Quando foi apresentado ao público, no Salão de Frankfurt de 2017, o Mercedes-AMG Project One captou para si as atenções mundiais ao tratar-se de um hiperdesportivo com a particularidade de dispor de uma motorização retirada diretamente do monolugar de Fórmula 1. Com o seu sistema híbrido V6 e potência acima dos 1000 CV, o Project One tarda em chegar à estrada e o CEO da marca, Ola Kallenius, já graceja que “a direção devia estar alcoolizada quando aprovou o projeto”.

Com muita pompa e circunstância, o Project One assumiu o papel de destaque no grande edifício de exposição que a Mercedes-Benz ocupava no certame de Frankfurt em 2017, com Lewis Hamilton como ‘padrinho’ do desenvolvimento. Com a marca a dominar o Mundial de Fórmula 1 desde a introdução dos novos regulamentos técnicos para motorizações híbridas V6, a Mercedes-AMG viu no Project One o desafio perfeito e também a ferramenta ideal para consolidar a filosofia de transição de tecnologia do mundo de competição para a estrada.

A ideia não é propriamente nova: transpor um sistema motriz de um carro de competição para um automóvel de estrada produzido em números limitados já foi feito por algumas marcas, como a Ferrari, que tem no F50 um exemplo muito claro desse esforço, com este superdesportivo a montar uma versão retocada do motor V12 utilizado nos monolugares de Fórmula 1 de 1990. Porém, contrariamente a esse, os sistemas motrizes atuais da Fórmula 1 – ou desde 2014 – contam com um vertente eletrificada muito complexa, que exige sobretudo muito trabalho ao nível da refrigeração e da compactação dos diversos componentes, nomeadamente no módulo de bateria.

Esse tem sido apenas um dos muitos desafios com que os engenheiros da Mercedes-AMG se têm deparado, trabalhando arduamente na refrigeração e no acerto do sistema motriz para utilização em estrada, nomeadamente, tratando-se de um motor híbrido que tem de ter um espectro funcional mais amplo do que na Fórmula 1, modalidade em que os monolugares competem a velocidades altíssimas e sempre a regimes de motor elevados. Ao mesmo tempo, o arrefecimento de todo o sistema híbrido confia precisamente no fluxo aerodinâmico a alta velocidade, sabendo-se que em estradas públicas muito dificilmente se atingem os mesmos índices de velocidade.

Outro aspeto relevante é da afinação de potência e da entrega da mesma perante as diferentes condições de utilização: num monolugar, a importância máxima é dada à entrega da potência de forma rápida e em doses maciças, enquanto num modelo de estrada, os baixos regimes e a progressividade nas rotações devem ser também tidas em conta.

De forma paralela, outra preocupação da equipa de desenvolvimento será a da fiabilidade, uma vez que os motores de Fórmula 1, ainda que tenham cada vez mais uma duração estendida na modalidade por imposição regulamentar, são pensados para uma utilização curta em termos de quilometragem, sendo descartados ao longo de uma temporada. Ora, um automóvel de estrada, mesmo no âmbito dos superdesportivos, deve ter assegurada uma longevidade conveniente, pelo que os engenheiros têm também a missão de optar por componentes mais duradouros sem afetar as demais competências mecânicas, como as das caixas de velocidades, também concebidas de forma a serem de duração mais curta. Relacionada com este aspeto, a questão de reparação e manutenção deve ser simplificada para o seu curso de vida.

O dinamismo, com o acerto do chassis e da suspensão, tem também de ser capaz de lidar com o incremento de potência, bem como a aerodinâmica. Por fim, o AMG Project One tem ainda de lidar com a presente questão das emissões poluentes, havendo uma malha cada vez mais apertada na Europa para os automóveis de âmbito poluente.

Todos estes fatores estarão a fazer do Project One um dos modelos de desenvolvimento mais longo no seio da Mercedes-AMG, contando-se já quase cinco anos desde o momento da revelação mundial, algo que não retira o sentido de humor ao CEO da marca alemã.

“As equipas da AMG e da divisão High Performance Powertrain Formula 1 [NDR: a divisão que desenvolve os motores de Fórmula 1] vieram ter connosco há cerca de quatro anos e disseram-nos ‘temos uma grande ideia, vamos por um motor de Fórmula 1 num carro de estrada’”, é citado Ola Källenius, CEO da Mercedes-Benz, no site da Autocar. “Tenho de ir rever os minutos da reunião [em que a decisão foi tomada], mas estou certo de que estávamos bêbedos quanto dissemos que sim”, gracejou.

A produção total dos Project One compreende 275 unidades, as quais estão já todas vendidas, incluindo uma para Portugal, por valores próximos dos três milhões de euros, mas, por enquanto, prosseguem os testes e ainda não existe uma data concreta de lançamento para o hiperdesportivo alemão, esperando-se que seja este ano.

Para contar a sua história de tamanha empreitada está já prometido um documentário a lançar simultaneamente com a versão final do Project One.

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