Citroën Karin, uma pirâmide sobre quatro rodas

17/07/2019

Uma pirâmide muito invulgar, o Citroën Karin foi um concept car no mínimo interessante. O seu design é futurista, aerodinâmico, e, segundo alguns, extravagante ou até estranho. Todas estas categorias se enquadram perfeitamente no espírito Citroën da década de 80, e representam uma constante antecipação do futuro por parte da marca. A inovação sempre fez parte do ADN Citroën, e, posto isto, havia melhor oportunidade para mostrar ao mundo a audácia de fazer o próprio futuro, que o Salão Automóvel de Paris? É nesta exposição magna, que de dois em dois anos, as maiores fabricantes de automóveis lutam pela atenção dos participantes, com os seus protótipos, automóveis de produção, competição, etc.

Chegado o ano de 1980, e a Citroën sem um modelo de produção para apresentar ao publico, decidiu marcar mais uma vez pela diferença, e confiou ao seu responsável de design, Trevor Fiore, o desafio de criar. Destaco o ênfase ao termo criar, porque, como disse anteriormente, a audácia desta marca, patente desde a sua génese, foi de criar. Mais do que inventar, criar é rasgar com o presente, é mudar paradigmas. Antes de entrarmos filosofia adentro, permitam me dizer que o processo de criar não é novo à espécie humana. É com um olho no futuro que todos os dias damos passos no presente. E são pequenos passos como uma linha mais arrojada, um habitáculo mais ergonómico, um conceito diferente de automóvel por exemplo que fazem, no mínimo, questionar o presente. Este, e outros concept cars ao longo das décadas, pavimentaram os degraus do sucesso, e trouxeram-nos ideias e proposições nunca antes vistas.

Deste modo, estas máquinas devem ser interpretadas de uma maneira tão única quanto a sua singela existência. As opiniões serão sempre divergentes, mas a ideia de um futuro inalcançável permanece. Olhando para o Citroën Karin, não vejo um automóvel com praticamente quarenta anos, mas sim uma visão. Isto porque estes automóveis são feitos precisamente com esse objectivo. O veículo que este concept pretendia exaltar, era precisamente o da praticabilidade. Entre outras características, ele era de tamanho familiar, com um toque de coupé, com duas portas tipo borboleta e três lugares numa configuração única à data. Com os passageiros a ocupar dois lugares, respectivamente à direita e a esquerda do condutor, a posição que este ocupava no automóvel era central. Cerca de uma década mais tarde, esta configuração seria adoptada pela McLaren no seu modelo F1.

O design era estranho, embora houvesse outros modelos com predomínio de linhas rectas. A Aston Martin tinha inclusive um sedan de luxo, o Lagonda, com um conceito semelhante. Outros como o Lancia Stratos Zero, Lotus Esprit e o Maserati Boomerang também exaltavam as linhas rectas e os longos painéis.

Com uma forma piramidal para uns ou trapezoidal para outros, o Karin permitia uma visão privilegiada, com um campo de visão alargado. O tecto correspondia a um painel com as dimensões de uma folha A3, e os imensos faróis na frente traziam uma semelhança evidente ao SM. Pequenos pormenores como as rodas “escondidas” na retaguarda, bem como o facto de estas terem uma distância menor entre elas, tornavam a este automóvel algo familiar aos modelos de produção, como por exemplo o DS. Também recorria à suspensão hidropneumática já bastante conhecida e com provas dadas.

O interior era marcado por uma tonalidade agradável e acolhedora. A ergonomia era fora do comum, com todos os controlos e painéis informativos “à mão” do condutor, e bastante espaço para os ocupantes. Deste modo, o Karin elevou o próprio conceito de espaço. Outras marcas utilizaram nos seus modelos noções por este automóvel exploradas. Um dos exemplos mais bem sucedidos foi precisamente a Renault Espace, que se mantém em produção após cinco gerações (desde 1984), cujo maior argumento são precisamente os interiores.

Prova do compromisso da Citroën em fazer do futuro presente, o Karin não deslumbra particularmente pela sua estética, nem impressiona pelo seu motor de quatro cilindros. No entanto, atinge o objectivo de prender o olhar de qualquer um. E isso é o ponto de partida para que a magia do pensamento nos projecte para o universo das infindas possibilidades que o futuro pode trazer. Passados quarenta anos do Karin, tenho a sensação de que o futuro ainda não chegou, mas chegará…

O conceito de uma pirâmide com rodas vai mais além do que um simples amontoado de linhas. A visão de um automóvel como um meio de transporte para três pessoas, ligeiro, económico e espaçoso agrada no papel. O primeiro paço, e o mais difícil está feito, que é construir. Estamos estagnados há décadas na fase mais longa, que é a mudança de paradigmas. Quantos de vós circulam com mais de três pessoas diariamente? Quantos de vós gostavam de um automóvel fácil de estacionar? Quantos de vos gostavam de viver no futuro? Pois bem, fica a ideia de um conceito que ainda permanece por explorar a grande escala.

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