Jaguar I-Pace: E não é que o felino elétrico também ruge?

24/01/2019

Visualmente, o I-Pace é uma pedrada no charco, uma confirmação de que a mobilidade elétrica não se confina ao capítulo da banalidade, nem do marasmo. Sensual e dinâmico, o I-Pace assume-se como uma das propostas mais desejadas do segmento dos elétricos, concorrendo com a Tesla no campo dos crossovers elétricos de alta capacidade.

Chamando a atenção por onde passa, o I-Pace junta-se à gama SUV da Jaguar, o F-Pace e o E-Pace, mas surge como uma espécie de ‘tudo-em-um’ visual. Consegue ter o aspeto de um coupé desportivo, mas, elevando a suspensão pneumática opcional (1633€) para pisos fora do asfalto, fica a parecer um todo-o-terreno dinâmico.

No entanto, com as opcionais jantes de 22 polegadas (um extra por 6201€), não se aconselham grandes aventuras fora do asfalto, servindo muito mais como um garante de maior estabilidade em curva, capítulo em que este I-Pace sobressai de forma muito evidente. O centro de gravidade bastante baixo, graças à colocação do pack de baterias em posição central sob o piso do veículo, e a distribuição de peso ótima entre os dois eixos (50:50) contribuem bastante para uma dinâmica que consegue surpreender, mostrando-se seguríssimo em curva, valendo-se ainda de direção precisa e informativa.

Outro segredo para a obtenção dessa agilidade felina em percursos sinuosos prende-se com a integração do pack de baterias na própria estrutura do veículo, com a marca britânica a indicar que o I-Pace é o modelo mais rígido na sua gama inteira.

Nada que afete, no entanto, o conforto e refinamento de marcha (ainda que não pareça tão silencioso a bordo como, por exemplo, alguns rivais com… motor de combustão), com a suspensão e o chassis a mostrarem suavidade na absorção de irregularidades e do mau piso. Algo que deve, em igual medida, ao esquema de suspensões de triângulos duplos na dianteira e multibraços independente na traseira, num ‘packaging’ pensado para uma vivência requintada e desportiva, sem que sejam mutuamente exclusivas.

Sistema poderoso

Para este seu primeiro elétrico, a Jaguar escolheu um sistema composto por dois motores síncronos de íman permanente com uma potência combinada de 400 CV (294 kW), um por cada eixo para tração integral com vetorização de binário para que consiga transmitir os 696 Nm de forma eficiente às quatro rodas. E de que forma. O Jaguar é bastante rápido a acelerar, impulsionando-se para a frente com a mesma genica de um felino em pose de ataque, mostrando uma veia desportiva que lhe assenta bastante bem e que faz jus ao legado da marca enquanto se aventura nesta nova era. A aceleração dos zero aos 100 km/h cumpre-se em 4,8 segundos, para uma velocidade máxima de 200 km/h. A caixa automática de relação única serve de meio de transmissão da potência.

Um dos detalhes que mais nos fascinou na condução foi o da sonoridade da motorização que, ao contrário do que a maioria dos fabricantes propõe, não é totalmente muda. Pelo contrário, emite um rugido, como se lá na ‘fábrica’ dos cavalos existisse essa ‘velha’ combustão interna. Um detalhe que irá agradar aqueles que ainda não se conseguem desprender – na totalidade – das amarras de um século de história automóvel.

Com modos de condução à escolha, é naturalmente o modo ECO que melhor poupança oferece em termos de consumos, ao passo que o modo Dynamic transmite as melhores respostas e eficácia nos arranques e recuperações. Entrando no capítulo da autonomia, vale a pena reparar que a marca afiança um valor estimado de 470 quilómetros no ciclo WLTP (no ciclo de baixo consumo, reduzindo-se para 415 km no teste energético alto), embora nos pareça muito otimista. Isto porque o consumo tende a ser um pouco mais forte do que o anunciado, sendo muito mais pragmático apontar para 350 quilómetros com uma única carga, o que já é bastante bom. O nosso consumo alcançado com uma condução normal, respeitando os limites de velocidade e com 100 quilómetros divididos por cidade, nacionais e autoestrada, foi de 25.5 kWh/100 km.

Há formas de potenciar esse valor, seja com um maior aproveitamento do piso ou com o recurso ao modo mais intenso de regeneração de energia decorrente da travagem que, em última instância, consegue desacelerar o veículo até à sua imobilização sem recurso ao pedal do travão (com uma intensidade que pode ir até aos 0.4 G). Pena, no entanto, que esse comando esteja situado num menu secundário do sistema de infoentretenimento na consola central (denominado ‘O Meu EV’, no qual são apresentados muitas outras informações sobre o sistema elétrico).

A bateria de iões de lítio de 90 kWh permite essas prestações extemporâneas e a autonomia longa, mas tem ‘peso’ a carregar. No modo ideal, utilizando o carregamento rápido com postos de 100 kW (DC), 40 minutos chegam para restabelecer a bateria dos zero aos 80% (mais ou menos), enquanto no segundo método preferencial, com uma wallbox de 7 kW (AC), o tempo de recarga dos zero aos 80% é de dez horas. Quando nada disto está disponível, resta a tomada doméstica e aqui a espera é longa. E por longa entenda-se mais de um dia. Ligado à corrente com 15% de carga, o sistema indicou que para a carga completa faltavam ainda mais de 32 horas. No entanto, esta é uma circunstância que é facilmente contornada para quem quer abraçar a vida da mobilidade elétrica, já que a wallbox serve para a grande maioria das necessidades.

Detalhes aerodinâmicos

A aerodinâmica foi muito trabalhada para fomentar a eficiência, como os puxadores das portas retráteis automaticamente ou até a solução escolhida para manter o traço característico da grelha dianteira – que potencialmente torna a aerodinâmica mais ineficiente e é desnecessária para um elétrico por não ter motor para refrigeração, como os convencionais – atestam bem o cuidado da Jaguar. Neste caso, a parte superior da grelha tem uma superfície arredondada que leva a um buraco para canalizar o ar diretamente para o capot. Com isso, consegue criar também maior carga aerodinâmica a velocidades mais elevadas.

Funcionalidade acrescida

O interior do I-Pace remete para uma mescla de modernismo tecnológico com requinte de materiais e de construção, a que se juntam detalhes de maior comodismo, como os espaços de arrumação em grande número ou a habitabilidade ótima, sobretudo quando instalados nos bancos traseiros, num ambiente de luxo. O enorme ecrã tátil na consola central permite acesso a diversas informações e mostradores específicos do modelo, com teclas de atalho na zona inferior a permitem maior rapidez no seu manuseamento.

Pouco abaixo, está outro ecrã tátil que serve como auxiliar para acesso rápido a funcionalidades dos bancos, ao smartphone ou ao sistema áudio – não é solução ideal por estar em posição mais baixa e obrigar a desviar o olhar, mas é interessante pelo cunho tecnológico. Também o condutor beneficia de um ecrã digital para leitura das informações relacionadas com a condução, tendo ainda o bónus de ser configurável a gosto.

Por outro lado, além da habitabilidade sem reparos, há ainda muito sítio para guardar objetos no habitáculo e bagageira com 505 litros de capacidade a que acresce ainda o pequeno espaço localizado sob o capot dianteiro. Menos compreensível é o facto de, num modelo deste gabarito, a tampa da bagageira não ter acionamento elétrico por botão.

O equipamento é mais do que adequado para um preço base de 80.823€, com elementos como as jantes de 18 polegadas, ar condicionado automático bi-zona, arranque de baixa tração (que maximiza as capacidades em condições de aderência reduzida até aos 30 km/h, desativando-se de seguida), regeneração de travagem maximizada, alhetas ativas (aerodinâmica ativa, com alhetas que se abrem quando é necessário arrefecer a bateria e fechando-se quando não são necessárias), suspensão passiva, All Surface Progress Control (ASPC) e sistema Touch Pro Duo com dois ecrãs táteis de 10″ (superior) e de 5″ (inferior).

No capítulo da segurança, conta com travagem de emergência, cruise control, monitor da condição do condutor, Reconhecimento de Sinais de Trânsito e Limitador de Velocidade Adaptativo (podendo ajustar a velocidade do seu veículo em conformidade), assistência à Manutenção na Faixa, câmara traseira ou o Park Pack.

Porém, atenção aos extras que, chamativos, poderão elevar a fatura final. Exemplo disso são as jantes de 22″, com um custo de 6201€, ou a pintura metalizada, que soma 1023€. Os bancos Performance da versão ensaiada, noutro exemplo, custavam quase 9000€, com ótimo suporte do corpo, aquecimento e ventilação. Somando um pouco aqui e outro pouco acolá, a fatura final ficaria em 105.850€.

VEREDICTO

O Jaguar I-Pace é uma interpretação arrojada e entusiástica da mobilidade elétrica, inserida no próprio estilo da marca britânica. Prestações de elevada intensidade, com os seus 400 CV e 696 Nm a servirem de incentivos para ritmos velozes, aliam-se à autonomia real em redor dos 350 quilómetros – ou um pouco mais se se for mais comedido no ritmo. Mas é no conjunto verdadeiramente moderno e refinado que a Jaguar marca pontos, com um modelo bem concebido, eficaz, dinamicamente irrepreensível sem pecar no conforto. Não é propriamente acessível, mas os seus 80 mil euros estão perfeitamente justificados pelo vanguardismo técnico da motorização e pelas soluções a bordo. Além disso, a qualidade geral do Jaguar é evidente.

Os rivais irão surgir em peso no mercado, a começar pelo Mercedes-Benz EQC, passando pelo Audi e-tron quattro, tendo ainda como opositor o badalado Tesla Model X. Uma entrada em grande na eletrificação por parte da Jaguar.

Autonomia – TEL* WLTP 470 km
Autonomia – TEH** WLTP 415 km
WLTP – TEL* 22 kWh/100 km
WLTP – TEH** 24,8 kWh/100 km

*TEL (Teste Energético Baixo)

**TEH (Teste Energético Alto)

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