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Ao volante do Toyota Mirai: Missão (im)possível a hidrogénio

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Quando a Toyota lançou o seu primeiro híbrido, não faltou quem chamasse de desnecessária e inconsequente a preocupação da marca nipónica na preparação de um futuro de emissões reduzidas. Mais de duas décadas depois de o Prius ter inaugurado uma tendência e com a eletrificação em posição de se tornar dominante na indústria automóvel, a Toyota aprofunda a sua aposta no hidrogénio com a segunda geração do Mirai – será a repetição da história? No primeiro contacto com esta berlina, em Cascais, obtivemos algumas respostas e uma confirmação importante.

A sociedade do hidrogénio é encarada por algumas entidades como uma condição indispensável rumo a um futuro mais verde, no qual as emissões de gases com efeitos de estufa podem ser reduzidas ao mínimo indispensável. Nesse esforço de combate às alterações climáticas, as soluções vão-se multiplicando. No caso da Toyota, o Mirai de segunda geração evolui aquilo que foi aplicado no primeiro modelo, mas progredindo em aspetos essenciais para que se torne numa solução realmente viável.

Se nalguns mercados, o hidrogénio já começa a surgir em massa nos postos de abastecimento (sobretudo no eixo franco-alemão), em Portugal a sua expressão é ainda irrisória: faltam postos de abastecimento de hidrogénio para que a tecnologia se torne utilizável, mas a Toyota acredita que lá se chegará.

Por agora, porém, a questão ainda se resume a um círculo vicioso que a Toyota quer desmontar: para que existam postos de abastecimento de hidrogénio têm de existir carros. Mas para existirem carros, têm de existir postos. Os carros estão aí… para que a marca consiga dar provimento à sua estratégia ‘além de zero’ (‘Beyond Zero’, no original), num termo que não é meramente letra pintada, mas que traduz igualmente um preceito realista já no Mirai, como se verá mais adiante neste texto.

Com o Mirai, a Toyota coloca de novo a sua tecnologia de pilha de combustível a hidrogénio (fuel cell) em foco. Com mais de dez mil unidades vendidas desde que a primeira geração foi lançada, em 2015, a marca de Akio Toyoda tem já um bom capital de experiência com este sistema, aqui mais evoluído, tanto em termos de estética, como de técnica, destacando-se, sobretudo, a grande compactação dos componentes do sistema, fruto de mais de 28 anos de desenvolvimento ‘dentro de portas’. Mas, indo além do Mirai e dessa experiência de dez mil unidades vendidas, a Toyota também tirou dividendos da experiência dos mais de 16 milhões de híbridos vendidos globalmente.

O conjunto de pilha de combustível utiliza polímero sólido, como no atual Mirai, mas foi tornado mais pequeno e com menor número de células (330 em vez de 370), com uma densidade energética recorde de 5.4 kW/l. A performance em condições térmicas mais extremas, como -30º C, também é agora possível.

Assente na nova plataforma global da Toyota (TNGA), mais concretamente na variante GA-L para os modelos com maior distância entre eixos, o novo Mirai explana a filosofia EDGE, que é um acrónimo para Emocional, Distinto, Genial e Desfrutável (‘Enjoyable’, no original). Graças a essa plataforma, o modelo conseguiu incrementar a sua rigidez, mas também oferecer uma postura visual completamente nova, mais largo em 70 mm e mais baixo em 65 mm do que o modelo de primeira geração. A distância entre eixos aumentou em 140 mm para 2920 mm, proporcionando mais espaço por dentro. Assim, tem uma aparência mais agressiva e também desportiva, sem comprometer a versatilidade. O comprimento total acerca-se dos cinco metros (4975 mm).

Isso foi possível graças à colocação de todo o sistema da pilha de combustível sob o capot, permitindo libertar espaço a bordo, sobretudo nos lugares posteriores, que era um dos pontos negativos mais apontado na primeira geração do Mirai (passa também a oferecer cinco lugares e não quatro). O motor está situado na traseira, o que permite uma distribuição de peso na ordem dos 50/50. Além disso, as cavas das rodas tornaram-se mais amplas, o que permite montar jantes de 19 ou de 20 polegadas.

Um dos propósitos da Toyota foi o de melhorar a suavidade de condução e o dinamismo, beneficiando de um incremento na potência em 12% para um total de 134 kW (182 CV em ‘overboost’), com 300 Nm de binário. Graças à boa distribuição de peso e à colocação dos três tanques de hidrogénio sob o piso, o Mirai pretende ser também mais entusiasmante de conduzir, de acordo com os engenheiros da Toyota.

Dois dos tanques de hidrogénio estão sob o habitáculo, com o outro situado atrás dos bancos traseiros, o que lhe permite aumentar a capacidade total de 4,6 kg para 5,6 kg, dando assim maior autonomia (em 30%) na ordem dos 650 quilómetros. Os tanques têm uma construção bastante rigorosa em multicamadas para garantir a sua integridade, mesmo em casos de acidente.

Proveniente do Lexus IS, a bateria de iões de lítio de 1.2 kWh substitui a anterior, de níquel-metal. Apesar de mais compacta no tamanho, oferece maior densidade energética para uma melhoria das prestações. Contém 84 células, uma voltagem de 310.8 e uma capacidade de 6.5 Ah.

A bordo, melhorou-se também a insonorização, algo que foi considerado essencial, enquanto no exterior procurou-se obter uma linha mais aerodinâmica.

Comprovar as credenciais

Sem forma de carregar os Mirai em solo luso, a Toyota executou um ‘pesado’ jogo logístico: os modelos vieram já carregados da Bélgica para Cascais, onde foi dada a possibilidade aos jornalistas de efetuarem um breve contacto, de cerca de 20 quilómetros, com esta berlina. Quatro exemplares, todos em cor azul, serviram para dar a conhecer o Mirai e a sua potencialidade.

Bem sentados ao volante, destaca-se a qualidade aparente dos materiais, de fazer alguma inveja à Lexus… O ecrã da instrumentação tem 8.0 polegadas e é funcional, sendo secundado pelo ecrã tátil central de 12.3 polegadas, com sistema de infoentretenimento renovado e de grafismos mais modernos.

Dando ordem de ignição… não há ruído, tal como sucede num automóvel elétrico a bateria. Porém, há um sistema Active Sound Creator, que formula dois sons consoante o modo de condução escolhido, associando a aceleração à sonoridade, criando dessa forma um elo emocional mais vincado.

Nos parcos quilómetros que pudemos conduzir, algumas impressões mostram que a insonorização foi realmente bem conseguida, enquanto as respostas do sistema motriz são mais suaves e progressivas do que num carro elétrico de idêntica potência. Mesmo em modo ‘Sport’ (há ainda os modos ‘Normal’ e ‘Eco’), o Mirai tem impulso evidente, ganhando velocidade com facilidade, mas sem a explosão de um elétrico, onde a pressão mais forte do acelerador provoca de imediato uma reação intempestiva e – nalguns casos, até desregrada – do eixo motriz. De certa forma, exibe paralelismos com um motor de combustão interna de gama superior na sua performance.

A direção, com boa resposta, permite condução confiante, sobressaindo a relação eficaz entre conforto e estabilidade direcional, mesmo que as oportunidades não tenham sido muitas para avaliar a sua passagem em curva. O que fica patente é a solidez de rolamento, uma vez mais a rivalizar com a de um Lexus, mesmo com jantes de 20 polegadas.

De notar que fica abaixo das duas toneladas, com um peso de 1980 kg, o que para uma autonomia de 650 quilómetros a Toyota estima que um elétrico ‘puro’ acusasse mais 300 kg – efeito da bateria elétrica de grandes dimensões necessária para um valor de autonomia semelhante.

No final do nosso curto teste obtivemos uma média de 0,89 kg/100 km, uma medição diferente considerando os tais 5,6 kg de hidrogénio permitidos nos tanques de alta pressão. Fica assim em linha com a autonomia estimada acima dos 600 quilómetros. O abastecimento, recorde-se, dura entre três a cinco minutos, ficando então pronto para mais 650 quilómetros de viagem.

Abaixo de zero

A Toyota apelida este Mirai como um automóvel com emissões abaixo de zero, ou seja, podendo mesmo limpar o ar que respiramos, numa faculdade que apenas é possível ao incorporar um sistema de pilha de combustível a hidrogénio. Graças a um filtro catalítico que está incorporado na admissão de ar para a pilha de combustível, consegue capturar as partículas nocivas para a saúde (como o óxido de azoto e as partículas 2.5).

O sistema consegue remover entre 90 a 100% das partículas à medida que passa pelo filtro. No painel de instrumentos há até um grafismo que mostra o ar que já limpou através de um desenho de um corredor atrás do Mirai. Imaginativo, no mínimo…


Gama e preços: A missão (im)possível

A Toyota irá propor este Mirai em Portugal com três níveis de equipamento – Limousine, Premium e Luxury, com preços a partir dos 55.168€ sem IVA (67.856€ com IVA), tendo uma palete disponível de seis cores. Porém, a Toyota sabe que terá aqui uma missão impossível que pretende que seja tornada possível de forma rápida a reboque dos fundos europeus para a transição energética.

Se os postos de abastecimento de hidrogénio em Portugal ainda não permitem a vivência com os modelos de pilha de combustível, a aposta política que se prevê que venha a existir no hidrogénio deverá tornar essa circunstância numa situação contornável. Aliás, a própria Salvador Caetano (pela divisão Caetano Bus) irá instalar um posto de hidrogénio em Ovar, conforme adiantou José Ramos, Presidente da companhia, em declarações anteriores à TSF.


Haja água!

Um dos botões que mais curiosidade desperta no interior do Mirai indica H2O, símbolo universal para água. Ou seja, apertando esse botão do lado esquerdo do volante, o sistema de hidrogénio liberta água pelo tubo de escape, a qual pode mesmo ser bebida. Ainda assim, a nossa tentativa de provar o valioso líquido fornecido pelo Mirai não teve sucesso – era preciso andar um pouco mais para produzir água. Fiquemo-nos pela garrafa de água. De vidro, claro, para defesa do ambiente.