Ensaio Renault Twingo GT: Só as riscas dão-lhe mais 10 CV

18/12/2017

No segmento dos utilitários, poucos modelos há que tenham cariz desportivo ou grande arrojo dinâmico específico. Neste sentido, o Renault Twingo GT é uma ‘pedrada no charco’: o modelo da Renault submeteu-se aos talentos da Renault Sport (R.S.) e o resultado é um pequeno utilitário de alma mais desportiva, sem cair em exageros que lhe retirem a sua funcionalidade de base.

Criado em parceria com a Daimler (que tem o seu equivalente no smart forfour Brabus), este novo Twingo tem uma preparação específica em diversos campos, desde o chassis à suspensão, passando ainda pela inevitável adoção de uma mecânica 0.9 TCe de 110 CV que aqui funciona muito bem atendendo ao seu baixo peso.

Ar de ‘bad-boy’

Mas o que seria de um pretendente a desportivo se não houvesse a correspondente imagem de ‘bad-boy’? A Renault Sport pensou nisso, muito claramente, e dotou este GT de uma série de elementos próprios que lhe dão um ar muito rebelde. Para começar, a cor, um laranja metalizado que não deixa de chamar a atenção por onde passa, combinando-se bem com os gráficos dispostos ao longo da carroçaria. Gracejando, alguém disse à sua passagem que só as riscas “lhe dão mais 10 CV”. Não dão, é um facto, mas o ar de ‘bad-boy’ ninguém lho tira. E há que convir que as riscas na carroçaria são tradicionais em desportivos mais aguerridos, pelo que a intenção é boa…

Além disso, as jantes de 17 polegadas (com pneus Yokohama 185/45 à frente e 205/40 no eixo motriz, o traseiro) são também específicas e acentuam um visual ousado que é bem-vindo, o mesmo se aplicando à tomada de ar colocada acima da cava da roda traseira do lado esquerdo, a qual serve para o turbo, mas que também parece evocar os tempos de um mais radical R5 Turbo doutros anos.

Tecnicamente, trabalhou-se na suspensão, com amortecimento ligeiramente mais firme (fruto de molas mais duras), recebe direção com desmultiplicação variável em função da velocidade e barras estabilizadoras de maior diâmetro. O controlo de estabilidade não se desliga (esqueçam o drift, rapazes…), mas a marca garante que foi afinado para oferecer maior liberdade.

Desportivo sim, mas com reservas

Ao volante, em primeiro lugar, aquilo que causa estranheza no Twingo GT é a sua posição de condução, já que o piso é muito elevado, o que resulta, de forma óbvia, num posicionamento igualmente alto. Mas os bancos fornecem um bom suporte lateral, além de terem decorações específicas que ajudam a criar um ambiente mais desportivo. Ligando o motor, percebe-se uma sonoridade ligeiramente mais grave oferecida pela dupla de escapes, outro dos predicados visuais exteriores que marcam esta versão.

Acelere-se e o Twingo GT é expedito a ganhar velocidade, tão expedito que seria um GTI de pleno direito noutras décadas. O motor 0.9 TCe de três cilindros, aqui com mudanças na admissão e na gestão eletrónica, tem um carácter que vale a pena explorar, sobretudo nos regimes mais altos porque é aí que está o seu momento mais enérgico e mais vigoroso. Mesmo nas retomas de velocidade, graças aos 170 Nm de binário, consegue ombrear com outras propostas de segmentos superiores.

Mas, este é um motor que tem uma atuação faseada em virtude da entrada em ação do turbo. Nas primeiras 1500 rotações, o ganho de velocidade é notório, mas não muito intenso. Contudo, mantenha-se o pedal do acelerador pressionado e o Twingo GT ganha nova alma quando o turbo entra em ação, o que acontece por volta das 2000 rpm. Daí para cima, o Twingo GT assemelha-se a um ‘diabo da Tasmânia’, galgando metros de forma ansiosa (0 aos 100 km/h em menos de 10 segundos são bom cartão de visita). Por outro lado, para um carro que se pretende mais desportivo (até porque tem uma assinatura R.S. bem vincada em diversos pontos da carroçaria), o Twingo GT tem uma lacuna que não se compreende: não há conta-rotações. A caixa de velocidades manual de cinco relações tem um escalonamento curto para privilegiar os arranques, tendo manuseamento correto, mas não excelente.

Bem positivos são os consumos: apesar da ânsia do motor turbo para subir de ritmo quando ‘puxado’, o gasto não é demasiado elevado. Se se conduzir de forma normal, sem os arranques da ‘praxe’ que as riscas na carroçaria parecem incitar, o Twingo GT rola pacificamente na casa dos cinco litros. No nosso ensaio, conseguimos uma média de 5,8 l//100 km, o que atesta a boa eficácia desta unidade quando a média anunciada é de 5,2 l/100 km.

Ágil e funcional

Mostrando que este não é um Twingo qualquer, o comportamento dinâmico é interessante sem que seja superlativamente entusiasmante, tanto mais que a direção tem um tato demasiado artificial e que a suspensão, trabalhada para ser mais firme, não evita rolamento da carroçaria quando se abusa na passagem em curva. Não deixa de ser veloz e competente, mas a altura ao solo e a direção não deixam que seja mais emotivo. Até porque a conceção de tração traseira nunca se revela ao condutor, fruto de um controlo de estabilidade que é dissuasor de manobras mais arrojadas.

Não obstante, enquanto utilitário atrevido, o Twingo GT tem um bom equilíbrio entre desportividade nas vias rápidas (onde surpreende pela rapidez) e comodidade em terrenos urbanos, para os quais este modelo foi desenhado, recorde-se. Aí, a passagem em irregularidades sente-se mais do que no modelo de base, mas não chega a ser incómodo. E tem um ângulo de viragem e agilidade que o deixam muito à vontade por ruas, travessas e vielas.

Tal facto ajuda a que mantenha o seu lado utilitário bem defendido, já que o espaço para os ocupantes é apreciável, ainda que os bancos traseiros tenham pouca distância para os da frente. A altura interior não é problema no Twingo, mas quem for muito alto pode ficar a bater com os joelhos no encosto do banco dianteiro, sendo necessário que este também facilite da sua parte com a movimentação do seu banco para a frente. A bagageira, sob a qual está situado o motor turbo, fica apenas na média do que o segmento oferece, servindo para pequenas escapadelas de fim de semana e para idas às compras com os seus 289 litros, ainda que o rebatimento do encosto dos bancos traseiros possa ampliar essa mesma capacidade para 980 litros. O interior está em bom nível em termos de construção, não desapontando na solidez de integração entre painéis, pese embora o recurso quase total a plásticos rijos. Atendendo ao seu segmento, nada a apontar de muito negativo neste Twingo GT.

No que diz respeito à funcionalidade, dois pontos curiosos que merecem ser partilhados: o motor térmico aquece ligeiramente a superfície da bagageira e se quiser aceder ao compartimento dianteiro para ver o nível da água, por exemplo, terá de realizar uma série de passos que implicam desmontar dois painéis da grelha dianteira, destrancar com a chave do carro, puxar dois clipes e fazer o capot sair de forma longitudinal. Não é defeito, é mesmo feitio. Detalhe não menos interessante é o da prateleira amovível colocado na consola central e que, por mais do que uma vez, em curva, se soltou depois de a perna lá bater…

Quanto a preços, o Twingo GT é proposto por 15.650€, que acaba por ser muito apelativo atendendo ao que oferece e ao conceito que defende.

VEREDICTO

Cumprindo os seus propósitos mais dinâmicos, o Twingo GT resulta num modelo mais reativa sem ser uma máquina desportiva de ‘corpo inteiro’. Um modelo que proporciona uma experiência de condução mais interessante sem que tenha de sacrificar os seus critérios chave de funcionalidade e agilidade urbana.

A Renault Sport empenhou aqui os seus esforços para dotar o Twingo de maior alma e criatividade dinâmica, mas não se esperem condições de utilização típicas de um Mégane R.S. ou até do anterior Twingo R.S, esse sim mais extremista. Antes, pense-se no Twingo GT como uma forma mais apelativa de se ter um Twingo e também um dos poucos modelos deste género disponíveis no seu segmento com um carácter que, em todo o caso, é elogiável pelo motor muito reativo e pelo seu posicionamento que o deixa quase isolado no segmento a que pertence.

Caso queira um modelo deste género, capaz de chamar a atenção e mostrar prestações competentes, o Twingo GT é proposta apelativa, até porque o preço é ajustado ao que oferece. E as riscas até parece que dão mesmo mais 10 CV…

FICHA TÉCNICA

RENAULT TWINGO GT 0.9 TCE
Motor: Gasolina, três cilindros, injeção indireta, turbo, intercooler
Cilindrada: 898 cm3
Potência: 110 CV/5750 rpm
Binário máximo: 170 Nm/2000 rpm
Tração: Traseira
Caixa: Manual de 5 velocidades
Aceleração (0-100 km/h): 9,8 segundos
Velocidade máxima: 182 km/h
Consumo médio (medido) em l/100 km: 5,2 (5,8)
Emissões de CO2: 115 g/km
Peso: 980 kg
Bagageira: 219-980 litros
Comprimento/Largura/Altura (mm): 3595/1646/1554
Distância entre eixos (mm): 2492
Suspensão Dianteira: MacPherson, independente
Suspensão Traseira: Eixo de torção
Pneus: 185/45 R17 (Fr) – 205/40 R17 (Tr)
Preço base (ensaiado): 15.656€

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