Há muito que os cofres do Estado aguardam religiosamente as receitas provenientes dos pecados rodoviários. Mas, em 2021, a expetativa é ambiciosa como nunca: espera-se que os condutores transgridam o Código da Estrada em valores recordistas. Em relação a 2020 nem será difícil serem superiores, basta pensarmos que o ano teve longos períodos de confinamento e várias paragens de circulação automóvel entre concelhos.
O OE 2021 terá ainda de ser aprovado na especialidade, mas encontrará sempre nas coimas de trânsito uma especialidade. Segundo o documento, no próximo ano, para cumprir o OE, deverão ser cobrados 93 milhões de euros em multas. Mais 6,7% do que em 2020 – até Agosto a cobrança cifrava-se em 48,9 milhões de euros, face a uma expetativa de receitas de 87,3 milhões de euros.
Para o sucesso da operação, o Governo conta com a rede SINCRO (Sistema Nacional de Controlo de Velocidade) e aposta forte na implementação de novos equipamentos de controlo de velocidade média (tema de uma próxima crónica). O investimento na rede ronda os 8,5 milhões de euros, mas permitirá apanhar peixe pequeno e graúdo. Uma espécie de pesca por arrastão.
Com o país (e o mundo) em pára-arranca, torna-se mais difícil criticar assuntos escritos nas entrelinhas de um OE. Mas é quando se torna fundamental estar mais vigilante.
Pensar que as receitas provenientes das coimas de trânsito deveriam ser sempre excedentes, nunca contabilizados no OE, poderá parecer demagogia.
Mas a pergunta impõe-se: zelar para que todos cumprissem as regras de trânsito (e que, com isso, não colocassem em risco a segurança rodoviária) não deveria ser a prioridade do Governo nesta matéria? E não, pelo contrário, contar com as receitas desse incumprimento?