Quando Senna assinou pela Ferrari

28/10/2018

Ayrton Senna, piloto da Ferrari. O capacete amarelo sobressaindo do automóvel vermelho. Nunca se tornou realidade, mas foi por pouco, muito pouco. Numa altura em que os campeonatos são dominados, pela McLaren e a Williams, pilotar pela Ferrari continua, ainda assim, a ser o sonho de qualquer piloto de Fórmula 1 e Senna não é excepção. Por seu lado, a equipa de Maranello sabe que só poderá regressar às vitórias se tiver os melhores pilotos e Ayrton Senna é obviamente um deles…

Em 1989 Cesare Fiorio é nomeado director desportivo da Scuderia Ferrari. Depois de ter levado a Lancia aos triunfos nos ralis, é-lhe confiada a missão de fazer o mesmo com a Scuderia Ferrari. Para isso, é mandatado para constituir uma equipa com os melhores profissionais e, claro, os melhores pilotos.

Assim, logo a seguir ao Grande Prémio do Mónaco desse ano, Fiorio começa a sondar Senna para saber do seu interesse em pilotar para a Ferrari já no próximo ano. Invocando o seu vínculo contratual com a McLaren até o final de 1990, as negociações ficam adiadas. Fiorio não consegue trazer Senna, mas consegue trazer Prost, o qual fará equipa com Nigel Mansell para a próxima época. Esta dupla contentaria qualquer equipa, mas ainda assim, a Ferrari não desiste de Senna.

Após o Grande Prémio do Brasil de 1990, Alain Prost, vencedor da prova, bem como o resto da equipa deixam o circuito de Interlagos rumo a Itália, excepto Cesare Fiorio, que fica em São Paulo. No dia seguinte, reúne-se em casa de Senna para falar do futuro, mais concretamente das épocas de 1991 e 1992. O interesse manifestado pelo piloto brasileiro em pilotar um Ferrari e a concordância quanto aos principais aspectos duma eventual colaboração, deixam Fiorio confiante de que poderá contar com Ayrton Senna na Ferrari a partir do próximo ano. Nem a reedição de uma “parceria” com Alain Prost incomodara o piloto brasileiro.

As conversações prosseguem na quinta-feira que antecede o Grande Prémio de França. Antes de ir para o circuito do Castellet, Fiorio faz um desvio pela residência de Senna no Mónaco para tratar dos últimos pormenores do futuro contrato. A vitória de Prost no domingo demonstra uma vez mais a competitividade do Ferrari 641 e conforta Senna quanto à sua escolha para o próximo ano. Na segunda-feira seguinte, a sede da Ferrari recebe um fax: trata-se de um pré-acordo assinado por Ayrton Senna que coloca no papel o entendimento formulado oralmente entre este e Cesare Fiorio durante as reuniões anteriores.

O Ferrari 641 de 1990, evolução do 640 do ano anterior concebido por John Barnard, pioneiro nas mudanças semi-automáticas ao volante, começa a devolver alguma alegria aos tiffosis. Internamente, muitos querem capitalizar sobre esse sucesso e ganhar algum protagonismo. Para Cesare Fiorio, o presidente da Ferrari é um deles: “Era um burocrata que sofria por não estar sob os holofotes”. Agora que a equipa regressava às vitórias, Piero Fusaro precisava de afastar Fiorio para ficar com os louros dos novos sucessos. Assim, informa Prost das diligências levadas a cabo por Fiorio para recrutar o seu ilustre rival brasileiro, o que desagradou, e muito, ao piloto francês e desencadeando um conflito entre piloto e director desportivo.

Invocando uma desculpa com os patrocinadores, Piero Fusaro cancela as negociações com Senna, desautorizando assim Cesare Fiorio que não vê outra saída senão a demissão, levando com ele o pré-acordo assinado por Senna que permanece então na McLaren e conquista o seu terceiro título em 1991. Na Scuderia o ambiente está eléctrico e Prost acabará despedido por ter comparado o seu Ferrari a um camião.

Chegamos a 1994, Senna é piloto da Williams-Renault e a Ferrari é agora dirigida por Luca di Montezemolo e a direcção desportiva é confiada a Jean Todt. Mudaram os nomes mas permanece a vontade de contratar Senna. Poucos dias antes do fatídico Grande Prémio de Imola, Ayrton Senna reúne-se com di Montezemolo em casa deste, no dia 27 de Abril. Nessa reunião, reiteram-se as vontades recíprocas de colaboração, remetendo para um próximo encontro a resolução dos últimos aspectos de um eventual contrato. Todos sabemos o que aconteceu no domingo seguinte. Infelizmente, o mito Senna e o mito Ferrari nunca se juntaram.

Bruno Machado/Jornal dos Clássicos

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