À terceira participação no Dakar, António Maio voltou a demonstrar as suas qualidades enquanto piloto nas duas rodas, terminando às ‘portas’ do top-20. O alentejano, que é o recordista em triunfos na Baja Portalegre, assume que a sua ambição é fazer mais e melhor no Dakar, esperando até que um dia possa chamar a atenção a uma das grandes marcas para poder lutar por outros objetivos.

Capaz de conciliar a carreira de militar da Guarda Nacional Republicana (GNR) com a de piloto semi-profissional, António Maio tem vindo a destacar-se nas duas rodas ao longo dos últimos anos, tendo este ano alcançado o seu melhor resultado no Dakar, com a 21ª posição final, uma prestação que poderia ter sido ligeiramente melhor se não tivessem sido os cerca de 50 minutos perdidos ao longo da prova, primeiro por uma fuga de combustível na sua moto e, depois, por ter de mudar o motor da Yamaha, numa situação que estava prevista desde o início.

Ainda assim, com este resultado, Maio cimenta a sua faceta como um dos pilotos mais regulares naquela competição, tendo melhorado face ao 27º lugar que obteve em 2020. A estreia, em 2019, ainda na América do Sul, ficou marcada por um abandono devido a problemas mecânicos e, em 2021, não lhe foi possível marcar presença na Arábia Saudita devido a responsabilidades profissionais. Além da sua prestação internacional, António Maio é também uma das principais figuras do Campeonato de Portugal de Todo-o-Terreno (CPTT), sendo hexacampeão. Mas é no Dakar que o piloto continua a centrar as suas atenções.

“A terceira participação já permite perceber mais o que é uma prova destas, com esta exigência e acabamos por perceber que, mantendo um ritmo constante o resultado aparece depois, naturalmente. Foi isso que tentei fazer em todas as etapas, sem arriscar muito, sem grandes aventuras. Às vezes, até prejudicando um resultado ou outro à geral, mas às vezes é preferível assim, para chegar ao fim e conseguir um bom resultado no fim do que arriscar e depois poder ter algum azar. Então optei por uma toada regular em todas as etapas. Efetivamente, numa delas, tive um problema com uma fuga de gasolina, ficando a sete quilómetros do reabastecimento e depois tive de ficar ali à espera que alguém parasse para me ajudar, que me desse gasolina. Não foi fácil, perdi ali 35 ou 40 minutos, o que fez com que perdesse alguns lugares na etapa e na geral, num dia em que até vinha a fazer uma boa etapa. Depois foi correr um pouco atrás do prejuízo desse tempo perdido. Depois, no dia de descanso, optámos por trocar o motor e, naturalmente, fomos penalizados com 15 minutos, mas já estava planeado, já estávamos a contar com eles à partida. Fomos dos poucos que mudámos o motor entre os pilotos da frente. Somando aquele problema que tive, foram quase 50 minutos perdidos mas que nos afastaram do nosso objetivo, que era o top-15, recorda o piloto, lembrando que, ainda assim, o resultado final foi satisfatório.

A sua meta mais ambiciosa aponta para um lugar final entre os quinze primeiros, mas também concede que são necessárias outras condições para atingir esse objetivo: “Acho que para um lugar no top-15 é preciso fazer um rali bastante consistente sem grandes percalços e aguardar que seja um rali um pouco diferente do deste ano, que teve poucas desistências, sem grande história a nível da navegação e fez com que as nossas diferenças fossem menores. Pilotos como eu, com poucos recursos, em que fui o primeiro não-profissional e o terceiro ou quarto de equipas não-oficiais, ficamos sempre à espera de um percalço dos outros para nos chegarmos à frente. Sendo um rali um bocadinho mais acessível, pelo menos daqueles dois que fiz, acabamos por não ter espaço para que os outros errem e nós não consigamos assim chegar à frente. Mas sim, acho que temos muito a melhorar, tanto eu como piloto, como a moto, sobretudo esta com bastantes coisas a melhorar. Tem também que ver com o orçamento que temos. Uma moto de rali é sempre uma peça única que nunca está acabada e acabamos por ter ali muitas coisas a fazer”, explica, referindo que a edição de 2023 trará uma mudança que lhe poderá ser benéfica.

“Para o ano, há uma pequena regra que nos poderá ajudar, que é a limitação da velocidade máxima aos 150 km/h, que é onde a minha moto perde bastante, na velocidade de ponta. Isso pode ser um ponto a nosso favor e vou tentar explorá-lo ao máximo. Penso que um top-15 é um objetivo alcançável com algum trabalho e sem grandes percalços”, refere.
“Os meus colegas da gnr perguntam-me como é que é possível. Eles, mais do que ninguém, sabem o meu dia-a-dia e o tempo que tenho para treinar”

No quadro das boas prestações, António Maio admite que gostaria de conseguir chamar a atenção a uma das grandes marcas da competição, num cenário que o piloto reconhece ser difícil, mas que está presente na sua mente.

“Eu acho que é cada vez mais difícil, porque há dez anos tínhamos uns cinco pilotos para lutar pela vitória, hoje temos 20 pilotos que podem ganhar o Dakar. Acabamos até por deixar de ter a imagem do aguadeiro que era uma rampa de lançamento para alguns pilotos que se queriam mostrar e iam ali como ‘mochileiros’ e isso acabou. Já não existe isso. As equipas oficiais têm todos pilotos para ganhar. Já não existem segundos pilotos e isso faz com que seja cada vez mais difícil para um piloto português [chegar a uma marca oficial]… Sabemos que estamos num canto do mundo e envolve também outras questões em termos de marcas e etc. Não é fácil. Mas eu estou no Dakar e faço a prova com esse objetivo: fazer o melhor possível e, como é óbvio, tentar chamar a atenção para que um dia possa representar uma marca ou uma equipa oficial e é esse o meu principal objetivo. Não estou no Dakar só para fazer a prova, se não já tinha feito e desistido, não é só para chegar ao final. O meu objetivo é mesmo vir a fazer parte um dia de uma equipa oficial”, afiança.

Ato de equilibrista de três carreiras

A edição de 2022 do Dakar trouxe para António Maio um outro tipo de dificuldade inédita: a função de pai novato, já que pouco antes da sua partida para a Arábia Saudita o piloto foi pai de gémeos. Sendo uma prova como o Dakar uma competição com riscos inerentes, a vertente psicológica da resiliência e a concentração no ritmo de competição foram fundamentais.

“Até para mim foi uma experiência nova, fui pai pela primeira vez e logo com dois, uma menina e um menino e tinham uma semana quando fui para o Dakar. Foi uma aprendizagem também para mim. Eles nasceram e eu não tinha tocado numa moto. Estava um bocado receoso do que iria sentir. Efetivamente, não foi nada fácil, mas nas especiais, como vamos tão concentrados na navegação e vamos com um ritmo elevado, acabamos por ter que ir 100% concentrados e não podes pensar no que está em Portugal. Mas, depois nas ligações que eram bastante longas, aí sim, a cabeça vai noutro lugar e questionamos muitas vezes, o que torna difícil o tempo a passar e parece que nos estão a puxar para trás. Mas acabei por digerir bem essa situação, acabei por arranjar motivação extra para voltar rápido e terminar rápido os dias e o Dakar. Acabou por ser uma boa motivação, uma motivação positiva”, explicou, adiantando ainda que estas suas participações na competição só lhe são permitidas pelo apoio da família.

Mas não é só da família que surge o apoio necessário, já que também os colegas de profissão de Maio reconhecem o empenho do piloto.

“Os meus colegas perguntam-me como é que é possível. Eles, mais do que ninguém, sabem o meu dia-a-dia e o tempo que tenho para treinar. São as pessoas que mais percebem e entendem e até dão mais valor porque sabem o tempo que eu disponho para treinar. Porque no mundo das motos, muitos pilotos pensam que eu estou mais tempo a treinar do que a exercer a minha função, mas estão um bocadinho desvirtuados da realidade. Na verdade, não é assim, sou comandante de destacamento de trânsito da GNR, o que envolve muitas noites, muitos planeamentos, muitas missões, muita responsabilidade e acabo por ter pouco tempo para treinar. Mas o apoio deles é incrível e acho que se sentem até um bocado orgulhosos por eu conseguir fazer aquilo que faço, e ainda ter o trabalho que tenho. É mais uma forma de me motivar”.

Para 2022, com o campeonato nacional já a começar [teve início entretanto com mais um triunfo para Maio nas duas rodas], o objetivo paralelo à futura participação no Dakar é voltar a lutar pelo título.

“Desde que comecei com este projeto internacional, com o Dakar e algumas outras provas, que o CPTT acaba por não ser o principal objetivo no projeto desportivo, mas não vamos para nenhuma prova a não ser para vencer. Acabamos sempre por ir com o objetivo de vencer. Foi o que fizemos no ano passado, as coisas acabaram por correr bem no campeonato. Este ano estamos a planear fazer todas as corridas com o objetivo de vencer. Temos a estrutura montada, conhecemos bem as exigências de um campeonato destes e é tentar colher o máximo prazer disto. Fazer com que seja um bom treino para os ralis, ganhar ritmo e arrecadar mais um título seria sempre importante e a Baja Portalegre também. Vou fazer algumas provas na moto de rali e isso vai-me ajudar a ganhar mais à vontade na moto e melhorar algumas coisas”.

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