Manter ou não manter o ADN, eis a questão que guardámos para o primeiro ensaio com a nova geração do Defender. Adorámo-lo, mas deixou-nos com sentimentos mistos…

Depois de uma espera de três anos, chegou finalmente o sucessor do ancestral Defender. Nesse período transpiraram teasers e correu muita especulação em torno de como seria a nova encarnação do modelo mais icónico da Land Rover, e agora chega com fleuma triunfante. Mas haveria dúvidas de que o seu visual seria mais moderno do que ‘retro’ e de que teria uma veia mais ‘digital’ do que ‘analógica’? Não…

Daí que vários curiosos que nos abordaram e outros tantos a quem pedimos opinião tiveram visões contrárias. Há quem defenda que o Defender deveria manter-se fiel ao seu ADN, quer na aparência, quer na tecnologia, e outros que concordam que a ‘evolução da espécie’ não admitiria outra coisa que o caminho tomado pela marca britânica.

A comparação com o Jeep Wrangler é inevitável, pois o modelo americano era dos poucos que fazia frente ao Defender no feudo dos modelos TT ‘puro-e-duro’. E na sua mais recente geração faz um blend perfeito de classicismo estético e mecânico, sem deixar de integrar as mais modernas tecnologias de segurança e apoio ao condutor, sem esquecer mais alguns pozinhos que facilitam as aventuras fora de estrada.

Daí ser legítimo esperar que a Land Rover adotasse a mesma postura, para não desiludir os incondicionais da marca e do modelo. Mesmo os criativos da Mercedes-Benz tiveram de recuar nos seus planos iniciais de renovação do Classe G, quando confrontados com os protestos de clientes, potenciais clientes e aficionados. O design do novo ‘Gelandewagen’ acabou por inspirar-se por inteiro no modelo original, as soluções mecânicas mantiveram-se, grosso modo, e apenas no trem dianteiro passou a haver suspensão independente por troca do eixo rígido. O resto são detalhes de uma história de concessões feitas para não matar o mito. Um exemplo que a Land Rover não quis seguir.

A presença do alumínio estende-se agora à plataforma, denominada D7x (monobloco), que substitui o recurso clássico de chassis de longarinas em aço. Ganha-se na rigidez e na acomodação de toda a mecânica e sistemas de apoio. Da mesma forma, a suspensão deixa
de fora os eixos rígidos por arquiteturas independentes nos quatro cantos, ideal para o uso de elementos pneumáticos – de série no 110 e opcional no 90.

Isto acaba por ser um dos fatores determinantes na capacidade a vau do novo modelo – que chega aos 900 mm –, assim como no extremo conforto evidente em qualquer tipo de piso.

O Defender é animado por uma série de motorizações a gasolina e Diesel, todos da família Ingenium, e até terá uma versão PHEV, aliada a um motor a gasolina, o P400e. No nosso caso, calhou-nos o P400, que, como o nome indica, é uma unidade a gasolina que debita nada menos que 400 CV de potência. De realçar que se trata de um bloco de 3.0 litros sobrealimentado, de seis cilindros em linha, uma fórmula que parece estar novamente em voga – apenas a BMW manteve a tradição deste tipo de motores ao longo dos anos.

Um dos segredos desta motorização é o facto de ser mild hybrid, ou seja, tem o suporte de uma bateria secundária de lítio, que acumula energia e a liberta em momentos de maior aceleração, para auxiliar na redução de consumos – graças ao menor esforço do motor térmico. Isto não impede as médias de serem algo elevadas. Conseguir cifras abaixo dos 13,5 l/100 km é uma arte.

Este ‘seis-em-linha’ é um mimo de suavidade em cargas leves, mas torna-se irresistível nas acelerações mais vigorosas, graças à energia dos seus 550 N.m constantes entre as 2000 e as 5000 rpm. Isto faz com o Defender P400 desafie até o mais aguerrido dos pequenos desportivos – precisa de somente 6,1 segundos de 0 a 100 km/h – e, tratando-se de um SUV full size (no tamanho e conforto), viagens por estradas secundárias e autoestrada conseguem-se, descontraidamente, a ritmos inconfessáveis. Ou seja,
um completo contraste com o passado…

O opressor do desconforto

Toda esta dinâmica é conseguida com a cumplicidade da caixa automática de oito velocidades, rápida e decidida, munida de modo Sport/sequencial, para ainda maior entusiasmo, bastando puxar o seletor para a esquerda. Patilhas no volante não havia…

A árvore de transmissão integral contempla, naturalmente, redutoras para os caminhos mais trialeiros, complementada por bloqueio do diferencial central e, em opção, pelo bloqueio do diferencial traseiro. Perdurando o seu legado off-road, este Defender parece não conhecer limites quando toca a enfrentar os terrenos mais adversos.

E o mais desconcertante é que progride com a maior das facilidades. Não fosse ele um britânico de gema. Tudo, graças à força do seu motor e à eficácia do sistema de tração Terrain Response II – controlado no ecrã central –, que configura a mecânica e todos os sistemas eletrónicos em função do tipo de terreno selecionado. Motricidade nunca falta… Há, inclusive, a função Clear Sight Ground View, que permite visionar, pela câmara dianteira, o terreno que nos precede.

A par da já referida capacidade de passar cursos de água (ou a vau) com quase 1 metro de altura, a absorção da suspensão é simplesmente de espantar. Sentimos o tato do terreno e o controlo total da viatura sem que as irregularidades incomodem.

VEREDICTO

De regresso ao asfalto, a graciosidade com que nos passeia faz regressar aquela dúvida fundamental: por que terá a Land Rover concebido um Defender que proporciona a mesma experiência de um Range Rover? Porque na verdade, é o que sentimos. É ligeiramente menos desportivo que os seus primos mais elitistas, mas em pouco difere.

Curva como se pesasse apenas 1500 kg e não 2350 kg (na versão de 7 lugares), é consistente em apoio e incisivo como um Evoque. E apenas a sensibilidade do travão – pouco doseável – e a leveza da direção mancham uma receita muito convincente.

A marca de Solihul ainda tentou dar um ar mais rústico à sua nova criação através de parafusos a descoberto em alguns painéis e da utilização de materiais sintéticos em vez de pele natural, por exemplo. De resto, contudo, o interior tem um semblante perfeitamente premium, onde não faltam os ecrãs digitais e o comando hi-tech na consola central. Será pecado termos tido esperanças de encontrar um 4×4 mais rugoso, mais terra-a-terra, menos sofisticado e até mais acessível?

FICHA TÉCNICA
Land Rover Defender 110 S P400
Motor: Gasolina, 6 cilindros em linha, injeção direta, turbo, MHEV
Cilindrada: 2996 cc
Potência: 400 CV às 5500 rpm
Binário máximo: 550 Nm às 2000-5000 rpm
Tração: Integral, redutoras, Terrain Response II
Caixa: Automática de 8 velocidades
Aceleração (0-100 km/h): 6,1 segundos
Velocidade máxima: 191 km/h
Consumo Combi WLTP: 11,2 l/100 km
Emissões de CO2 WLTP: 258 g/km
Peso: 2286 kg
Preço base da versão: 90.608€
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