O transporte público gratuito em Cascais teve um acréscimo de 15% de passageiros mas a autarquia quer mais adesão e vai continuar a aumentar os preços de estacionamento público para afastar os carros. Em Lisboa tal medida será avaliada para o futuro. No presente, será feita uma “auditoria de segurança às ciclovias”

O exemplo do Luxemburgo, único na Europa e no mundo, da gratuitidade do transporte público para todos os seus residentes, só é seguido em Portugal na microescala de um município: Cascais. François Bausch, o ministro da Mobilidade e das Obras Públicas do Luxemburgo, falou por vídeoconferência da experiência no debate do Portugal Mobi Summit sobre o transporte público gratuito. O Grão-Ducado é visto como “modelo” apesar de ser um dos países com mais condutores na Europa.

Para garantir o sucesso de tal iniciativa e demover as pessoas de usarem o carro é preciso ter a coragem de tomar “medidas impopulares”, decisões duras “à escala metropolitana” defendeu o vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais, Miguel Pinto-Luz, autarquia que adotou a gratuitidade do transporte público para residentes há dois anos. “Vamos ter de fechar os centros das cidades aos carros, taxar mais o transporte individual, e terão de ser decisões à escala metropolitana, temos de ter uma lógica mais regional”.

Em Cascais as medidas duras e que arriscam ser castigadas nas urnas têm vindo a ser tomadas, assegurou. “O preço do parqueamento em Cascais tem vindo a subir”, lembrou Pinto Luz, referindo que ainda não está satisfeito com os índices de adesão ao transporte público gratuito para residentes. Em dois anos houve um acréscimo de 10% de passageiros e os números subiram agora para 14 a 15%. “Queremos sempre mais, são números que refletem dois anos de pandemia. Temos de avaliar anos normais como 2022/2023, e com 14 a 15% como estamos hoje em dia vamos conseguir alargar mais”.

O financiamento é garantido à custa dos utilizadores do automóvel. “Conseguimos receitas com o Imposto Único de Circulação (IUC) e com o estacionamento público pago e até temos algum superavit”, adiantou o vice-presidente da Câmara de Cascais.

Mais segurança nas ciclovias

Já o vereador da Mobilidade da Câmara de Lisboa, Ângelo Pereira, admitiu que a capital ainda está “a avaliar para o futuro” a medida da gratuitidade dos transportes públicos. Para já, qualificou de positiva a adesão de cinco mil jovens e estudantes até aos 23 anos residentes em Lisboa ao passe gratuito bem como mais de 20 mil idosos.

Quanto às ciclovias, a Câmara de Lisboa vai tomar medidas: “Vamos anunciar uma auditoria de segurança. Foram feitos vários quilómetros de ciclovias na cidade de Lisboa e descurou-se a questão da segurança. E temos de fazer um planeamento que tenha em conta a segurança rodoviária”.

E anunciou que a primeira medida que o executivo presidido pelo social-democrata Carlos Moedas vai tomar em janeiro de 2023, para dissuadir as pessoas do uso do carro particular, é “retomar os sentidos que a Avenida da Liberdade tinha antes e assim iremos reduzir os niveis de poluição”. Ângelo Pereira assegurou que as bicicletas GIRA da EMEL irão ser integradas no passe Navegante- uma promessa de Carlos Moedas – mas não indicou uma data.

Lembrou ainda as várias razões que os lisboetas têm para passarem para o transporte público, “que vai melhorar em frequência, regularidade, renovação da frota sustentável, elétrica, da frota a gás”.

José Mendes, ex-secretário de Estado da Mobilidade e presidente da Fundação Mestre Casais, apontou motivos para discordar da política universal do transporte público gratuito. “Conheço o trabalho a ser feito em Lisboa e em Cascais e identifico nestes dois municipios situações onde se justifica a gratuitidade. Discordo da generalização porque há o risco introduzir uma quebra de racionalidade na utilização do recurso. Gratuitidade sim mas apenas em algumas situações”. No caso de Lisboa o passe gratuito para os jovens tem efeito pedagógico, defendeu. “Apostar num segmento especifico da população, como os mais jovens, é bom porque assim habituam-se a andar de autocarro”.

François Bausch, ministro da Mobilidade e das Obras Públicas do Luxemburgo, defendeu precisamente o contrário e usou a metáfora da restauração para explicar o seu ponto. “Para mim fazer transportes grátis é só a cereja em cima do bolo. O Luxemburgo é uma nação de condutores e logo, como tinham uma alternativa, eu tinha de oferecer um restaurante melhor. O prato grátis, neste caso, o transporte público, tem de ser delicioso”.

Na “economia muito dinâmica do Luxemburgo, com muitos portugueses que aqui trabalham nem os mais conservadores podem imaginar ter um crescimento de 40% do tráfego automóvel”, a acompanhar o ritmo do crescimento económico, defendeu.

Sem negar que “o modo mais eficiente de transporte é uma combinação de caminhar e bicicleta”, o ministro luxemburguês garante que o Grão-Ducado não se vai desviar do caminho do transporte grátis. O tal “prato delicioso” que vai criar hábitos de frequência. “A Alemanha introduziu neste verão o preço de 9 euros de bilhete para viajar para todo o país e agora a medida acabou e o país está frustado e pensa no que fazer a seguir”.

O transporte público tem de ser feito para os que têm menos rendimentos mas quando se tornou grátis no Luxemburgo já era subsidiado em 90%. “O impacto da medida tem sido na positiva perceção do transporte público”.

Rute Coelho