Ferrari 250 GTO: La macchina più bella

16/09/2019

O Ferrari 250 GTO é possivelmente o automóvel mais admirado de todos os tempos, fruto do laborioso trabalho de um grupo de génios cuja empreendimento culminou numa criação imortal, numa lenda de culto e numa silhueta de poster.

Com a determinação e a convicção de que “o meu melhor automóvel será o próximo”, Enzo Ferrari sempre colocou a fasquia em patamares extremamente altos, exigindo o máximo de todos os intervenientes. Se assim não fosse, talvez hoje não dedicasse as linhas que escrevo à sua soberba obra. Cada um dos actores desta peça tem a sua influência, quer por êxitos, quer por fracassos, sendo esta pivotal para o alcance da obra de puro génio que é o 250 GTO.

Genesis

A competição sempre foi o píncaro automóvel de Enzo, a sua motivação maior e a solene razão para que, hoje em dia, sequer sejam vendidos automóveis Ferrari ao público em geral, pois não fosse a obsessão de Enzo tão desmedida e possivelmente não haveria necessidade de financiar a Scuderia com a venda pública de modelos, sendo que os únicos Ferrari que veríamos seriam nos circuitos (se tanto).

Depois de ter sido piloto da Alfa Romeo, criaria a Ferrari em 1929 com os irmãos Caniato e Tadini com o propósito de serem estes mesmos os pilotos das suas criações debaixo da máxima “quem vence uma prova não o faz por ser o melhor piloto, senão por estar na melhor equipa”. Ao fim de poucos anos, abandonariam a equipa por opiniões contrárias acerca de temáticas-chave.

Após um período no qual não poderia produzir automóveis sob o nome Ferrari em virtude de um contracto anterior assinado com a Alfa Romeo, Enzo subjugou-se à aspiração de criar o seu próprio automóvel de corrida e de o comercializar. Com esse objectivo em conta recorre a alguns dos mais brilhantes engenheiros a cargo da Alfa Romeo como Gioacchino Colombo, protegido de Vittorio Jano e criador do motor do 158 Alfetta de 1937, projecto no qual Enzo supervisionava o departamento de competição. Ainda que Colombo não fosse efectivamente um engenheiro, acabou por se enquadrar neste papel pelas funções que desenvolvia na Alfa Romeo enquanto projectista e desenhador, para as quais tinha um talento natural.

Nas contas de Enzo entrava também Luigi Bazzi, colaborador no projecto do Alfetta e homem de absoluta confiança do Commendatore.

125S: Puro Foco Competitivo

Solucionados os problemas acerca da denominação comercial e terminada a 2ª Guerra Mundial, Bazzi encabeça a equipa de engenheiros e Colombo desenvolve o primeiro motor sob o comando de Enzo.

A importância capital dos sistemas de propulsão para Enzo ficaria para sempre gravada pelas frases “Quando se compra um Ferrari, paga-se o motor, o resto é oferta” e “A aerodinâmica é para aqueles que não sabem construir motores”.

O trabalho simultâneo que Colombo fazia para a Alfa Romeo e um processo aberto que possuía por possível associação com o regime impediram-no de supervisionar os trabalhos finais do 125, para o que recomendou então Giuseppe Busso, responsável pelos motores da Alfa Corse desde 1939. Inicialmente Enzo desvalorizava tal supervisão, mas ao observar avances significativos nos meses seguintes à nomeação, promoveria Busso a Director Técnico em 1946.

Os automóveis concebidos nesta primeira etapa tiveram sempre em mente a competição, com particular foco para a temporada de 1947, ano em que é apresentado o 125 S. Logicamente que, após o término da sua construção, foi imediatamente inscrito no Grande Prémio de Roma, alcançando nesta prova a sua primeira vitória com Franco Cortese como piloto. Este modelo surgia equipado com um motor V12 a 60˚ de 1496 centímetros cúbicos desenhado por Colombo e supervisionado por Busso e pelo seu ajudante Aurelio Lampredi. A base desta criação daria origem a toda uma geração de motores V12 a 60˚ (motor Colombo) que perduraria por diversos anos, sendo um motor desta família o escolhido para o acoplamento à carroçaria dos GTO.

1947 foi também o ano em que a Fórmula 1 surgia com realce agravado e a Ferrari não pretendia deixar passar a oportunidade de ser participe no maior evento motorizado do mundo. O 125S seria adaptado num monolugar com designação 125F1. Apesar da premissa inspiradora, o 125F1 não mostrou ter andamento para a competição, o que motivou a exigência de Enzo a Lampredi para que, com a supervisão de Busso, desenhasse um novo motor V12 naturalmente aspirado. Esta foi a origem dos modelos 275, 340F1, e 375F1.

Será também de relevo mencionar um nome incontornável na imagem do GTO, Giotto Bizzarini, o principal responsável pelo desenvolvimento do mesmo, que por esta altura era um estudante de engenharia na universidade de Pisa. Apesar de apenas um estudante, Bizzarini demonstrava já a apetência e inovação que o tornaram celebre, nomeadamente pelas alterações que efectuara ao seu Fiat 500 Topolino, que designava de Macchinetta. Neste concretizava as suas próprias inovações e experiências, chegando a competir em provas de circuito e a preparar automóveis Alfa Romeo com ajustes considerados milagrosos. Ao tomar conhecimento das alterações e ideias de um jovem Bizzarini, Enzo considerou que “um homem capaz de construir e pilotar máquinas assim tem que trabalhar na Ferrari”. E anos depois, seria precisamente isso que ocorreria.

Um V12 perpétuo

Busso, em colaboração com Lampredi, aumentou a cilindrada do V12 que idealizou para os 1902 centímetros cúbicos, motor destinado ao 159 S com o qual Bazzi (que assumia também funções de piloto de testes) sofreu um acidente fortíssimo em 1950 que lhe danificaria seriamente os membros inferiores. A partir do incidente deixaria a primeira linha nos trabalhos de engenharia.

Neste mesmo ano ocorre uma alteração importante nas formações da Alfa Romeo e da Ferrari, com Colombo a incorporar definitivamente a Ferrari (abandonando a Alfa Romeo) e com Busso a ingressar na Alfa Romeo, na qual teve uma influência tão grande que um dos mais memoráveis motores Alfa recebeu a sua designação, o violino da marca. A incorporação de Colombo por esta altura foi crucial, particularmente se tivermos em via de conta o seu papel crucial no desenvolvimento do Ferrari 166 com um motor de 1995 centímetros cúbicos baseado nas suas criações anteriores, este que seria o 2º modelo para venda ao público da marca de Maranello. Na sua versão de competição conseguiria três vitórias consecutivas na Mille Miglia, entre 1948 e 1950.

Apesar da estrita colaboração entre ambos, Lampredi e Colombo discordavam acerca do caminho a seguir no desenvolvimento dos motores Ferrari, sendo que enquanto Lampredi acreditava na ideia de aumento de cilindrada como forma de evolução, Colombo defendia a procura de implementação de um sistema de sobrealimentação. Esta discórdia, logo numa temática tão vital para Enzo como as unidades de propulsão, seria testada pela comparação de prestações do 275F1 de Lampredi com o seu antecessor 125F1 sobrealimentado de Colombo, da qual se aclarou a virtude da primeira opção.

No seguimento, e mediante um rol de situações que escalava, Colombo vê-se relegado para funções menores no departamento de produção, o que acabaria por culminar com a sua saída em 1951 para regressar à sua casa de sempre, a Alfa Romeo. Ainda que se possa admitir uma superioridade nas ideologias de Lampredi, a evolução do motor V12 a 60˚ foi fruto da plena interacção entre os três responsáveis pelo seu desenvolvimento.

Com o foco no supramencionado aumento de cilindrada, o modelo a desenvolver seguidamente pela marca de Maranello seria o 212, com um motor de 2562 centímetros cúbicos. Este modelo acabaria por ficar associado a outro momento caricato da marca, pela súbita vontade de Enzo de alterar a designação inicial de 213 (a divisão dos 2562 centímetros cúbicos pelos 12 cilindros do motor daria um volume de 213,5 centímetros cúbicos), uma vez que a julgava possível causadora de azares.
Ao 212 acabaria por suceder o 225, um passo praticamente experimental entre o 212 e o 250, com uma também intermédia cilindrada de 2,7 litros. Este motor “Colombo” contava com distintas características Lampredi, como guias com came apoiada e condutas de admissão individuais, ao contrário das condutas gémeas de versões anteriores.

Estava dado o ímpeto para a criação da lenda.

José Brito / Jornal dos Clássicos