O homem que inventou o “violino” da Alfa Romeo

21/03/2017

Passam dez anos sobre o desaparecimento, aos 92 anos, de um homem marcante para a indústria automóvel e para os alfisti em particular: o engenheiro Giuseppe Busso. Foi uma personalidade multifacetada na área da engenharia mecânica, aplicada à indústria automóvel e da aeronáutica, entre outras. Liderou as equipas de engenheiros em todos os projectos da Alfa Romeo no pós-guerra – com a excepção do projecto da submarca Alfasud. Os célebres motores bialbero – de quatro ou seis cilindros, os V6, V8 em liga de alumínio – nasceram sob a direcção técnica de Giuseppe Busso, na fábrica de Portello e, mais tarde, de Arese. Foram consequência natural da sua experiência nos motores de avião. Muitos passaram à produção, materializando-se em modelos de série ou de competição. Outros terminaram na fase de protótipo.

Natural de Turim, onde nasceu a 27 de Abril de 1913, ingressou na marca do Biscione, no fim da década de 30, da qual só saiu em 1977 após exercer vários cargos diretivos. Este longo e fértil período foi interrompido por um ano, quando aceitou o convite do Commendatore (influenciado pelo seu amigo Gioachino Colombo) para assumir, em Junho de 1946, o cargo de primeiro director técnico da embrionária Ferrari, enquanto marca independente, em Maranello. Em Janeiro de 1948, estava de regresso à Alfa Romeo.

A respeito do profícuo trajecto de Busso havia muito a escrever. Todavia, pretendo destacar um aspecto esquecido, relacionado com o facto de associarmos a Alfa Romeo a modelos com transmissão traseira. Todavia, a ideia de produzir um pequeno Alfa Romeo de transmissão dianteira sempre existiu e foi defendida por Busso – contra a posição dominante na direcção da empresa.

A possibilidade de um Alfa Romeo mais acessível, de baixa cilindrada, remonta à década de 40 e a um projecto assinado por Wilfredo Ricart. Foi anterior ao 1900 e ao Giulietta, com motor de 1290 cc, apresentado em 1954, mas fiel à transmissão traseira.

Esta opção ganha novo impulso por volta de 1952, quando um destacado membro da equipa técnica, Rudolf Hruska, dá a saber a Busso e à restante equipa que a Finmeccanica prevê um novo projecto de cilindrada inferior à Giulietta. Os desenhos técnicos que datavam há mais tempo no departamento de projectos especiais, indicavam a hipótese de um motor de dois cilindros em linha, transversal, com cerca de 850 cc, refrigerado a água e transmissão dianteira, com o nome interno de “Vettura 1361“. Mais tarde, seria apelidado de “Tipo 103“ – permitindo um novo enquadramento da marca. Várias hipóteses ao longo do tempo foram colocadas, com refrigeração a ar ou a disposição de um motor boxer de quatro cilindros, com cilindradas de 350 a 750 cc.

Tudo foi equacionado pela direcção, em conjunto com os técnicos, ao longo dos anos, ficando, na maioria, no papel. Após as enormes vicissitudes na sua gestação, o “Tipo 103“ de transmissão dianteira, atingiu a fase de protótipo funcional em 1961, com 720 kg e motor de quatro cilindros, com 900cc, refrigerado a água, debitando 49 cavalos e podendo atingir 139 km/h. Mas a direcção, chefiada por Orazio Satta Puliga, não se encantou com a ideia de Busso e optou, em alternativa, por produzir, sob licença, o modelo Dauphine-Alfa Romeo para o mercado italiano. Se a história tivesse sido diferente, a Alfa Romeo teria apresentado a solução da transmissão dianteira e motor transversal pela primeira vez, anos antes do Austin/Morris 850, o Mini de Alec Issigonis, que surgiu em 1959.

A experiência técnica de Busso em projectos de tracção dianteira remonta à sua passagem por Maranello, onde esteve imerso no projecto do Tipo 125 S – o primeiro Ferrari – supervisionando a concepção do seu motor V12, mas também num modelo de seis cilindros e 750 cc com este tipo de tracção, que não superou a fase de prototipagem.

Giuseppe Busso deixou a sua marca na Alfa Romeo, pelos seus vários motores em outras tantas configurações de sucesso. Adoptou sempre soluções tecnológicas e materiais mais avançadas para cada época. O último dos seus projectos na marca foi o célebre V6 a 60º de 2500cc e 12 válvulas, apelidado de “Busso“. Este motor, estreado no Alfa 6, em 1979, continuou em produção e actualização em sucessivos modelos – incluindo 164 e o 155 V6 Ti vencedor do DTM e o posterior 156 de transmissão dianteira, cumprindo finalmente um sonho do seu criador! Após a compra pelo grupo de Turim, usaram-no em modelos Fiat e Lancia. Só no final de 2005 é que foi descontinuado, pelo não cumprimento cumprimento das normas europeias de emissões, impostas a partir de 1 de Janeiro de 2006. A Cosworth tentou comprar os direitos de produção do V6 para competição, sem sucesso. Por coincidência, três dias depois de o seu motor perder validade burocrática – a 3 de Janeiro de 2006 – Giuseppe Busso despediu-se deste mundo. Morreu o Mestre mas não sua extensa obra! Em especial o seu V6 apelidado de “Violino de Arese“! E esteja onde estiver, Busso escuta a sua melodia, sempre que um alfista possa dar-lhe um sopro de benzina e de vida! Orquestrando um autêntico “por quem os sinos dobram“.

Figura decisiva na história da Alfa Romeo, Giuseppe Busso, era um incondicional da tração dianteira...
Grazie mille, Giuseppe Busso!

 

Marco Pestana/Jornal dos Clássicos

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