A menos de vinte minutos de bicicleta – o meio de transporte preferido dos holandeses – da cidade de Haia, existe um depósito de material militar. Ali, numa sucessão de pequenos pavilhões, encontramos veículos de toda a espécie, desde carros de combate da Segunda Guerra Mundial a veículos de fabrico holandês. Mas o que nos chama mais atenção é um jipe com uma camuflagem curiosa. Aquela frente compacta e de linhas direitas não engana: este é um jipe de fabrico português, o Alter desenhado por Carlos Galamba, o pai do projecto do saudoso Sado 550. De facto, além dos portugueses, os militares holandeses usaram os famosos jipes da UMM.

Mas como veio este Alter alongado aqui parar? E o que fazem ali outros dois Entrepreneur militares? Alguns dias depois, uma convera de várias horas na casa do investigador Wim den Dunnen, dono de um arquivo que enche todo um escritório, revela novas pistas e documentos. Logo de seguida, os arquivos militares de Haia revelam outros tantos segredos. De facto, a UMM beneficiou das contrapartidas de uma grande aquisição militar para colocar, no exército holandês, um primeiro lote de jipes Entrepreneur.

Mais tarde, no final dos anos de 1980, chegou a disponibilizar quatro jipes Alter – dois curtos e dois longos – para testes e provas no grande concurso de fornecimento de quatro mil veículos tácticos ligeiros ao exército holandês. Como explica den Dunnen, o modelo português concorreu aqui com os gigantes europeus da Land Rover e Mercedes-Benz.

O jipe, um verdadeiro David, não venceu aqui Golias, mas ficou clara a qualidade e engenho da indústria automóvel nacional. Tanto que um grande número de jipes Alter chegou a ser montado sob licença pela francesa Heuliez e fornecido aos militares da Gendarmerie. No mercado civil, os números chegaram a ser irreais: dos cinco mil jipes produzidos pela UMM em 1988, metade foram exportados.

Nas provas de todo-o-terreno no país, os primeiros lugares cabem quase sempre aos modelos da marca portuguesa e esta atinge o pico mediático quando, em Junho de 1988, chegam a Lisboa os três jipes Alter da grande aventura do raide terrestre entre Macau e Lisboa. Uma aventura digna de um Fernão Mendes Pinto que liga simbolicamente o último ponto do império na Ásia à sua capital. Ao longo de 18 mil quilómetros e 46 dias, a equipa portuguesa passa pelo Paquistão, Irão, Turquia, Bulgária, Jugoslávia, Itália, França, Espanha e outros tantos países. A partir de 1996, estes verdadeiros reis do todo-o-terreno tornam-se no cavalo de batalha do Exército português nas grandes missões de paz da Bósnia e Timor-Leste – conquistando assim finalmente um lugar de direito entre os grandes veículos militares nacionais.

Por Pedro Manuel Monteiro

*Extracto do livro “Berliet, Chaimite e UMM – Os Grandes Veículos Militares Nacionais”, de Pedro Manuel Monteiro, uma edição Contra a Corrente, Abril 2018. Contributos e reserva de exemplares em: https://ppl.com.pt/prj/berliet-chaimite-umm

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