A Dacia propôs-se a um desafio ambicioso: conceber um veículo de baixo custo capaz de ajudar a democratizar a mobilidade elétrica. A equação tende a não ser fácil, pois os custos de produção e das baterias elétricas ainda não estão a par do que se espera num modelo de combustão, mas o Spring é um exemplo de uma tarefa bem-sucedida sem exageros e com a habitual robustez da marca romena.

Cruzamento entre um citadino e um crossover, o novo Dacia Spring traduz o arranque da ofensiva eletrificada da marca romena, saltando diretamente para a tecnologia 100% elétrica sem passar pelos híbridos (que também virão). O sucesso do novo Spring é comprovado desde o arranque das encomendas, havendo elevada procura para este automóvel em jeito de SUV (151 mm de distância ao solo em vazio) que pretende também apelar à vista através da irreverência.

As dimensões são compactas, embora as imagens possam enganar. Mede apenas 3734 mm de comprimento, 1579 mm de largura e 1516 mm de altura, para uma distância entre eixos de 2423 mm, o que se traduz num habitáculo à justa para quatro ocupantes (lotação máxima). A largura reduzida é característica com que se aprende a viver, enquanto o espaço atrás não é fantástico, sobretudo para a colocação das pernas, o que não surpreende atendendo às medições atrás mencionadas. Passageiros mais altos irão roçar com os joelhos nos bancos dianteiros. A bagageira compensa, de certa forma, oferecendo 270 litros, que é um valor interessante para o segmento.

O interior alinha-se pelo tradicional conservadorismo da Dacia, apostando em superfícies duras (plásticos) que dominam praticamente todo o habitáculo, desde o tablier aos painéis das portas. Sem grandes luxos, mas com a possibilidade, na versão Comfort Plus, de contar com um ecrã tátil de 7.0” ao centro, albergando o sistema Media Nav com sistema de navegação e conectividade aos smartphones. Infelizmente, optou-se por um comando de volume com teclas em vez de um mais funcional botão circular.

A posição de condução é elevada – o banco não tem ajuste em altura – , mas oferece boa visibilidade em todos os ângulos, havendo alguns detalhes que poderiam ser melhoráveis, nomeadamente o posicionamento de alguns botões em sítios de alcance mais difícil, como o de comutação (e reset) das informações do computador de bordo (ecrã digital de 3.5”), que se situa no próprio painel de instrumentos, no lado direito. Também conservadora a escolha de ligação do motor elétrico por intermédio de chave em canhão tradicional.

Com espaços de arrumação adequados e boa construção geral, o Spring acaba por proporcionar um ambiente acolhedor e sólido, sem muitas mordomias ou tecnologias distrativas, mas o essencial para viagens despreocupadas.

Boa surpresa eclética

Olhando para as especificações técnicas, pode causar alguma apreensão o valor de 33 kW/44 CV de potência e 125 Nm de binário máximo. Porém, os mesmos podem ser enganadores, porque o Spring também é leve e isso ajuda nas prestações, com o binário praticamente instantâneo a ser garantia de ritmos fáceis e condução despreocupada.

Essa agilidade de andamento faz com que o Spring ande ‘alegremente’ em cidade sem qualquer dificuldades para impor o ritmo adequado para aqueles locais, mesmo quando a estrada começa a subir. É dentro da cidade que o Spring exibe maior fulgor, cumprindo praticamente todos os predicados que seriam de esperar – rapidez de resposta, prontidão e direção leve para sair airosamente de todos os ‘apertos’ urbanos.

Até velocidades de 70 km/h, o Dacia Spring está em bom nível, nunca aparentando lentidão, mas é quando sai da cidade que ficam mais à vista algumas limitações – expectáveis, porém. Mesmo com a imediatez do motor elétrico, as retomas acima dos 60 km/h exigem um pouco mais de paciência (sobretudo quando no modo ‘Eco’ que limita a potência a 23 kW) e a velocidade máxima está cifrada apenas nos 125 km/h (levando algum tempo a lá chegar). Esforçado, não desaponta o condutor, mas importa reter que não tem ambições desportivas. Sobretudo, a bordo, nunca dá a ideia de sofreguidão de andamento, o que é um mérito para este pequeno SUV urbano.

O comportamento do Spring também não desaponta, apontando claramente a ritmos mais pacatos. A direção é leve e – se oferece pouco ‘feeling’ do que se passa na estrada – é direta q.b. para a cidade e adequada para fora dela, sempre prevendo que o condutor não prefira grandes correrias até porque a inclinação da carroçaria é notória quanto mais depressa se entra em curva. Agrada pela sua honestidade e pelo conforto, superando bastante bem o mau piso graças às jantes de 14 polegadas.

Por outro lado, a insonorização também é aspeto positivo, embora os ruídos aerodinâmicos se tornem mais evidentes quanto maior a velocidade.

Resta abordar a sua eficiência, que é um ponto que merece avaliação muito positiva. Combinando viagens de autoestrada, nacionais e cidade, o Spring retribuiu uma média de 10.4 kWh/100 km, valor mais do que positivo e que confirma também o bom trabalho feito ao nível da regeneração de energia. A bateria de iões de lítio tem uma capacidade de 27.4 kWh, prometendo uma autonomia de 230 quilómetros em ciclo combinado WLTP. Na prática, este é um valor muito realista, que não depende grandemente de uma condução excessivamente atenciosa com o consumo. Mesmo o regime de autoestrada não nos pareceu enormemente penalizador para este Spring, pelo que não se trata apenas de um citadino ‘puro e duro’, mas mais eclético nas suas abordagens (o nosso ensaio permitiu uma autonomia de 243 quilómetros).

Para carregar, basta aceder à tomada colocada atrás do logo da Dacia na grelha dianteira (cujo comando de abertura está situado sob o volante), admitindo um máximo de 30 kW em pontos de carga DC, nos quais repõe até 80% da carga da bateria em menos de uma hora. Em postos AC, permite máximo de 6.6 kW (em wallboxes de 7.4 kW), levando menos de cinco horas. Numa tomada doméstica a 2.3 kW, o tempo de espera é mais prolongado – 14 horas.

Tendo tudo isto em atenção, importa reter que o Spring tem no preço o seu grande trunfo, em associação a custos de manutenção mais baixos e a um lote de equipamento de série que é… essencial. De série, o Spring oferece direção assistida, ar condicionado manual, fecho centralizado, quatro vidros elétricos, sensor de luz e limitador de velocidade (o comando está colocado no volante), mas a versão versão Comfort Plus (18.800€) acrescenta outros itens como o já mencionado sistema Media Nav com ecrã de 7.0”, a câmara traseira ou os estofos em pele sintética (TEP) com detalhes em laranja. Entre os opcionais, vale a pena destacar o carregador de carga rápida de 30 kW (550€) e a pintura metalizada Azul (400€).

VEREDICTO

Simplista, mas não simplório, o novo Dacia Spring cumpre precisamente com a ambição a que se propõe: democratizar a mobilidade elétrica com uma proposta eficiente e competente que permite aceder ao campo da mobilidade elétrica sem renunciar a uma autonomia bastante decente para diferentes tipos de utilização. Naturalmente, sendo um modelo de baixo custo, não esconde algumas concessões em termos de ergonomia e de qualidade dos materiais, mas essa honestidade assumida também não lhe acaba por ser prejudicial.

Adaptado para quatro passageiros (também aqui com reparos pelo espaço atrás), o novo Spring mostra desenvoltura e competência de andamento acompanhados de conforto e de uma importante vertente de eficiência que faz dele um pioneiro na real democratização da mobilidade elétrica sem confinamento à cidade.

Outras opções serão mais potentes e mais espaçosas, mas nenhum tem este preço como trunfo. Neste aspeto, a Dacia demonstra superioridade.


MAIS
Conforto
Condução urbana
Autonomia realista
Boa eficiência
Estilo irreverente
Preço

MENOS
Prestações fora da cidade
Espaço acanhado no habitáculo
Excesso de plásticos a bordo

Ficha Técnica
Dacia Spring Comfort Plus
Motor Elétrico, síncrono de íman permanente, dianteiro
Potência 33 kW/44 CV
Binário máximo 125 Nm
Bateria Iões de lítio, 27.4 kWh (úteis)
Transmissão Tração dianteira, caixa de 1 vel.
Acel. 0-100 km/h 19,1 segundos
Vel. máxima 125 km/h
Consumo médio (WLTP) 13,9 kWh/100 km
Emissões CO2 (WLTP) 0 g/km
Autonomia (WLTP) 230 km
Tempo de carregamento DC (30 kW): 56 min. de 0-80%; AC (6.6 kW): 4h55h de 0-100%
Dimensões (C/L/A) 3734/1579/1516 mm
Distância entre eixos 2423 mm
Peso 1045 kg
Bagageira 270 litros
Pneus 165/70 R14
Preço 18.800€
Gama desde 17.400€

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