Pascal Ruch (Lexus): “A solução híbrida que propomos é a mais acessível e a mais adaptada à atualidade”

27/03/2018

Novo responsável máximo para liderar os destinos da Lexus na Europa, Pascal Ruch dificilmente poderia iniciar-se no cargo com um panorama mais positivo no horizonte: uma marca em crescendo na Europa, com uma gama híbrida fortíssima que na parte Ocidental do Velho Continente vale cerca de 98% das vendas e um novo modelo que surge muito a tempo de cavalgar a onda de sucesso dos SUV compactos, o UX, revelado no Salão de Genebra.

Profundo conhecedor da filosofia da marca de luxo nipónica, reputada pela sua afincada atenção ao detalhe, Pascal Ruch não esconde o seu otimismo no crescimento sustentado da Lexus, apresentando argumentos de grande relevo como o desenvolvimento da tecnologia híbrida, cada vez mais um tema forte na Europa, e a relação privilegiada com o cliente Lexus, num tratamento distinto que pretende ser diferenciador. Tanto quanto o visual dos modelos nascidos com a letra ‘L’ na dianteira, pautados pela sua grelha ‘fusiforme’ e arestas mais agressivas que não deixam os seus clientes indiferentes.

Estes e muitos outros temas foram debatidos em entrevista do Motor24 ao recém-empossado presidente da Lexus Europa, com Ruch a manifestar, de forma inequívoca, a sua confiança na tecnologia híbrida, algo que tem sido muito defendido pelo Grupo Toyota.

Motor24: A Lexus tem mostrado um grande crescimento ao longo dos anos anteriores ao nível europeu. Agora, a pergunta é: pode-se esperar ainda uma maior expansão para os próximos anos?

Pascal Ruch: Tem razão. Crescemos cerca de 70% nos últimos quatro anos, com 75 mil unidades vendidas no último ano e esperamos atingir os 100 mil veículos vendidos em 2020. Esse é o nosso objetivo a meio-termo, aquilo que esperamos e estamos muito confiantes de que poderemos atingir essa meta. Principalmente, mas não apenas, com o veículo que temos em novidade absoluta, o UX. Porquê? Porque é um carro que lançamos num segmento crescente, dos SUV e crossovers, que é onde onde está a dinâmica deste momento – em crescimento. Será absolutamente fundamental para nós. Além do CT, será outra forma de entrada, outro acesso à marca e tal como esse esperamos ter uma taxa de conquista de novos clientes Lexus entre os 70 e os 80%.

M24: A Lexus também se diferencia das outras marcas concorrentes a começar, desde logo, pelo visual mais impactante. Quão importante é esse valor de diferenciação para a marca?

PR: Aqui, temos de falar do ADN da marca e daquilo que a Lexus representa. A marca significa duas coisas: qualidade e experiência do cliente. Isso tem sido e será sempre o centro da nossa estratégia – ter estes dois elementos juntos. Os clientes podem ficar completamente apaixonados pelo UX, mas apenas ficarão ‘casados’ com a marca se a experiência for boa. Essa é a forma como eu encaro a questão. O UX é, talvez, um veículo que nos poderá levar a atrair mais clientes, mas é o nosso trabalho, em conjunto com os nossos concessionários – digamos parceiros no mercado -, garantir que esses clientes permanecem connosco graças a uma experiência fantástica, a melhor que lhes possamos oferecer. Internamente, falamos de ‘omotenashi’, que é a tentativa de antecipar as necessidades do cliente, fazer o que eles esperam e o que lhes podemos agradar através do melhor serviço possível.

M24: Neste sentido, havendo então o crescimento do mercado de híbridos na Europa, é possível também esperar que a Lexus possa tirar partido desse facto? Esperam que essa mudança de paradigma no mercado possa jogar a favor da marca?

PR: Isso vai no sentido da minha resposta anterior, a um ponto ao qual ainda não tinha chegado. No ADN da Lexus, esses são os dois elementos da fundação, mas depois temos outros quatro alicerces, que chamamos de diferenciadores: um é o design, que tem por base a evolução desde 2012, com a grelha e tudo o mais; outro é a qualidade de execução, que é a forma como construímos e dedicamos grande atenção aos materiais e qualidade geral; outro é a performance, a forma como o carro se comporta e o ultimo é a inovação. E é aqui que o híbrido, enquanto diferenciador-chave entra em jogo. Porque fomos os primeiros com este tipo de tecnologia logo em 2005. Vemos hoje, creio que até mesmo em Portugal, que ainda é um mercado muito orientado para o Diesel, que o mercado começa a mudar com os clientes a começarem agora a considerar outros tipos de motorizações e creio que, com o híbrido, temos uma grande alternativa. Na Europa Ocidental, 98% das nossas vendas são de carros híbridos.

M24: Mas a Lexus também é uma marca muito ligada a um estilo de vida, sendo uma parte importante da companhia e do seu conceito. Que ambições reservam para esta vertente da marca?

PR: É um bom ponto. Reconhecemos uma coisa, talvez em 2010, 2011. Reconhecemos que talvez tivéssemos carros com muita qualidade, que proporcionassem boas experiências, mas que nos faltava um pouco de emoção, que era um pouco aborrecida. E foi isso com que o nosso presidente da época, o senhor Akio Toyoda foi também confrontado numa conferência de imprensa e a partir desse dia a companhia tomou a decisão de que a Lexus nunca mais seria uma marca aborrecida. Seja através dos produtos (e creio que veem a evolução que tivemos em termos de desenho, que começou com o GS, depois com o IS, LS, RX, LC, LS e agora com o UX), seja também pela forma como nos comportamos, como comunicamos, como queremos ser vistos.

Com todas as atividades que temos feito nos últimos três ou quatro anos, temos trabalhado para tornar a marca mais emocional, ligando-a a uma base de clientes-alvo mais jovem, que chamamos de ‘Exploradores Urbanos’ no caso do UX, que é um pouco de jargão de marketing, mas que no final de contas é isso que queremos ser: queremos ligar-nos com as pessoas mais jovens. Têm existido muitas discussões sobre o que será o futuro da indústria automóvel, mas uma coisa é certa. Embora tenhamos de considerar que o comprador típico de um automóvel, de 40 ou mais anos, vá continuar, a questão, enquanto marca, é saber como podemos abordar os jovens e ser atrativos para esses. Esse é o novo desafio para todos nós. Porque os jovens não têm a mesma relação com o carro. Por muitas razões, que podemos ou não discutir, mas é um facto. Mas, se dentro de 20 anos ainda quisermos vender carros, ou outra coisa qualquer, precisamos de ter estes clientes. Como atraí-los, essa é a chave!

M24: Sobre essa mesma mudança de paradigma, como é que está a ser abordada questão da alteração no conceito de propriedade automóvel?

PR: Criámos uma companhia que está a trabalhar para ambas as marcas do grupo, Toyota e Lexus, que se chama Toyota Connect. Criada no Japão, chega agora aos Estados Unidos da América e que teremos também na Europa este ano. O objetivo e intenção dessa entidade é desenvolver ofertas de mobilidade para promover a conectividade integrada entre todos os dispositivos ligados diretamente ao carro e assim ter o máximo possível de ligação entre a vida diária dos clientes e a forma como o carro se integra nela. Esse é o objetivo. Fizemos projetos-piloto pelos quais tive a responsabilidade enquanto estive em França durante cinco anos. Um deles foi o [Projeto] I-Road em Grenoble [NDR: programa de carsharing da Toyota]. É um sistema que aborda a questão dos transportes intermodais: ou seja, se eu vivesse em Cascais ou no Estoril e quisesse ir para Lisboa, poderia ir de comboio ou de elétrico para um determinado ponto e nos últimos dois quilómetros poderia usar um carro elétrico ou um pequeno I-Road, um carro elétrico de três rodas. Usamos diferentes tipos de transportes para chegar ao local que queremos. É essa que creio ser a visão de mobilidade e os serviços que queremos apresentar no futuro dependendo das necessidades que se têm. Se quiserem ir de férias com a família poderão precisar de um RX ou de um RX L e irão fazer 400 ou 50 quilómetros, mas na cidade o que fazem com um RX L?

M24: Quanto aos sistemas de subscrição, esses podem ser importantes?

PR: Sim, creio que sim. Tivemos muitas experiências com o programa Ha:mo [NDR: o Sistema de Transporte Inteligente que a Toyota teve em curso em Grenoble], que foi um método de subscrição, no qual tínhamos de nos registar e que permitia o acesso aos veículos a partir de um mapa no smartphone indicando onde estavam os I-Road nas suas 30 ou 35 estações. As pessoas podiam apanhá-los e deixá-los noutro lado. Custavam 3 euros no primeiro quarto de hora, 2 euros no segundo e um euro no terceiro. Era um sistema muito acessível para um máximo de 45 minutos. Um conceito de mobilidade muito acessível.

M24: Como é que uma marca consegue estar preparada para uma mudança de paradigma profunda numa indústria tão mutável como esta, tanto na mobilidade, como no método de propulsão?

PR: Penso que precisamos de ter uma visão muito clara e saber para onde queremos ir. A Toyota é uma companhia com uma visão muito clara de que em 2050, que parece muito longe mas não é assim tanto, irá conseguir reduzir em 90% as suas emissões de CO2. Se essa for a principal missão, então tudo o que se faz estrategicamente vai nesse sentido. E como é que isso se aplica na Lexus? Bem, vimos o nosso concept LF-1 Limitless e é um veículo que pode utilizar qualquer tipo de motor: desde o híbrido ao Plug-in, passando pelo elétrico ou até a pilha de combustível. Essa é a forma como nos preparamos porque acreditamos que não existirá apenas uma solução adequada para todas as regiões do mundo, do Japão à China, passando pelos EUA, mas somos uma companhia global e temos de servir todos os nossos clientes. É por isso que trabalhamos em diferentes tecnologias para estarmos preparados para qualquer tipo de mudanças.

M24: Ainda assim, estas mudanças parecem estar a ocorrer a uma velocidade cada vez mais rápida. E como será com a condução autónoma?

PR: Estamos a preparar-nos para as diferentes opções. Se olharmos para a Europa hoje, sejamos sinceros, não podemos fazer uma estratégia apenas para um único país. Temos de ter uma abordagem global. É assim que vemos o tema. Comecemos pela questão dos motores. Os veículos elétricos estão a crescer, sim, mas, as infraestruturas… Os postos de carregamento crescem sobretudo nas cidades. Assim que começamos a sair das cidades começa a ficar mais difícil. Primeiro ponto: se começamos a ter dúvidas quanto ao regresso, não é uma solução obviamente.

O segundo ponto é uma questão de comportamento: há umas semanas estive na Noruega, que como sabemos é provavelmente o país mais avançado do mundo em termos de eletrificação, também porque têm uma forma de produção de energia elétrica muito verde, pelo que têm muitos pontos de carregamento. E o que eu vi à hora de almoço foi que as pessoas saem do escritório e vão carregar o seu carro num ponto de carga por uma hora e comem uma sanduíche. Bem, essa é uma grande mudança de comportamento… Sabe? Assim, se o primeiro elemento é a rede de carregamento, o segundo é o comportamento. Depois, se olharmos para o custo destas tecnologias, o terceiro elemento, que é importante, sabemos que os elétricos ou PHEV são mais caros do que os híbridos puros.

Por fim, o valor de custo, em especial para os clientes de frotas, que são muito fortes em híbridos e que continuam a crescer na Europa enquanto o Diesel diminui. O elétrico ainda não é muito claro em termos de fiabilidade, pelo que o seu valor ainda não é muito sólido. Se resumirmos tudo num ápice: nós na Lexus, e também na Toyota, acreditamos que a melhor solução em termos de mobilidade para os próximos três, quatro ou cinco anos serão os híbridos puros, como a solução que propomos agora. É acessível em termos de custo, tem o melhor valor residual, não precisa de uma infraestrutura de carregamento, é super-conveniente e é fácil de usar. A tecnologia vai continuar a evoluir, mas não numa base mensal. Talvez daqui a quatro ou cinco anos possamos ver uma nova geração de baterias que permita não ter de gastar toda a hora de almoço para carregar o veículo e fazê-lo em 20 ou 30 minutos. Ou até menos. Mas é sempre uma questão de custos para o cliente. Quer dizer, é bom conduzir um carro elétrico, mas se tiver de pagar mais 10.000 ou 15.000 euros para tê-lo… Temos de colocar isto tudo num contexto e ambiente que seja sustentável para o cliente. Em suma: sim, os elétricos vão chegar. Sim, estamos a preparar-nos para isso. E sim, vamos ser parte da mudança.

Mas temos de mudar tudo amanhã de manhã? Não acredito que seja assim. Porque a nossa filosofia é: nós queremos vender o máximo de carros possível com baixas emissões. Não estamos interessados em vender 1% com emissões zero e 80 ou 90% com emissões elevadas. Esse não é o nosso objetivo. Queremos ter o máximo possível de carros com as emissões mais baixas possível e é por isso que temos híbridos. E é por isso que 98% dos Lexus que vendemos na Europa Ocidental são de veículos híbridos. Conseguem imaginar, por dois minutos, se toda a indústria, apenas falando no setor Premium, funcionasse com tecnologia híbrida? Não haveria discussão sobre o CO2. Seria ótimo. Graças a esta tecnologia de que o Grupo Toyota dispõe, estamos perfeitamente em linha com o objetivo de atingir a meta de 2021 de 95 g/km de CO2. Creio que as soluções tecnológicas que propomos hoje ao mercado são as mais acessíveis, as mais pragmáticas e as mais adaptadas à atualidade. E a mais eficiente. Em cinco anos, talvez a tecnologia das bateras esteja mais avançada, talvez a infraestrutura tenha evoluído e talvez o hidrogénio cresça, dependendo da infraestrutura. E então, talvez seja a altura certa para partir com volumes mais altos para estas tecnologias. Se o podemos fazer no capítulo técnico? Estamos confiantes de que poderemos fazê-lo. Mas será apropriado neste momento fazer 98% de Plug-in? Não tenho a certeza.

Novo modelo a caminho

M24: A Lexus apresenta agora o UX, que assume um patamar de entrada na gama SUV mas e quanto ao CT 200h. Será esse o próximo modelo a surgir?

PR: Na verdade, haverá um novo modelo antes, que irão ver rapidamente. Haverá um novo modelo que será lançado nalguns mercados da Europa e que será um lançamento importante para 2018. Quanto ao CT, creio que com o UX temos uma nova proposta para o mercado, que é interessante, muito forte. Será que precisamos de outro tipo de conceito no futuro para o CT? Será um sucessor direto ou algo diferente? Penso que sim… Dizer exatamente como, quando, com que formato ou em que segmento ainda é um pouco cedo.

Automesse Genf

M24: É fácil conciliar o lado e a visão ecológica dos híbridos com o lado desportivo proposto pela gama F Sport e também pela participação da Lexus na competição?

PR: É uma boa questão e uma forma de regressar aos pilares de diferenciação que referi: trata-se de emoção, de desenvolver altas performances e é por isso que pensamos que estas versões F Sport podem oferecer essa emoção e fazer a ligação entre o desporto automóvel e os carros que vendemos. Precisamos deste tipo de carros. Faria pouco sentido participar neste tipo de desporto e depois termos apenas carros que são elétricos, híbridos ou Plug-in. É bom termos uma gama em que também se podem comprar este tipo de veículos, mesmo que seja em volume muito baixo. Não creio que seja uma contradição em termos de filosofia, porque, uma vez mais, não se trata de volume, mas sim de imagem e de clientes muito específicos. Juntar este tipo de emoção à marca acrescenta-lhe qualquer coisa.

M24: No caso do LC 500, há uma versão com o motor V8, para os condutores que gostam de algo mais ‘old school’…

PR: Correto. Mas, penso que, no que toca aos motores de combustão interna, é importante distinguir os motores V8 e de alta performance e os que eu chamaria de acesso. Por exemplo, no UX, para ser muito concreto, teremos dois motores, o 200 e o 250h. Nalguns mercados, na Europa Ocidental, o hibrido será 85% das vendas. Mas na Europa de Leste será o inverso. O 200 será responsável por 70 a 80% das vendas. Este posicionamento de motores será ainda muito dinâmico, com o modelo de 180 CV híbrido, mas não será um motor de alta performance, como um V8. Talvez tenha que ver com uma questão de consciência das pessoas: na Europa Ocidental, hoje, as pessoas estão mais preparadas para aceitar este tipo de tecnologia híbrida, enquanto a Europa de Leste tem um atraso de cinco ou dez anos. Talvez, em 2020, ou 2025, também se dirijam mais em direção aos híbridos. Mas, por exemplo, na Rússia, sabemos que hoje ainda são muito fortes nos motores de combustão interna.

M24: isso torna ainda mais difícil para uma marca equilibrar estas duas áreas…

PR: Sim. Temos de ter um portefólio forte, temos de trabalhar em ambos os lados. Temos de ter boas alternativas. Mas, seja como for, com a tecnologia híbrida, pode não existir uma única solução para o futuro. Precisamos de ter diferentes alternativas.

M24: Ainda em termos técnicos, o UX terá uma nova caixa CVT Direct Shift, mas apenas para o motor a gasolina e não no híbrido? Porque é que foi tomada esta decisão?

PR: Mas, também no hibrido, a CVT terá um funcionamento algo diferente, com uma sensação mais aproximada de mudança de velocidades e também, especialmente, ao nível da sensação dos níveis de ruído. Isso é algo em que estamos a trabalhar muito fortemente nesta quarta geração de híbridos.

M24: Por fim, um desafio: o que é que diria a um cliente para o convencer a escolher um Lexus em vez de uma das outras marcas concorrentes tradicionais?

PR: De volta ao nosso ADN. Penso que a Lexus é hoje a marca que tem uma qualidade muto forte, que talvez não seja uma característica muito única, mas combinada com a melhor experiência de cliente é algo que a torna única e é algo que queremos que no futuro faça a diferença. Essa é absolutamente uma das nossas prioridades fundamentais. Tal como os outros, precisamos de bom design, de boa qualidade de construção e tudo o mais. Mas o que faz a diferença é a nossa abordagem na relação com o cliente da Lexus. Também devido ao nosso tamanho e aos volumes que vendemos, devemos oferecer um tratamento especial aos clientes e garanti-lo ao longo do tempo e creio que os nossos competidores, seja qual for a sua nacionalidade, tendo volumes de vendas maiores, poderão não ser capazes de oferecer esse tipo de serviço. Claro, quando se tem uma rede com 30 ou 20 concessionários [por país] é mais fácil controlar, implementar e concretizar essa estratégia do que quando se tem 300 ou 400 pontos de venda. Esse é o elemento chave.

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