Os projectos mais interessantes no mundo dos automóveis são, usualmente, resultado da visão única de uma personalidade com a ambição e meios para embarcar na aventura de transformar uma ideia complexa em realidade. Gordon Kelly foi um desses visionários.
No início da década de 60, Kelly trabalhava como designer ao serviço de Brooks Stevens, um verdadeiro gigante do design industrial nos Estados Unidos ao longo dos anos 50 e 60, responsável por criações tão icónicas como o Jeep Wagoneer, as carruagens Skytop Lounge construídas pela Pullman e a Harley Davidson Hydra-Glide. A fama do patrão de Kelly colocava-o numa situação delicada; o designer nutria há vários anos a intenção de criar o seu próprio Corvette como expressão pessoal de um ideal estético, objectivo que poderia ser mal interpretado pelo influente Stevens como um esforço por parte de Gordon para se afirmar publicamente e, talvez mesmo transformar-se em concorrência para a própria firma que então o empregava. Felizmente tal não foi o caso e Stevens acabaria aliás por beneficiar dos contactos que Kelly viria a estabelecer na Itália para ajudar no desenvolvimento de protótipos para a Studebaker, construtora que possuía contrato com a firma de Stevens.
O proprietário deslocar-se-ia à Vignale diversas ocasiões no decorrer do projecto; contudo, a primeira visita não foi cedo o suficiente para evitar que os trabalhadores da firma italiana destruíssem por completo a carroçaria de fábrica do Corvette (modelo de 1959 ou 1960, fontes divergem), a qual Kelly esperava poder vender de modo a recuperar algum do investimento no projecto. O acto não foi malicioso, simplesmente uma falha de comunicação; os artesãos da Vignale, não acostumados a elementos em fibra de vidro, não consideraram o exterior do automóvel como de qualquer valor, não poupando à força bruta no processo de desmontagem. A nova carroçaria seria moldada no processo tradicional de painéis batidos sobre um molde de madeira, logo a original era – para os funcionários da Vignale – completamente inútil. Apesar de a desmontagem ter ocorrido então na Carrozzeria Vignale, muito do trabalho acabaria por vir a ser realizado na Carrozzeria Sibona & Basano, também em Turim. As duas companhias tinham relação familiar além de profissional, visto Walter Basano ser sobrinho de Alfredo Vignale.
Com o automóvel, Breslow tornou-se igualmente o guardião de todo o material associado ao design e construção do Corvette Kelly Vignale, incluindo o modelo à escala e os esboços originais, assim como toda a correspondência trocada entre Gordon Kelly, GM e Vignale; um espólio inestimável para acompanhar uma criação única. Num vídeo da Petrolicious em 2016, Breslow descreveu o automóvel como “a van Gogh you can drive”.