e uma gama de motores que, por enquanto, é toda a gasolina, mas tremendamente competente, o Civic chega à décima geração mais forte do que nunca. O estilo é sempre polarizador, mas é uma questão de gostos e não se pode apontar o dedo à Honda por querer ser diferente numa era de ‘estilisticamente correto’. O motor 1.5 Turbo não será o mais vendido, mas é aquele que – neste momento e de forma racional (o Type R é já doutra ‘liga’) – permite tirar melhor partido de tudo aquilo que o Civic tem para oferecer, com prestações de muito bom nível próximas às de um desportivo disfarçado (0 aos 100 km/h em 8,2 segundos) e competência para o dia-a-dia entre a viagem pela serra e o passeio rumo ‘à terra’ com a família e bagagens.


Manual ou CVT?

A pergunta coloca-se, neste caso, porque o Civic de nova geração conta com variantes de caixa manual de seis velocidades e automática de variação contínua (CVT), servindo esta última de opção para quem procura uma condução mais tranquila sem o ‘incómodo’ do pedal esquerdo. As caixas CVT têm vindo a ser adotadas por diversas marcas pelas suas qualidades de eficiência em termos de consumos e de emissões, surgindo igualmente nesta geração do Civic como uma das opções para o motor 1.5 Turbo de 182 CV.

Face a uma caixa automática, as CVT caracterizam-se pela sua atuação… contínua. Ou seja, não conta com várias relações e engrenagens, mas sim com uma correia e duas polias que conseguem variar o seu diâmetro e assim fazer variar as rotações do motor. Este sistema é efetivamente mais eficiente em termos energéticos e oferece, teoricamente, um número infinito de variações para manter o motor no seu regime mais eficiente na maior parte das vezes, além de se traduzir em maior suavidade na condução. Daí ser muito utilizada em modelos híbridos.

A Honda é uma das marcas que aposta neste sistema e percebe-se que a mesma está direcionada a um tipo de cliente que prefere a tranquilidade da condução, mas o novo Civic com caixa CVT também partilha alguns dos méritos descritos na variante com caixa manual. Nomeadamente, o refinamento da condução, que é um traço identificativo deste modelo com exceção das acelerações mais fortes. Aí, a caixa CVT tende a demonstrar aquele ‘feitio’ pelo qual muitos dos condutores a evitam: a sua aparente insistência num regime elevado sem correspondência ao andamento prático. O motor é assim levado para um patamar de rotações mais elevado e contínuo, com o ritmo do carro a não subir de forma tão proporcional, ainda que no caso da unidade montada neste Civic esta seja uma questão mais mitigada.

A Honda tem, desta forma, alguns ‘truques na manga’ com esta caixa CVT: em primeira instância, a sua suavidade é realmente interessante, funcionando com tranquilidade em cidade e de forma eficaz em velocidades estáveis de autoestrada, esforçando-se por manter o motor num patamar não intrusivo em termos de ruído. Isso permite-lhe posicionar-se como uma boa aliada na condução quotidiana, que parece ter sido um dos objetivos da marca nipónica.

Em parte, essa intenção dos engenheiros da Honda é concretizada pelo facto de oferecer o seu binário máximo – 220 Nm, menos 20 Nm do que com a caixa manual – logo às 1.700 rpm. Logo, promove respostas mais eficientes desde uma faixa muito baixa de rotações, além do facto de uma parte do seu binário estar disponível em redor das 1.500 rpm, denotando igualmente a competência deste motor 1.5 Turbo de quatro cilindros, turbocompressor e injeção direta.

A aceleração sente-se de forma firme e as recuperações também demonstram muita competência, o que no caso premente é uma notícia bem-vinda. Pressione-se o pedal com maior suavidade e a aceleração e o ritmo tornam-se mais síncronas, evitando-se assim o maior ruído do motor. Ou seja, de forma muito clara é importante perceber que, em condução que não seja exigente – com velocidade estáveis ou baixos ritmos – o binómio motor/caixa tem funcionamento célere e suave, mas caso se ‘aperte’ com ele aumenta o ruído e sente-se a falta das passagens de relações.

A este respeito, caso o condutor queira, pode mudar de velocidades a partir das patilhas atrás do volante, mas ainda que ofereça algum interesse (uma solução de que a Honda não é única utilizadora), não é verdadeiramente uma opção de âmbito desportivo como aquela que é oferecida por uma caixa automática de dupla embraiagem como a que montam muitos dos rivais deste segmento. Assim, mesmo em comparação com a versão 1.5 do Civic com caixa manual, a opção pela caixa CVT é apenas apelativa para quem quer mesmo uma solução de maior tranquilidade em associação a um motor 1.5 de grande disponibilidade. Se o consumo médio anunciado é de 6,1 l/100 km, o valor obtido no ensaio, em condução realista, até é bem positivo, com 7,4 l/100 km de valor combinado.

Depois, há o preço. O facto de surgir com esta caixa de variação contínua aumenta o preço em 1.300 euros, levando este Civic para os 33.010 euros na variante Sport ou 35.010€ na versão equivalente Sport Plus. Caso prefira mesmo uma condução mais desportiva, com prazer de condução reforçado, opte pelo modelo com caixa manual de seis velocidades, cujo manuseamento é inclusivamente um dos seus pontos fortes. Se não está interessado em fazer passagens de caixa por si e quer um Civic de nova geração, a caixa CVT está à sua espera (até porque nem há outra opção). Mas pode querer olhar para o motor 1.0 Turbo de três cilindros com 129 CV de potência e igual solução de caixa: mais acessível e igualmente funcional.

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