O comunicado dos pilotos colocava o dedo apenas numa das feridas: a falta de segurança das provas, principalmente nos ralis disputados em Portugal e em Itália. Porém, omitia aquela que era já outra preocupação: a escalada de potência dos carros de Grupo B que facilmente ultrapassavam os 500 CV, para menos de uma tonelada de peso, graças a chassis tubulares, carroçarias em Kevlar e outras tecnologias “loucas” como a montagem de dois amortecedores por roda ou a possibilidade de os pilotos controlarem (já nesse tempo), a partir do habitáculo, a distribuição de potência entre os dois eixos (todos os carros possuíam tração integral, uma “moda” introduzida em 1980 pelo Audi Quattro).
Na altura, disputavam o Mundial a Peugeot, com o 205 Turbo 16 (480 CV), a Lanci, com os Delta S4 (560 CV), a Audi, com o Quattro (560 CV) e a Ford com o RS200, cujo motor de 1,8 litros de cilindrada (como os restantes) preparado pela Bryan Hart ultrapassava, também os 500 CV. Eram máquinas incríveis, desenvolvidas sem limites (era esse o espírito dos regulamentos) para levar o espetáculo a níveis inimagináveis, desprezando os riscos que eram já evidentes: em 1985 Attílio Bettega viria a falecer no num Delta S4 (nº4) no Rali da Córsega e, nesse mesmo ano, o finlandês Ari Vatanen teve um violento despiste no Rali da Argentina que quase o vitimou.
Mesmo sem o referirem, a verdade é que os pilotos foram tão longe, numa atitude inédita, porque estavam já preocupados com o estado descontrolado a que tinha chegado o desenvolvimento dos carros. Embora empurrando (legitimamente) a responsabilidade pelo sucedido para a inexistente segurança nas estradas e para o comportamento do público, pilotos como Walter Rohrl, Ari Vatanen, Hannu Mikkola e Henri Toivonen já só a custo aceitavam o esforço das equipas de tentar desresponsabilizar o “elemento mecânico”.
Infelizmente, não foi preciso esperar muito tempo para que a dimensão real do drama ficasse á vista. Menos de dois meses depois, a 2 de maio de 1986, um violento acidente no Rali da Córsega vitimava Henri Toivonen e o seu navegador Sergio Cresto, ao volante do Lancia Delta S4… nº 4! O fatídico número quatro que já tinha custado a vida a Bettega.
Ford, Audi e Lancia decidem quase instantaneamente abandonar o Mundial de Ralis. Todas as restantes equipas decidem cancelar os seus planos de desenvolvimento. O Grupo B é extinto no ano seguinte. As preocupações com a segurança passam a ocupar um papel central no que respeita ao desenvolvimento dos carros (estruturas reforçadas e motores limitados na potência).Por todo o mundo as organizações e, felizmente, os apaixonados adquirem um novo sentido das responsabilidades. Quando hoje ouvimos vozes criticando o “excesso de segurança” é bom que nos recordemos destes tempos. E, sobretudo, que segurança em excesso é algo que não existe.
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