O momento de adaptar os transportes públicos à mobilidade elétrica já chegou e os seus primeiros frutos serão colocados no terreno dentro de alguns meses. Esta foi uma das noções fundamentais retiradas do segundo dia de conferências do Salão de Veículos Elétricos, Híbridos e Mobilidade Inteligente (VExpo 2017), discutindo-se a integração dos elétricos nos esquemas dos transportes públicos e partilhados.

Havendo uma diversidade cada vez maior de serviços disponíveis para cada cliente, empresas como a Carris ou a Transportes Urbanos de Braga (TUB) estão já a preparar a entrada ao serviço de veículos elétricos, numa forma de se adaptar à transformação dos esquemas de mobilidade.

No caso da Carris, Francisco Aires de Sousa, representante da companhia, fez um ponto de situação, lembrando que “da frota com cerca de 600 autocarros, houve já testes com híbridos e elétricos, tendo o ensaio recente com um veículo elétrico dado indicadores muito positivos”. O próximo passo será a aquisição de 15 autocarros elétricos para a frota, havendo já uma proposta de aquisição.

O objetivo a médio/longo prazo será de ter “mais de metade da frota elétrica em 2030-2035 e totalmente elétrica em 2040”, antevendo assim uma fase de mudança para a área dos transportes públicos.

Igual visão tem a TUB, empresa com idade média dos seus autocarros cifrada nos 17 anos, com Teotónio Andrade dos Santos a recordar que, sendo Braga “a terceira cidade mais poluída do país”, existe uma intenção clara de tornar os transportes mais sustentáveis, havendo programas para o incentivo da utilização da bicicleta e um “concurso aberto para a aquisição de 31 autocarros elétricos, seis já definidos e 25 como opção. Serão autocarros de 12 metros com 80 lugares, com potência de 150 kW e baterias com capacidade de 150 kWh”.

O plano passa pela sua introdução na linha 43, que liga a estação da CP à Universidade do Minho: “É uma linha com potencial, que já opera, mas que pode atravessar todo o campus e chegar a mais pessoas. Vamos melhorar a frequência da linha, num percurso de 12 quilómetros com 28 paragens, 14 para cada sentido”.

EMEL com projetos de mobilidade

Também a EMEL tem em vista uma aposta na mobilidade sustentada e diversificação dos seus serviços. Lembrando que existem “400 mil veículos a entrar na cidade de Lisboa todos os dias, criando dificuldades para uma cidade cuja malha urbana não foi pensada para esta quantidade de tráfego”, Luís Natal Marques, da EMEL, afirma que está a ser preparada a concretização de dois vetores de projetos, um deles em parques de estacionamento e, outro, através da partilha de bicicletas.

O primeiro desses parques de estacionamento será na zona da Ameixoeira, com “um total de 530 lugares para que as pessoas deixem o veículo pessoal fora da cidade, apelando até à existência de meios partilhados”, algo que será uma tendência de futuro.

“Temos tido alguns contactos a este nível e temos essa noção de que será o futuro, os próprios construtores automóveis apostam nisso e pretendem apostar no valor de serviço e não de posse, que tende a ser algo do passado”, complementa. O parque de bicicletas será estabelecido na zona da Parque Expo, com 110 unidades em fase de teste para um sistema de mobilidade distinto.

Da parte da Carris, também a solução de partilha automóvel merece alguma atenção, com Aires de Sousa a recordar que aquele que é “o segundo maior investimento de uma família só é utilizado em 5% e o resto do tempo está parado. O futuro da mobilidade passa por deixar de ter a chave do automóvel, mas sim uma aplicação no telemóvel que nos vai levar de um ponto a outro da cidade quando e como quiser”.

A EMEL destaca, ainda, a capacidade avançada proporcionada pela sua aplicação móvel, que tem já um peso elevado na faturação da empresa de estacionamento. “Temos espalhados pela cidade 2.150 parquímetros e toda a assistência é feita por veículos elétricos. Os parquimetros têm vindo a perder importância para a aplicação, que já dá um contributo de 16% nas receitas da empresa. É uma aplicação que não tem comparação na Europa e no mundo”, garante.

Exemplos de sucesso

Um dos casos de sucesso no que diz respeito a novas soluções de mobilidade é o da Ecooltra, companhia de partilha de scooters elétricas presente atualmente em Lisboa, Madrid, Barcelona e Roma e cujo funcionamento assenta numa plataforma digital para smartphone. Com 170 veículos disponíveis em Lisboa, a recetividade tem sido muito positiva, argumenta Pedro Pinto, com muitas pessoas a apostarem neste sistema de mobilidade que permite levar uma scooter elétrica e deixá-la em qualquer lado.

“Temos um parceiro de excelência, que é o SEIA, em termos de tecnologia, que desenvolveu o projeto em termos informáticos, não só para Lisboa, mas também em Madrid, Barcelona e Roma. No nosso projeto, o motor elétrico encaixa-se na forma de pensar”, explica, ainda que aponte igualmente a existência de uma rede logística.

“As scooters estão espalhadas pela cidade, não as localizamos, nem as recolhemos, pelo que tivemos de criar um sistema de logística, com custos inerentes, para mudar as baterias em 2 ou 3 minutos”, refere, antes de se debruçar sobre um outro ponto que tenderá a melhorar – a questão da potência.

“Em comparação com Lisboa, as outras cidades são todas relativamente mais planas. Temos scooters com potência equivalente a 50 cc e os utilizadores pedem mais potência. O desafio pode ser mais premente aí”.

Pelo mesmo diapasão alinhou Nuno Pinto, da Truemorrow, empresa dedicada à criação de soluções de sustentabilidade, traçando dois pontos essenciais para a implementação do car-sharing: “a qualidade de serviço, com uma tentativa de 5 minutos até chegar ao carro, uma vez que a disponibilidade é fundamental para este tpo de projetos e a boa experiência do utilizador. O principal objetivo operacional é gerir a logística de carregamento, para que tenham a carga necessária no local em que são mais necessários. É uma logística operacional que é fundamental pensar para que a qualidade do serviço seja assegurada”.

Desafios e vantagens da tecnologia

A premissa da tecnologia tem vindo a ganhar cada vez mais peso, tanto ao nível dos elétricos, como da conectividade. Neste aspeto, Andrade dos Santos, da TUB, aponta que existem alguns constrangimentos na implementação dos elétricos, como por exemplo o custo dos autocarros e das baterias, bem como a sua própria capacidade, que ainda é insuficiente para um dia inteiro de operação. Mas os benefícios equilibram a balança.

“A forma de os carregar é um desafio, bem como a formação e o treino dos condutores, que é igualmente um mundo novo. Também a forma da manutenção será diferente, deixaremos de ter mecânicos de fato de macaco, mas de bata branca. Estamos bem alicerçados – uma parte da nossa equipa esteve no desenvlvimento do Metro do Porto pelo que estamos bem capacitados. Quando vimos a idade média da nossa frota, falámos com todos os construtores e quando escolhemos que íamos optar pela tração elétrica, estreitámos relações com alguns como a Siemens, Caetano Bus ou a Build Your Dreams (BYD). Com isto, vamos reduzir os custos operacionais. Já serão autocarros conectados, numa área em que estamos a trabalhar com a Bosch de Braga e está já pensada uma solução para a condução autónoma. Trabalhamos também com a IBM para a telemetria”, indicou o responsável da TUB.