O desportivo americano criado pela paixão de dois amigos

09/10/2019

O Kircher Special foi um automóvel desenvolvido na década de 50, por dois homens que queriam criar um automóvel desportivo para competir, baseando-se no que se fazia na Europa. Tal como muitos outros projectos, com o fim da Segunda Guerra Mundial, a vontade de construir algo único com o melhor que se sabia tornou-se num movimento com bastantes adeptos, principalmente no Reino Unido.

Uma dessas pessoas foi Charles Hughes, que comprou um Jaguar XK120 a Kurt Kircher, da Denver Import Motors, no Colorado, iniciando assim uma relação de amizade bastante duradoura entre os dois. Kircher fazia competições com o seu Allard J2X e Hughes queria competir com o seu XK120, não tardando muito até os dois começarem a pensar em construir o seu próprio automóvel.

Kurt tinha frequentado Engenharia Mecânica e chegou a trabalhar na General Motors, no desenvolvimento de motores V8 e da caixa automática Powerglide, antes do despoletar da Segunda Guerra Mundial. Já Charles tinha frequentado Física e era proprietário de uma garagem para seis automóveis, com boa maquinaria. Ou seja, tinham os ingredientes necessários para a construção de um automóvel.

O chassis utilizado é tubular, produzido em crómio-molibdénio, com bastantes furos para diminuir o peso. A suspensão independente da frente foi retirada do Jaguar XK120 e na traseira utiliza o sistema De Dion, com travões de tambor embarcados e diferencial Halibrand. A direcção foi retirada de um MG. Já o motor utilizado foi extraído do XK120, um seis cilindros em linha, com dupla árvore de cames à cabeça e 3.4 litros de cilindrada, acoplado a uma caixa de quatro velocidades.

A carroçaria foi desenhada por Charlie Lyons, com desenho inspirado nos desportivos italianos e britânicos, construída à mão em alumínio, podendo ser removida para facilitar o acesso à mecânica, para reparações. Estranhamente, este automóvel só tem uma porta, do lado do passageiro. Os faróis foram montados dentro da grelha frontal, para não perturbar a aerodinâmica. Na carroçaria existem algumas aberturas, para expelir o ar quente e para o sistema de escape.

Infelizmente, não existem registos das provas onde o Kircher Special participou, no entanto, Kurt escreveu que participou em todas as provas que queria, tendo ganho a maior parte e nunca terminou abaixo do terceiro lugar.

A meio da década de 50 o Kircher Special deixou de ser tão competitivo, devido ao desenvolvimento dos seus oponentes, desse modo foi pensada na solução de trocar de motor. Para espanto dos seus construtores, o motor de seis cilindros e de injecção mecânica M198 do Mercedes-Benz 300SL cabia na perfeição no cofre do motor, sendo essa a solução adoptada. O motor foi retirado de um 300SL que teve um acidente e era para ser montado num automóvel que competiria na Mille Miglia, tendo sofrido já algumas alterações, como uma árvore de cames de competição, fazendo a potência subir para os 240 cv, que combinado com o baixo peso, fazia do Kircher uma arma perfeita para as corridas. Após isso, teve outros motores, todos eles pertencentes ao 300SL.

Com a sua vida útil terminada, o Kircher Special foi vendido ao seu designer Charles Lyons, que montou um motor M198 original, mantendo-o durante alguns anos. Durante o seu período de vida, teve vários donos, passando por Carlton Coolidge, um coleccionador de Bugatti e pelo Blackhawk Museum. Passou também em vários países, como Nova Zelândia, Singapura e Malásia, nas várias viagens feitas com Mr. Court Whitlock, que também o levava para a pista.

De todos os motores do 300SL que o Kircher Special teve, o último motor foi a razão da compra de Jack Gallivan que tinha da sua posse o Mercedes-Benz 300SL que saiu de fábrica com o correspondente motor, tendo então adquirido o Kircher só para trocar de motor com o 300SL.

Nos últimos anos, foi submetido a um pequeno restauro, pela Moore’s Automotive Archeologists. A 16 de Agosto deste ano foi levado a leilão pela Bonhams, no evento Quail Lodge Auction, onde foi arrematado por 277,074€.