A cidade milenar com 12 milhões de habitantes e o templo têm em comum o facto de partilharem a localização geográfica na provincia de Henan, na região central da China. E tal como são exigidos um total compromisso, tenacidade e resiliência aos monges que escolhem ser lutadores, também os veículos produzidos pela Yutong são sujeitos à mesma exigência desde a sua fundação em 1963, até à atualidade.
A visita à fábrica da Yutong por jornalistas de vinte países europeus contou com a presença em exclusivo para Portugal do Motor24. Começou pelo museu da marca, que é o primeiro no mundo dedicado à história do transporte público, e onde é possível ver, desde as carruagens que começaram a fazer esse serviço em Paris no séc. XVII, passando pelas soluções implementadas em Londres e Nova Iorque já no séc. XIX, até à atualidade. Ainda no museu existe um sofisticado cinema 4D com 28 lugares onde se pode ver que no futuro, a Yutong pretende estar presente onde quer que a Humanidade esteja, e é-nos mostrado como poderá funcionar um sistema de transporte público em Marte.
As quatro fábricas localizadas na cidade de Zhengzhou empregam normalmente 4 mil trabalhadores. Podem chegar aos 8 mil quando é preciso aumentar a produção que tem uma capacidade máxima anual de 30 mil unidades. Para lá do território chinês, onde a marca detém 36,1% do mercado, a Yutong está presente nos continentes asiático, europeu, africano e sul-americano, com este mercado global a representar mais de 10 % das suas vendas.
Embora a empresa produza também outro tipo de veículos especiais – como camiões para utilização nas minas e para o serviço de limpeza urbana –, o foco da visita às instalações foram os autocarros, e em particular, os que são movidos a novas energias: Híbridos, hidrogénio e elétricos. As mais de 3 mil patentes registadas demonstram a aposta que é feita no importante departamento de “R&D” (investigação e desenvolvimento), que emprega cerca de três mil pessoas e onde anualmente são reinvestidos 5% dos lucros da empresa. Os motores elétricos, que são produzidos por uma empresa que pertence à Yutong, são montados diretamente no eixo dos autocarros. Um exemplo prático patenteado pela marca, que reduz o espaço ocupado e o peso em 30%, baixa o consumo de energia em 15% e aumenta até 93% a eficiência do veículo.a Yutong criou o primeiro carregador megawatt do mercado, carrega uma bateria com 600 kW dos 12% aos 90% em menos de 2 horas
A Yutong implementou um sistema de segurança pioneiro na indústria com recurso ao hidrogénio para proteção das baterias contra incêndios nos autocarros elétricos. São capazes de suportar temperaturas até 1300 °C durante duas horas sem incendiar ou 1 hora se forem perfuradas sem explodir. Para além disso criou ainda o primeiro carregador duplo CCS megawatt do mercado, capaz de carregar uma bateria com 600 kW dos 12% aos 90% em menos de 2 horas. Os seus autocarros podem ser equipados com dois packs de 600 kW totalizando 1,2 megawatt de energia disponível. A Yutong dá uma garantia de 15 anos ou 1,5 milhão de quilómetros nas baterias.
Das três linhas de montagem – que empregam tecnologia de ponta para a indústria e os responsáveis da Yutong não receiam referir que alguma é de origem alemã –, sai um autocarro a cada 45 minutos e durante as 7,4 horas de trabalho são produzidos 32 veículos, que podem ter entre 12 e 18 metros de comprimento.
Após a saída da linha de montagem, os autocarros são submetidos aos mais exigentes testes de qualidade: A empresa tem até uma pista com uma curva parabólica para testes de alta velocidade. Desde temperaturas negativas, ao calor extremo, são simuladas as condições que irão encontrar nos locais onde vão funcionar. Mas não sem antes passarem pela maior câmara anecoica da indústria para medição do nível de ruido que cada veículo produz em funcionamento. No caso dos 100% elétricos têm ainda de passar num local onde a água inunda o piso dos autocarros para verificar a estanquidade das baterias e do motor elétrico.
no distrito financeiro de Zhengzhou circulam autocarros autónomos há 4 anos
Os autocarros da Yutong estão equipados com as mais recentes tecnologias de segurança e ajuda à condução (ADAS), e naturalmente, a empresa também quer estar na linha da frente no que toca à condução autónoma. Em oito cidades na China, os autocarros autónomos já são uma realidade. Por causa da legislação, ainda é obrigatório estar presente um condutor, que poderá intervir se necessário, mas o veículo faz tudo sozinho, até dirigir-se à estação de carregamento para repor a carga na bateria. Quinze minutos são suficientes para 100 quilómetros de autonomia. Experimentámos um dos 12 autocarros autónomos que circulam todos os dias no distrito financeiro da cidade de Zhengzhou entre 9h e as 6h da tarde. O percurso com 19 quilómetros de extensão tem 35 estações e é cobrado 1 yuan (0,13 euros) por pessoa, exceto a maiores de 60 anos. Funciona há 4 anos com mais de 120 mil quilómetros percorridos.
empresa de transporte de passageiros Auto-Viação Feirense é a primeira em Portugal com autocarros Yutong na sua frota
Como é o caso de Gabriel Couto, CEO da empresa portuguesa de transporte de passageiros Auto-Viação Feirense, que é cliente da Yutong e o Motor24 teve a oportunidade de entrevistar.
Motor24: Quais são as diferenças entre entre os fornecedores chineses e os europeus?
Gabriel Couto: Em termos operacionais é uma lufada de ar fresco na qualidade dos autocarros. Não avariam. E em termos comportamentais, posso dizer que esteve cá uma pessoa da Yutong, e eu fiquei surpreendido quando me disse que tinham um determinado valor para nos indemnizar, porque despacharam os autocarros para o porto de Setúbal, em vez de Leixões. Estamos habituados a ir levantar autocarros de outros fornecedores a San Sebastian, em Espanha. Portanto, ir a Setúbal não é nenhum drama. Um dos navios, teve um problema e ficou retido na Coreia. Atrasou-se mais de um mês. Quando as outras marcas se atrasam nós reclamamos, eles dizem que está a chegar e ficamos nisto. Não nos pagam o atraso. Por exemplo, quando temos de intervir num autocarro, algumas marcas dão-nos as peças e nós mudamos ao abrigo da garantia. Não pagamos as peças, mas a mão de obra fica por nossa conta. Compensa-nos porque não perdemos tempo, e não temos de enviar o autocarro. Mas a Yutong, além de nos dar as peças na garantia, paga-nos o serviço à hora. É um modo de funcionamento diferente, ao qual nós não estávamos habituados.
Motor24: Quantos autocarros eléctricos tem na empresa?
Motor24: Qual é a diferença na manutenção dos autocarros elétricos?
Gabriel Couto: Basicamente não temos avarias nos elétricos. Só é preciso mudar travões e pneus. Temos permanentemente um técnico da Yutong nas nossas instalações, que vai fazendo aquilo que é necessário e também nos vai dando instruções. Portanto, tudo o que for relacionado com a componente electrificada, é com ele. Também temos quarenta autocarros a gás e ainda 3 a Diesel. Destes, cerca de 5% costumam avariar.
Motor24: E na vossa operação de longo curso Flixbus, têm algum autocarro elétrico?
Gabriel Couto: Sim, já há um autocarro 100% eléctrico com autonomia suficiente para fazer o percurso entre Lisboa e Porto sem paragens. Mas não lhe posso adiantar mais nada de momento pois o anúncio dessa novidade será a própria Flixbus a fazê-lo.
Gabriel Couto: Não. Os nossos motoristas estão aptos para conduzir qualquer um dos nossos veículos.
Motor24: A vossa operação é apenas nacional?
Gabriel Couto: Não, é internacional. Temos linhas internacionais e temos turismo internacional. Mas, de facto, temos muito mais doméstico do que do que internacional. Antes da pandemia, 60% era internacional. Agora, eu diria que o Internacional é residual. Há de ser 10% e funciona sobretudo com a Flixbus.
Motor24: Qual é a diferença de preço entre um autocarro elétrico e os outros?
Gabriel Couto: No elétrico o preço inicial é muito elevado (cerca de 400 mil euros), a manutenção é mais baixa e a energia mais barata – um autocarro a Diesel custa metade do preço, mas a hidrogénio é o dobro. Depois a maior diferença é que se o autocarro for comprado para fazer serviço urbano é co-financiado, ou seja, recebemos dinheiro a fundo perdido para financiar a diferença entre o diesel e o elétrico. Mas o financiamento é só para operações de serviço público e para carreiras. Não contempla os chamados expressos, o que é uma grande injustiça pois nós fazemos 15 milhões de quilómetros na Carris Metropolitana na cidade do Porto, e 25 milhões de quilómetros na Flixbus, onde não temos qualquer tipo de apoio. Bastaria, por exemplo, existir isenção de portagens nos autocarros elétricos nesse serviço para a sua compra ser economicamente mais interessante.
Motor24: O que tiveram de fazer para acolher os autocarros elétricos na vossa frota?
Gabriel Couto: Foi apenas criar a infraestrutura de carregamento. Esse, passo também foi financiado pela União Europeia.