Microplásticos invisíveis a olho nu estão a chegar aos nossos pratos

28/09/2018

Numa conferência organizada pela EGF e pelo Centro de Comunicação dos Oceanos, a investigadora da Universidade de Coimbra, Filipa Bessa, mostrou fotos que demonstram que os plásticos estão já a entrar na nossa cadeia alimentar, sem que nos apercebamos dado o seu microtamanho. O problema do plástico é real.

A EGF e o Centro de Comunicação dos Oceanos (CCO) organizaram uma palestra dedicada ao tema dos plásticos em ambiente marinho.

É, de resto, o sexto debate dedicado ao assunto que EGF e CCO organizam e dos quais demos aqui conta no Watts On.

A EGF (Environmental Global Facilities) é uma empresa do Grupo Mota-Engil, especializada no tratamento e valorização de resíduos em Portugal. Possui onze concessionárias de tratamento de resíduos: Algar, Amarsul, Ersuc, Resiestrela, Resinorte, Resulima, Suldouro, Valnor, Valorlis, Valorminho e Valorsul.

A conferência realizou-se no Centro de Triagem da Valorsul, no Luminar, e uma fotografia macro que foi exibida no evento, mostrando ao nível microscópica fibras de plásticos enroladas a cristais de sal, acabou por estar no centro das atenções.

A imagem foi tirada e dada a conhecer por Filipa Bessa, investigadora do MARE – Marine and Environmental Sciences Centre (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente) da Universidade de Coimbra, sendo a prova de que o plástico já está a chegar ao prato e entrou na cadeia alimentar.

Esta bióloga tem vindo a estudar a presença nos ambientes marinhos portugueses de microplásticos, partículas de plásticos abaixo de 5 mm. Resultam da sucessiva e múltipla fragmentação do plástico: “O plástico não termina no microplástico. Depois avança para nanoplástico”, alerta.

O Centro de Comunicação dos Oceanos, projeto patrocinado pela EGF e pelas suas concessionárias, pretende divulgar e partilhar informação atualizada sobre a temática sobre os oceanos, interligando todos os países de Língua Portuguesa a partir de Lisboa. Trata-se de um projeto de Nysse Arruda, jornalista brasileira, especialista em temas náuticos há mais de vite anos em Portugal e autora de várias publicações.

Na investigação que tem produzido, Filipa Bessa tem encontrado na costa, seja na água ou na sedimentação, vestígios abundantes de plásticos na costa portuguesa, invisíveis a olho nu, mas que a análise à escala micro evidencia, conferindo uma dimensão ainda mais dramática ao problema do plástico no Planeta.

“Mais plástico que animais”

“Para além do plástico de grandes dimensões que se encontra no mar ou nas zonas costeiras, temos outra situação que é a presença de microplásticos no mar, os quais facilmente se encontram numa amostra. Se se colher e analisar uma amostra de água do mar, facilmente se encontram estas partículas finas de plástico. Algumas análises que tenho feito com amostras de areia de leitos marinhos chego a encontrar mais plástico do que animais”, aponta esta especialista que se tem recolhido, sobretudo, amostras no rio Mondego e na sua foz, quer água quer sedimentos.

“É um projeto de seis anos de duração que vai agora a meio e que pretende perceber melhor que quantidade de plástico é ingerida pelos animais, como bivalves ou crustáceos. Temos estudos que indicam que mais de 300 espécies já ingeriram microplásticos”, afirma Filipa Bessa que aponta que mesmo os cenários de animais marinhos, como tartarugas ou outros, estarem a debater-se em redes de pesca ou emaranhados em plásticos não acontecem unicamente em animais de porte maior, existindo igualmente à escala microscópica: “À microescala já observámos seres vivos também emaranhados em microplástico (fibras sintéticas)”.

Uma ameaça real

A investigadora do MARE refere que o plástico “é uma ameaça real. Está presente em peixe de interesse comercial e que nós ingerimos”.

A conferência decorreu no Centro de Triagem da Valorsul, num anfiteatro improvisado, cujas “paredes” eram constituídas por 49 fardos de plástico PET que perfaziam 10 toneladas que iriam ser enviadas para reciclar, dando para fazer 40.800 t-shirts.

A bióloga da Universidade de Coimbra declara, aliás, que o plástico não está apenas a chegar às nossas mesas, encontrando-se, igualmente, no ar que respiramos: “Há nanopartículas de plástico também em suspensão no ar”.

Outro aspeto que tem motivado o interesse científico de Filipa Bessa é a capacidade do microplástico, ele próprio, assimilar metais pesados: “Já percebemos que o microplástico, simultaneamente, absorve contaminantes e liberta toxinas e aditivos químicos e a comunidade científica está a tentar perceber melhor que contaminantes são esses e como é que se processa a libertação desses químicos”, afirma a especialista.

Borracha também é perigosa

“Igualmente perigosa é a borracha presente nos mares. Também se encontra à microescala nas amostras que costumo recolher, ainda que numa quantidade menor do que o plástico”, afirma Filipa Bessa.

Sabia que…
Se estima que mais de 250 milhões de toneladas de plástico acabem por ir parar ao oceano em 2025?

Sobre os efeitos que a ingestão de microplástico tem nos seres marinhos que tem estudado, esta bióloga salienta que essas manifestações se traduzem em danos na reprodução e introduzem alterações no comportamento.

“No ser humano ainda não há certezas absolutas sobre o efeito no organismo destas substâncias não digeríveis, sendo um assunto que terá de ser mais bem estudado”, embora Filipa Bessa não negue que a praga do plástico no ambiente constitui um fator de preocupação em termos do potencial impacto na saúde.

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