Cunho Gaulês
A criação do Williams adveio da oportunidade da Renault incluir um veículo competitivo na categoria de 2 litros e duas rodas motrizes no Mundial de Rali. Até esse momento, o Clio 16V representava a oferta mais desportiva da gama, mas a sua cilindrada de 1.8 litros não se adequava às exigências da categoria em questão, sendo então necessário lançar uma versão mais radical do comum utilitário.
Como ideia inicial, a marca Francesa apontava para a fabricação de 2500 unidades (exigência mínima para homologação de um veículo para competição nos grupos A e N), mas o pequeno desportivo representou um êxito tal que no total se contabilizaram mais de 12.100 Clio Williams fabricados.
Apesar da necessidade técnica, não poderão restar dúvidas acerca do marketing envolvido, com a Renault a demonstrar ser uma potência na Fórmula 1 do princípio da década de 90 pela mão da Williams Racing com títulos mundiais em 1992 com Nigel Mansell e em 1993 com Alain Prost, aproveitando tal posição para estabelecer relação com um desportivo acessível.
Com um período de fabricação entre 1993 e 1996, foram 3 as séries distintas do pequeno desportivo francês. Numa 1ª série, a mais leve pelo escasso equipamento disponibilizado, seriam fabricadas 5417 unidades, sendo esta facilmente reconhecível pela famosa numeração de edição limitada numa placa no tablier à direita do condutor e pela tonalidade 449 Sports Blue. Já na 2ª série seriam fabricadas 5065 unidades, em muito similares à 1ª, e numa 3ª e última série fabricar-se-iam 1618 unidades, com a incorporação de tecto de abrir e uma tonalidade ligeiramente menos escura de designação 432 Monaco Blue. Em nenhuma das séries haveria alterações mecânicas de importância.
O êxito entre os aficionados de automóveis desportivos era inegável, tendo como primordial mostra o contraste entre as mais de 12.000 unidades vendidas e as 2.500 perspectivadas, permanecendo no imaginário colectivo como um dos melhores desportivos compactos da sua era (o que já seria dizer muito), capaz de rivalizar com automóveis de segmento superior como o Golf GTI e o Astra GSi 16V. A designação Williams auxiliou tremendamente as vendas, muito em parte pela crença de que a equipa F1 de Sir Frank Williams estaria envolvida no desenvolvimento do mesmo, apesar de na realidade apenas lhe “emprestar” o nome.Clio 16V, base para evolução
Para a criação do Williams, a Renault partiu do Clio 16V, com diversas melhoras de relevo.
Começando pelo exterior, os Clio Williams diferenciavam-se por estarem pintados com as duas ante mencionadas referências de azul, pelos autocolantes com a insígnia da Williams Racing (bons velhos tempos do valor dos autocolantes) e pelas famosas jantes douradas Speedline de 15 polegadas. Estas facilmente reconhecíveis combinações não possuem qualquer excepção original, não sendo possível seleccionar outra tonalidade de pintura e não havendo qualquer equipamento opcional, sendo infelizmente várias as unidades Clio 16V convertidas para especificações similares às do Clio Williams, pelo que a procura no mercado de usados deve reflectir cautela.
Também no interior as diferenças eram visíveis, com a tonalidade azul a ser de novo protagonista. A sua presença nos tapetes, cintos e mostradores sem dúvida dá a entender o tema desejado. Já os assentos foram herdados do Renault 19 16V (ainda que com diferente padrão), apresentando o emblema da Williams bordado a (como não) azul.
A instrumentação assumia-se como muito completa, com a adição de controlo dos níveis de temperatura e pressão de óleo.
Em regimes baixos o carácter era bastante progressivo e enérgico, sendo a evolução entre as 4000 e as 6500 rpm (onde a injecção sobre um corte abrupto) destacável, tornando o magnifico carácter desportivo do motor 2.0 numa das suas maiores virtudes.
A caixa de velocidades é também derivada da utilizada no 16V, reforçada para aumento de fiabilidade e com as relações ligeiramente distintas e mais bem escalonadas.
Apesar do soberbo motor e caixa de velocidades, é no chassis que o Williams mais brilha, com uma manobrabilidade rápida e precisa e uma aderência mecânica de louvar, com um arrolar de componentes do Renault 19 16V como a suspensão dianteira (com um triângulo inferior a possibilitar uma diminuição de 34 milímetros de altura), amortecedores mais rígidos e barras estabilizadores de maior espessura a certamente terem um papel pivotal, garantindo maior eficácia a alta velocidade. Tudo isto aliado às jantes de 15 polegadas e pneumáticos de medida 185/55 resultava num automóvel com tendência muito menos subviradora que o 16V, sendo o chassis capaz de absorver o aumento de potência de forma perfeita. Por sua vez, o eixo traseiro era idêntico ao do Clio 16V.
A direcção possuía assistência hidráulica (sendo ainda assim algo pesada) e uma desmultiplicação (2,75 voltas) e precisão de louvar. Com travões de disco ventilados à frente e de discos maciços atrás, o tacto e a potência de travagem não possuíam quaisquer lacunas, sendo a única melhora a apontar a resistência ao desgaste.
Ainda que os consumos não fossem uma das características primordiais, uns moderadas 8 litros aos 100 quilómetros em condução serena, uns expressivos 11 em cidade, e uns desportivos 15 em regimes mais elevados são de destacar.
Um ícone dos ralis
Não poderão restar dúvidas de que o Clio Williams representa um dos melhores e mais desejados hot hatches dos anos 90, como comprova a subida da sua cotação em mercado, situação auxiliada pela sua exclusividade e pela associação aos louros em rali, com 184 vitórias à classe. Várias foram as versões que abrilhantaram as especiais de rali, com destaque para a de Grupo N (com 165 cavalos de potência) e a de Grupo A (com 205 a 220). Contudo, o topo dos topos seria lançado no final de 1994, baptizado como Clio Williams Maxi Kit Car, com potências compreendidas entre os 255 e os 270 cavalos, a mais procurada e apetecida da época nos ralis. Possuía jantes Speedline de 17” ao invés das de 16” anteriores e aplicação de suspensões Proflex. O motor era preparado pela Sodemo de acordo com as regras definidas para os Kit Cars (evolução mais musculada das regras dos Grupo A convencionais, com maiores jantes, maior distância entre eixos e motores levados a maiores rotações e potências). O seu aspecto era muito mais agressivo, com as vias mais largas, em especial à frente, e com a aplicação de um aileron traseiro em carbono de dimensões significativas.
Nunca chegou a ser um êxito no Campeonato Mundial de Ralis, nem poderia sê-lo dada a sua tracção meramente frontal, mas entre os “duas rodas” motrizes foi provavelmente o melhor da sua época. A nível nacional a dupla José Carlos Macedo e Miguel Borges é indissociável do êxito do modelo, superada a nível internacional pela estonteante dupla Jean Ragnotti e Pierre Thimonier, que apesar da sua mestria e da capacidade para elevar o nome da Renault de novo às bocas dos aficionados do mundial de ralis, não possuía argumentos para contrariar o maior poderio e eficácia dos WRC de tracção total como os Escort RS Cosworth, os Delta HF Integrale, os Celica 4WD ou os Impreza 555.
Por terras Lusitanas, os Renault Clio Williams/Maxi correram entre 1994 e 2000. Sem desprimor para os vários pilotos privados que os utilizaram quer enquanto Grupo A, quer de acordo às regras do Grupo N (António Jorge, António Gravato, António Sousa, José Pedro Miranda e Filipe Pinto, citando apenas os de presença mais regular), o destaque tem que ser dado à equipa oficial da filial portuguesa da marca, a Renault Gest GALP.
Com o sucesso do ano anterior, os homens da Renault começaram o ano seguinte com dois Clio Williams, juntando-se à dupla do ano anterior Pedro Azeredo e Fernando Prata. Com aquele veículo, as vitórias na categoria continuaram a aparecer com regularidade. O Williams seria evoluído para Maxi, versão com que a equipa oficial correu a partir do Rali Cidade Oliveira do Hospital. Imbatíveis até ao final dessa temporada, em que repetiram o título de F2, deixariam de o ser quando surgiu em cena o Peugeot 306 Maxi, feito de raiz como Kit Car, e não uma simples evolução.
Em 1997, a Renault Gest GALP deixou de usar o Clio Maxi, trocando-o, com sucesso ao nível de classificação geral, pelo mais competitivo Megane Maxi, sendo que durante esse ano e os restantes três os pilotos a defender as cores dos Clio, tanto como Williams, quer como Maxi, não obteriam resultados de destaque.
Esta decisão seria uma repercussão do definido pela casa-mãe, que passaria também a preparar os Megane para a variante Maxi com o intuito de competir em provas de rali. Esta troca em nada invalida o legado do Clio Williams/Maxi, um ícone quer em prova, quer em estrada, um dos pequenos desportivos ao volante dos quais sempre se haverá de encontrar um qualquer entusiasta de sorriso rasgado e certamente mais um veículo fascinante que passará desapercebido ao olho incauto.