Preparando o encerramento de uma era com a transição para os automóveis 100% elétricos, a Alpine desenvolveu aquele que é o seu A110 mais radical para estrada, o A110 R, com o ‘R’ a ser representativo do termo ‘radical’. O grande foco desta unidade esteve na redução de peso, recorrendo imensamente à fibra de carbono para muitos componentes e ajustando o chassis para emoções fortes. Um modelo que chegará a Portugal entre abril e maio com um preço a partir dos 105.000€.

Após a reestruturação recente da gama Alpine, com a separação entre os A110, A110 GT e A110 S, junta-se agora o A110 R, que o mais radical, sendo uma versão numerada mas não limitada. Todos os componentes novos deste Alpine foram desenvolvidos com um propósito funcional, muitos dos quais feitos em carbono, como o capô, o splitter dianteiro, o difusor traseiro e as saias laterais e as jantes (construídas pela especialista Duqueine, que tem como principal tarefa a produção de muitos componentes para a indústria aeronáutica).

Também o tejadilho, a cobertura traseira que substitui o óculo posterior e o spoiler traseiro são concebidos em carbono. A complementar a lista de novidades exteriores está uma nova cor azul mate que é igual à dos monolugares de Fórmula 1, numa alusão direta à cooperação que existe entre os departamentos de automóveis de estrada e de competição. Recorde-se que a Alpine é uma marca com grandes pergaminhos no desporto automóvel, estando atualmente presente ao mais alto nível na Fórmula 1 (na qual foi quarta classificada no Campeonato de Construtores de 2022), Mundial de Endurance (WEC) e ralis.

O A110 R é, por isso, também uma referência a toda essa experiência da competição, propondo um modelo com design elegante, de aparência qualitativamente superior, mas com um foco plenamente funcional. Ou seja, todos os novos componentes aplicados, quer visíveis, quer escondidos, têm como propósito melhorar a experiência de condução, tanto na estrada, como em pista.

Sem olhar a meios

A marca trabalhou, assim, em torno de três pilares: aerodinâmica, chassis e leveza. No caso da aerodinâmica, a silhueta já de si bastante esguia do A110 foi aprimorada com uma série de elementos que melhoram a sua prestação, sobretudo em pista. Um dos exemplos é o aileron traseiro com pilares curvos, naquilo que na gíria se chama de ‘pescoço de cisne’ – a asa está posicionada em plano ligeiramente inclinado e com os suportes curvos.

Esta solução, obtida após imenso trabalho de desenvolvimento e simulação em computador, com a ajuda do departamento de competição, permite ao A110 R obter maior carga aerodinâmica, nomeadamente com o registo de mais 110 kg de carga atrás, enquanto na dianteira, o novo splitter em carbono e o novo capot com uma conduta de ar específica incrementam esse valor em 30 kg.

Ao nível do chassis, abre-se agora um maior espetro de configuração para o cliente ajustar o modelo a seu gosto, com uma suspensão revista e adaptável tanto em dureza como em ressalto (‘rebounding’, em inglês). Face ao A110 S, a altura ao solo foi revista e é agora 10 mm inferior, mas, em pista, o condutor pode reduzir mais 10 mm adicionais, para um total de 20 mm a menos. A marca francesa explica que a grande parte das alterações foi feita com o sentido de tirar máximo partido dos pneus Michelin Pilot Sport Cup 2, os quais são semi-slick, exigindo por isso algum cuidado no seu aquecimento.

Há também novas condutas para a refrigeração do sistema de travagem e barras estabilizadoras mais grossas em 10% à frente e 25% atrás.

Por fim, quando se pensa em redução de peso, o terceiro pilar, percebe-se que a Alpine não poupou esforços para algo que já parecia impossível: reduzir ainda mais o peso face ao A110 S. Aliciada pelo desafio, a marca de Dieppe olhou para o material que mais garantias dá neste capítulo – a fibra de carbono. Amplamente utilizada na competição, é aqui também aplicada em imensos detalhes, muitos dos quais já referidos: ‘splitters’ e saias laterais (com autocolante ‘Do not Walk‘ à semelhança do que se pode encontrar nas asas dos aviões), capot, tejadilho, cobertura traseira, aileron, difusor e jantes.

Este é um dos componentes mais impressionantes do novo A110 R, já que o trabalho minucioso da Duqueine permitiu conceber jantes altamente resistentes e leves, sendo possível levantar uma com apenas um dedo. No total, permitem reduzir 12,5 kg de peso, mas também aqui não se esqueceu o propósito funcional: as jantes traseiras têm um desenho mais fechado, melhorando a aerodinâmica em torno das mesmas (sabe-se que as rodas são dos elementos que mais perturbações oferecem à eficiência aerodinâmica).

Tendo em conta toda a dieta do A110 R, atingiu-se um valor de 1082 kg, menos 34 kg do que o A110 S.

Interior ‘racing’ com bacquets exclusivas

Mas, o mundo da fibra de carbono não acabou ali. Olhando para o interior, há uma grande profusão de revestimentos em Alcantara, disposta no tablier e nas portas para uma sensação de grande qualidade. Com efeito, o A110 R é um desportivo com enorme graciosidade a nível qualitativo, demonstrando muita atenção ao detalhe, com volante também em microfibra com marcador central, botão para alterar os modos de condução (‘Normal’, ‘Sport’ e ‘Track’) e excelente pega.

Porém, são as bacquets Sabelt que merecem os principais elogios, tratando-se de dois bancos com ‘concha’ em carbono e revestimento mínimo para diminuir o peso face aos bancos normais, apenas com ‘almofadas’ nos locais de principal pressão do corpo. Ajudam a reduzir o peso em 5 kg e estão ainda equipadas com um cinto de segurança de seis pontos homologados para estrada (convém as forças da autoridade não se esquecerem disto para as suas usuais ações de fiscalização).

Há ainda painel de instrumentos digital com grafismos diferenciados consoante o modo de condução escolhido e um ecrã central tátil com navegação integrada e um menu dedicado para as funcionalidades desportivas, com telemetria que inclui as forças G e os débitos de binário e potência. Os painéis das portas passam a ter apenas uma fita vermelha para puxar (em vez de uma pega), noutra medida que visou reduzir o peso. Já o sistema de áudio da Focal faz parte do equipamento proposto.

Ponto em que nada foi feito foi no motor 1.8 turbo com 300 CV de potência às 6300 rpm e com 340 Nm de binário entre as 2400 e as 6000 rpm. Desde o início deste projeto que a Alpine decidiu que não valia a pena proceder a modificações neste bloco sobrealimentado e de injeção direta, que está associado a uma caixa de velocidades automática de sete velocidades com patilhas atrás do volante para comando manual/sequencial.

Com uma aceleração dos zero aos 100 km/h em apenas 3,9 segundos e velocidade máxima ‘cravada’ nos 285 km/h, a ideia passou também por não agravar as emissões de CO2, que se ficaram pelos 156 g/km.

O novo Alpine terá um custo de 105.000€ com poucos extras, prevendo-se a sua chegada ao mercado nos meses de abril ou maio.


CONTACTO: Radicalmente bom em pista e na estrada

Conhecidas as alterações técnicas e os conceitos que deram origem ao A110 R, a Alpine proporcionou-nos um primeiro contacto com o seu novo desportivo, com a particularidade de nos dar ‘rédea’ livre no circuito de Jarama (Espanha) e também num percurso de estrada de cerca de 90 minutos que comprovou as competências deste modelo também fora dos circuitos. É radical e é bom.

Com uma filosofia mais extrema, o A110 R volta a elevar a fasquia dentro da sua própria gama, mesmo sem alterar aquilo que, muitas vezes, é considerado fundamental: a potência e o desempenho do motor. Ao invés, a Alpine procurou obter uma maior leveza, seguindo de certa forma os princípios de Jean Rédélé, fundador da marca de Dieppe, de que um automóvel mais leve não só é mais rápido em reta, como mais ágil e veloz em curva. A ideia era, aliás, partilhada por Colin Chapman, fundador da Lotus…

Ato I: Na pista como um peixe na água

Este contacto divide-se, pois, em dois atos. O primeiro, no circuito de Jarama, um traçado clássico perto de Madrid que conta com alguns relevos naturais e muitas partes desafiantes, não faltando uma reta longa à qual se sucede uma travagem violanta para a primeira curva.

Perante o frio madrileno (cerca de 2º C), houve que aquecer primeiro os pneus Michelin Pilot Sport Cup 2, bastante sensíveis a esta questão, de forma a proporcionar as melhores doses de aderência. Não nos coube a nós, mas sim à organização da Alpine, pelo que ao agarrarmos o volante, já os pneus tinham alguma temperatura.

Sentados no A110 R, há que encontrar uma boa posição de condução, ajustando apenas o posicionamento do volante e a distância do banco que, sendo integralmente em carbono, não tem ajuste de costas. Felizmente, é fácil encontrar a melhor posição para se atacar o circuito. Depois, é apertar o cinco de seis pontos e estamos prontos para a pista.

Na primeira volta, atrás do safety car, optámos pelo modo de condução ‘Normal’, mas nas outras três passagens a ‘sério’ optámos pelo modo ‘Track’, o qual coloca a caixa em modo manual/sequencial e acentua as respostas de todo o conjunto, ao mesmo tempo que coloca o controlo de estabilidade num nível mais permissivo (pode-se desligar, porém).

O que se pode dizer é que este Alpine é um dos automóveis mais divertidos e entusiasmantes de conduzir. A aceleração é poderosa, acompanhada de maneira ritmada por um ruído de escape que foi, também ele, melhorado para ser mais audível a bordo, com o característico ‘gorgolejar’ nas reduções de caixa. Se é verdade que o motor 1.8 turbo não tem mais do que 300 CV de potência, também é verdade que a redução de peso ajuda bastante a prestações fora de série.

O comportamento é um primor, sobretudo, pela imensa aderência que proporciona, oferecendo imensa estabilidade em curva, mesmo quando provocado. Jarama não é um circuito de falsas modéstias e exige alguma cautela, mas o comportamento do A110 R não tem qualquer falha. A frente é incisiva e reage com exatidão aos desejos do condutor, enquanto a traseira, ao invés de tentar libertar-se de maneira exaustiva, acompanha a dianteira num movimento de rotação que acaba por tornar as curvas bastante fáceis.

Bem exemplificativo do potencial do A110 R e do sucesso dos engenheiros da Alpine é toda a sequência que compreende a última curva (uma espécie de parabólica que é bem aberta), a reta da meta e a primeira curva: levantando apenas o pé na última curva (suavemente), o chassis não exibe queixumes, possibilitando assim que se chegue ao ponto de travagem para a primeira curva a mais de 220 km/h. Depois, a competência dos travões e a enorme estabilidade fazem com que a entrada e a saída dessa primeira curva, uma direita em jeito de cotovelo, demonstrem a motricidade em aceleração.

No total, as cinco voltas ao circuito apenas pecaram pela escassez…

Ato II: Aprovado para o dia-a-dia

Na segunda parte deste evento internacional, o teste passou para as estradas públicas em redor de Jarama, no qual o principal ponto foi a descoberta de que o A110 R também pode ser usado no quotidiano. Não sem os seus cuidados, porém. O maior de todos é que em lombas ou desníveis na estrada, há que pensar em não danificar o ‘splitter’ dianteiro em carbono, sendo assim imperativo reduzir a velocidade. A suspensão, notoriamente mais firme, permite ainda assim boas doses de conforto para os ocupantes.

Com poucas partes do percurso adequadas para ‘libertar’ o potencial deste A110 R, nas que existiam comprovou-se a enorme aderência, a motricidade quase sobrenatural e a poderosa competência de travagem. Mas, essencialmente, uma imensa sensação de confiança e de diversão que pode colocá-lo facilmente num patamar de discussão de ritmos e de sensações com outros modelos mais dispendiosos e, teoricamente, mais exclusivos.

Em suma…

A Alpine tem aqui uma das primeiras boas surpresas de 2023, com um desportivo mais focado no comportamento desportivo, mas que não esquece a vivência do dia-a-dia. Os 105.000€ podem parecer muito, mas depois de compreender todo o arsenal de tecnologia e de engenharia que foi levado a cabo em prol de maior dinamismo, estamos convictos de que a Alpine criou, sem margem para dúvidas, um automóvel de colecionador para mais tarde recordar como eram os bons desportivos com motor de combustão interna.

FICHA TÉCNICA
Alpine A110 R
Motor: Quatro cilindros em linha, 1798 cc, injeção direta, turbo, intercooler
Potência: 300 CV às 6300 rpm
Binário: 340 Nm entre as 2300 e as 6000 rpm
Transmissão: Traseira, caixa de dupla embraiagem de sete velocidades
Aceleração 0-100 km/h: 3,9 s
V. Máxima: 285 km/h
Consumo médio (WLTP): 6,7 l/100 km
Emissões CO2 (WLTP): 153-156 km
Dimensões: (C/L/A) 4526/1798/1252 mm
Distância entre eixos: 2420 mm
Pneus: 215/40 R18 (D) – 245/40 R18 (T)
Peso: 1082 kg
Bagageira: 100-96 litros
Preço: 105.000€

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