Pascal Ruch (Lexus Europa): “Queremos transformar o ordinário em extraordinário”

08/11/2018

Preparar um chá pode não parecer uma tarefa difícil, mas Pascal Ruch, presidente da Lexus Europe, tarda em conseguir ter a sua bebida pronta para beber. O culpado por essa dificuldade é mesmo o jornalista, que vai lançando perguntas e, com isso, atrasando a preparação de uma pequena chávena, porque o executivo faz questão de responder olhos nos olhos.

Estamos no Salão de Paris, e a oportunidade para falar com o responsável pelos destinos da marca Premium é de ouro. Ruch conhece praticamente todos os ‘cantos à casa’ do Grupo Toyota, tendo passado por diversos cargos na companhia ao longo dos anos. Atualmente, tem entre mãos o desafio maior: liderar a Lexus no competitivo mercado Premium europeu, no qual o jogo é ainda fortemente dominando pelas marcas alemãs.

No entanto, sendo ainda jovem (a marca nasceu em 1989), está já a caminho de uma meta ‘saudável’ de 100 mil unidades vendidas anualmente no Velho Continente, um objetivo que o presidente da Lexus Europa pretende atingir em 2020.

Para Pascal Ruch, a aceitação cada vez maior da tecnologia híbrida autocarregável (sem necessidade de ligação à tomada) tem sido fundamental para o aumento de notoriedade e de vendas. Mas, embora muitos outros construtores multipliquem esforços na apresentação de carros 100% elétricos, Ruch confia na estratégia híbrida da Lexus para os próximos anos porque, argumenta, o mercado ainda não está preparado para a eletrificação total.

“Só mudaremos quando sentirmos que o mercado está preparado. Neste momento, não está preparado para efetuar compromissos. E porque devemos nós fazer compromissos quando temos uma solução técnica que nos permite conduzir mais de 50% do tempo em modo elétrico sem qualquer compromisso em termos de carregamentos ou autonomia? É por isso que, se olharmos mesmo para os números, e se descontarmos os dois mercados onde há fortes incentivos, vemos que a a mobilidade elétrica não se desenvolveu assim tão depressa. Por isso, para nós a filosofia é muito simples: queremos vender o máximo possível de veículo com baixas emissões de CO2, baixo NOx e isso é mais importante do que ter apenas 1% das vendas com emissões zero e os restantes 99% com altas emissões. Essa é a nossa filosofia e é por isso que na Europa Ocidental estamos a vender quase 97% dos nossos carros com tecnologia híbrida”, afirma.

Defende, ainda, que os híbridos trazem vantagens no preço e acessibilidade, uma vez que “os Plug-in híbridos são caros e os elétricos mais ainda, sendo preciso esperar por melhorias técnicas e por maior habituação dos clientes na utilização dos elétricos para que possamos dizer que o momento certo chegou. Mas, para os próximos anos, estou totalmente convencido que os híbridos ‘self-charging’ que oferecemos na Lexus são a solução mais adequada e pragmática para a maioria dos clientes na Europa”, refere.

Sem comentar a estratégia de outras marcas, reitera que o caminho escolhido pela Lexus na abolição do Diesel da sua gama e aposta nos híbridos foi o acertado e que os resultados ditam isso mesmo. “Para nós, definitivamente, foi a decisão certa ao enveredarmos por esse caminho. Na Europa Ocidental vendemos a maioria de carros com motor híbrido. Não creio que vendêssemos muito mais se tivéssemos Diesel na gama. Penso que mesmo no mercado de frotas, os híbridos são uma alternativa muito forte aos Diesel porque em termos de TCO [NDR: custos operacionais e de posse] e de valor residual, que é um componente chave quando falamos de frotas, estamos numa posição muito forte. Costumo dizer que na Lexus vejo as nossas vendas sendo a primeira alternativa para pessoas que não querem conduzir mais Diesel”, assume.

Tecnologia em ascensão

Por outro lado, o automóvel está cada vez mais digitalizado e conectado, abrindo caminho a novas soluções de mobilidade, vertente para a qual a Lexus (por inerência do Grupo Toyota) está atenta: “É uma tendência fundamental que podemos ver e sentir, pelo menos nas grandes cidades. Enquanto companhia e grupo, criámos a Toyota Connected e agora também a divisão na Europa para o desenvolvimento de soluções avançadas de mobilidade. Creio que estamos em posição muito forte nesse particular”, refere Pascal Ruch.

Um efeito limite dessa nova mobilidade poderá ser o da diluição do valor de marca, tornando-se o automóvel numa mera utilidade. Reconhecendo essa problemática para uma marca de luxo como a Lexus, o executivo responde com duas noções capitais: aquilo que chama ‘experiência Lexus’ e o termo ‘omotenashi’ (que coloca o cliente acima de tudo): “Esse é um elemento que à absolutamente chave e fundamental. A partir do momento em que os nossos veículos se tornem apenas comodidades, porque é esse o imaginário que se tem, mas que reforço não o vejo para perto, como é que definimos a mobilidade? Sim, irá evoluir muito para o bem-estar, mas, uma vez mais, creio que um dos pilares da marca hoje é o que chamamos a experiência Lexus. Temos uma palavra japonesa para isso que é ‘omotenashi’, que é colocamos o cliente no centro de tudo o que fazemos. Por isso, mesmo que amanhã tudo possa parecer um pouco neutral em termos de marca, as pessoas vão precisar de fazer a manutenção do veículo e se não o fizer você, alguém o irá fazer por si. E é isso que talvez possamos fazer para nos diferenciarmos dos demais. Estarmos perto das necessidades dos clientes ou antecipá-las e não ser apenas um meio para as pessoas irem do lado A para o B. Sim, podem ir do lado A para o B, mas vão da nossa forma e podemos tentar integrar funcionalidades que possam ser do seu agrado. É algo a que vamos prestar atenção à medida que nos movemos nessa direção para que não nos afastemos da nossa identidade”.

Também a condução autónoma – na marca prefere-se o termo “automatizada” – representa uma etapa revolucionária no automóvel. “É um assunto muito complexo. Depende do que se entende por autónoma. Ou automatizada, como dizemos no nosso caso. Já temos condução automatizada de nível 2 no novo ES. Quando falamos de condução autónoma, o que as pessoas têm em mente são os níveis 4 ou 5 em que viajam nos bancos de trás a ver os e-mails. Na minha opinião, isso não vai acontecer rapidamente. Penso que o primeiro passo será o aumento de assistentes para tornar a condução mais segura e talvez um pouco mais aprazível. Mas, antes de termos carros a moverem-se sozinhos, penso que há muito a fazer do ponto de vista da legislação”, concretiza.

Chegar a novos públicos

Ruch destaca também a necessidade de atrair clientes mais jovens para a Lexus, o que tem sido feito através da diversificação de estratégias comunicacionais e de marketing. “Quando em 2011 dissemos que queríamos mudar a perceção da marca – foi uma afirmação de Akio Toyoda [presidente do grupo nipónico] –, dissemos que queríamos desenvolver sempre carros melhores, evoluir o design, mas também transformar o ordinário em extraordinário. Precisamos de coisas que vão além do simples desenvolvimento de carros. Se olharmos para os últimos anos temos exemplos como um hoverboard e dois barcos. Agora estamos a explorar caminhos alternativos, como o design e a arte, de que são exemplos a parceria com a Semana de Design de Milão ou o Lexus UX Art Space em Lisboa”, explica, continuando que, “se fizermos sempre a mesma coisa não podemos esperar resultados diferentes. Se quisermos ter acesso a novos clientes e esse é definitivamente o nosso objetivo, com o UX, por exemplo, para chegar a clientes mais jovens ou a mais mulheres, precisamos também de nos comportar de forma diferente. Não apenas na comunicação, mas na forma como agimos enquanto marca, como interagimos com os clientes ou no que pedimos aos nossos concessionários para ativarem a marca… Isto é importante, irmos onde as pessoas estão e para chegarmos aonde as pessoas estão, tem de ser feita uma forma diferente da comunicação”.

Contudo, assegura que a ambição de chegar a mais pessoas (com jovens e mulheres ‘à cabeça’) existirá em paralelo com a aposta “num modelo de negócio sustentável para os nossos parceiros e concessionários sem impor volumes [de vendas] que coloquem em causa a experiência de quem já comprou um Lexus. Não queremos jamais comprometer a experiência do cliente Lexus apenas porque queremos impor volumes. Não é o nosso ponto de vista”.

UX vai “ser o Lexus mais importante na Europa”

Neste sentido, destaca a chegada do novo crossover UX que vai “tornar-se no Lexus mais importante na Europa. Em termos de volume, acima de tudo, mas também de imagem, porque é definitivamente um ‘game changer’ para nós. É a primeira vez que temos uma oferta num segmento em expansão e cada vez mais importante, no qual estão cada vez mais pessoas e jovens. E é aí que queremos estar. Insisto que gostaríamos de ter clientes mais jovens e isso é muito importante para o UX. É um carro de volume, mas também de imagem”.

Com a gama revista ou melhorada, o CT200h é, no entanto, o modelo mais antigo na marca, algo que na Lexus está a ser atentamente analisado com o intuito de se apresentar um sucessor.

“Começámos a aceitar ordens para o UX, que é uma entrada na marca a par do CT. Mas acreditem, que vamos precisar de dois veículos para atrair as pessoas, com o UX e um outro modelo como o CT. Se será um modelo exatamente como o CT é hoje, ainda é cedo para dizer. Mas temos definitivamente a intenção de manter uma gama ampla e de ser apelativa a diferentes categorias de pessoas, mais jovens e mais mulheres. Pelo que precisamos de dois modelos de acesso à marca”.

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