BMW 2002, o santuário secreto

28/05/2019

Desde há muito que a paixão pelos automóveis em geral me corre nas veias, mas houve um automóvel que mudou por completo a minha vida, um BMW 2002 de 1969. No caso, um automóvel pertencente a um familiar, que estava abandonado e esquecido no tempo, até que um dia captou a minha atenção e fez com que me apaixonasse pela marca e modelo.

Era um automóvel cheio de problemas, defeitos, más reparações que fizeram com que fosse quase impossível conduzi-lo, fazia ruídos, o motor tinha fugas e trabalhava de modo muito irregular. Mas havia qualquer coisa que me fazia apaixonar a cada dia que passava lá sentado a admirar tamanha obra de arte. Era como se falasse comigo, como se me dissesse “vem, roda a chave e vamos”. E assim fui!

Ser proprietário de um BMW clássico

Como passei a saber, e ao contrário do que muitas pessoas possam pensar, ser proprietário de um BMW clássico, não é apenas pavonear-se ao domingo de manhã nas ruas mais movimentadas a fim de provocar inveja naqueles que conduzem um daqueles pedaços de plástico com rodas, muito confortáveis, com sistemas de som com nomes finos “BOSE” e com aquela sensação de andar nas nuvens mas que se fundem numa paisagem monótona de cores e formas idênticas.

Não, conduzir um BMW clássico, é viver constantemente com uma sensação de amor/ódio, é saber que se pode chegar ao automóvel e ele estar de mau humor e não querer pegar, de ir na estrada a espera do próximo “barulhinho” ensurdecedor de um rolamento qualquer, de ouvir apenas uma estação de rádio em apenas uma coluna blaupunkt com 50 anos abafada pelo som do motor. Mas uma das coisas que aprendi ao conduzir um 2002 é que tudo isso é esquecido quando se acelera encosta acima e nos apercebemos de que tudo o que ele queria era isto, dar uma volta comigo e acelerar sem destino, sem sons de rádio, apenas o barulho do carburador Solex a aspirar o ar rarefeito da montanha e depois chegar à garagem e olhar para ele ainda a transpirar de alegria e como que a agradecer pela oportunidade de mostrar o que vale, que ainda consegue pôr um sorriso na minha cara e saber que ficaremos ansiosos pela próxima aventura juntos.

O Santuário Secreto

Quando iniciei contactos a fim de encontrar proprietários de veículos idênticos ao meu, nunca imaginei o que iria encontrar. Além de uma grande amizade, proporcionada pelo comum amor pelos BMW antigos, encontrei um autêntico santuário, um refúgio onde os BMW clássicos são como uma espécie protegida e em que tudo é feito de modo a preservar esta espécie em risco de extinção. Este santuário é o lar de quatro (dos melhores) exemplares deste modelo (02) restaurados até ao último parafuso mas mantendo sempre a sua identidade pois como dizemos muito, cada um tem a sua personalidade e temperamento.

Todavia este santuário não vive só para o modelo em questão, neste momento, estão no “forno” mais alguns projectos da marca bávara. Em fase de restauro encontra-se um BMW 518i e12 de volante à direita que foi encontrado na garagem de um emigrante português em África do Sul, foi resgatado da sua “sepultura” e neste momento recebe o carinho que merece e que muitos negam e dizem “pena ser de volante à direita”. Mas ali não há descriminação, apenas amor pela marca.

Em fila de espera encontra-se um BMW 700 de 1959, exemplar muito raro na ilha da Madeira e que espera por melhores dias, mas a esperança é a última a morrer, afinal de contas ele encontra-se num lugar tão fantástico que é capaz de fazer qualquer amante da marca salivar e ficar incrédulo ao visitar tal chão abençoado numa garagem qualquer.

O Guru

Como qualquer museu tem o seu curador e qualquer santuário tem o seu guru, também este tem o seu mestre de operações. Mais conhecido como o “guru dos motores M10”, (M-10 é a designação atribuída ao motor do BMW 2002 e os seus irmãos) este homem é uma autêntica enciclopédia ambulante. Aqui, todos os proprietários de BMW clássicos o conhecem e o procuram na sede de conhecimentos e ajuda nas mais variadas áreas e fases de restauro dos seus veículos. Para mim, esta garagem é um local de culto onde o meu BMW se sente bem, rodeado pelos seus irmãos e onde conseguimos atingir o tão esperado Nirvana. Um bem-haja ao “Mestre”, que continue nesta missão de resgate por muito tempo!

Frederico Cró / Jornal dos Clássicos