A Alpine proporcionou-nos um primeiro contacto com o mais radical A110 R, com a particularidade de nos dar ‘rédea’ livre no circuito de Jarama (Espanha) e também num percurso de estrada de cerca de 60 quilómetros que comprovou as competências deste modelo também fora dos circuitos. É radical e é bom.

Com uma filosofia mais extrema, o A110 R volta a elevar a fasquia dentro da sua própria gama, mesmo sem alterar aquilo que, muitas vezes, é considerado fundamental: a potência e o desempenho do motor.

Ao invés, a Alpine procurou obter uma maior leveza, seguindo de certa forma os princípios de Jean Rédélé, fundador da marca de Dieppe, de que um automóvel mais leve não só é mais rápido em reta, como mais ágil e veloz em curva. A ideia era, aliás, partilhada por Colin Chapman, fundador da Lotus…

A marca trabalhou, assim, em torno de três pilares: aerodinâmica, chassis e leveza. No caso da aerodinâmica, a silhueta já de si bastante esguia do A110 foi aprimorada com uma série de elementos que melhoram a sua prestação, sobretudo em pista. Um dos exemplos é o aileron traseiro com pilares curvos, naquilo que na gíria se chama de ‘pescoço de cisne’ – a asa está posicionada em plano ligeiramente inclinado e com os suportes curvos.

Ao nível do chassis, abre-se agora um maior espetro de configuração para o cliente ajustar o modelo a seu gosto, com uma suspensão revista e adaptável tanto em dureza como em ressalto (‘rebounding’, em inglês). Face ao A110 S, a altura ao solo foi revista e é agora 10 mm inferior, mas, em pista, o condutor pode reduzir mais 10 mm adicionais, para um total de 20 mm a menos. A marca francesa explica que a grande parte das alterações foi feita com o sentido de tirar máximo partido dos pneus Michelin Pilot Sport Cup 2, os quais são semi-slick, exigindo por isso algum cuidado no seu aquecimento.

Por fim, quando se pensa em redução de peso, o terceiro pilar, percebe-se que a Alpine não poupou esforços para algo que já parecia impossível: reduzir ainda mais o peso face ao A110 S. Aliciada pelo desafio, a marca de Dieppe olhou para o material que mais garantias dá neste capítulo – a fibra de carbono. Amplamente utilizada na competição, é aqui também aplicada em imensos detalhes, muitos dos quais já referidos: ‘splitters’ e saias laterais (com autocolante ‘Do not Walk‘ à semelhança do que se pode encontrar nas asas dos aviões), capot, tejadilho, cobertura traseira, aileron, difusor e jantes.

Este é um dos componentes mais impressionantes do novo A110 R, já que o trabalho minucioso da Duqueine permitiu conceber jantes altamente resistentes e leves, sendo possível levantar uma com apenas um dedo. No total, permitem reduzir 12,5 kg de peso, mas também aqui não se esqueceu o propósito funcional: as jantes traseiras têm um desenho mais fechado, melhorando a aerodinâmica em torno das mesmas (sabe-se que as rodas são dos elementos que mais perturbações oferecem à eficiência aerodinâmica).
Tendo em conta toda a dieta do A110 R, atingiu-se um valor de 1082 kg, menos 34 kg do que o A110 S.

Ato I: Na pista como um peixe na água

Este contacto divide-se, pois, em dois atos. O primeiro, no circuito de Jarama, um traçado clássico perto de Madrid que conta com alguns relevos naturais e muitas partes desafiantes, não faltando uma reta longa à qual se sucede uma travagem violenta para a primeira curva.

Perante o frio madrileno (cerca de 2º C), houve que aquecer primeiro os pneus Michelin Pilot Sport Cup 2, bastante sensíveis a esta questão, de forma a proporcionar as melhores doses de aderência. Não nos coube a nós, mas sim à organização da Alpine, pelo que ao agarrarmos o volante, já os pneus tinham alguma temperatura.

Sentados no A110 R, há que encontrar uma boa posição de condução, ajustando apenas o posicionamento do volante e a distância do banco que, integralmente em carbono, não tem ajuste de costas. Felizmente, é fácil encontrar a melhor posição para se atacar o circuito. Depois, é apertar o cinto de seis pontos e estamos prontos para a pista bem apertados na bacquet da Sabelt.

Na primeira volta, atrás do safety car, optámos pelo modo de condução ‘Normal’, mas nas outras três passagens a ‘sério’ optámos pelo modo ‘Track’, o qual coloca a caixa em modo manual/sequencial e acentua as respostas de todo o conjunto, ao mesmo tempo que coloca o controlo de estabilidade num nível mais permissivo (pode-se desligar, porém).

O que se pode dizer é que este Alpine é um dos automóveis mais divertidos e entusiasmantes de conduzir. A aceleração é poderosa, acompanhada de maneira ritmada por um ruído de escape que foi, também ele, melhorado para ser mais audível a bordo, com o característico ‘gorgolejar’ nas reduções de caixa. Se é verdade que o motor 1.8 turbo não tem mais do que 300 CV de potência, também é verdade que a redução de peso ajuda bastante a prestações fora de série.

O comportamento é um primor, sobretudo, pela imensa aderência que proporciona, oferecendo imensa estabilidade em curva, mesmo quando provocado. Jarama não é um circuito de falsas modéstias e exige alguma cautela, mas o comportamento do A110 R não tem qualquer falha. A frente é incisiva e reage com exatidão aos desejos do condutor, enquanto a traseira, ao invés de tentar libertar-se de maneira exaustiva, acompanha a dianteira num movimento de rotação que acaba por tornar as curvas bastante fáceis.

Bem exemplificativo do potencial do A110 R e do sucesso dos engenheiros da Alpine é toda a sequência que compreende a última curva (uma espécie de parabólica que é bem aberta), a reta da meta e a primeira curva: levantando apenas o pé na última curva (suavemente), o chassis não exibe queixumes, possibilitando assim que se chegue ao ponto de travagem para a primeira curva a mais de 220 km/h. Depois, a competência dos travões e a enorme estabilidade fazem com que a entrada e a saída dessa primeira curva, uma direita em jeito de cotovelo, demonstrem a motricidade em aceleração.

No total, as cinco voltas ao circuito apenas pecaram pela escassez…

Ato II: Aprovado para o dia-a-dia

Na segunda parte deste evento internacional, o teste passou para as estradas públicas em redor de Jarama, no qual o principal ponto foi a descoberta de que o A110 R também pode ser usado no quotidiano. Não sem os seus cuidados, porém. O maior de todos é que em lombas ou desníveis na estrada, há que pensar em não danificar o ‘splitter’ dianteiro em carbono, sendo assim imperativo reduzir a velocidade. A suspensão, notoriamente mais firme, permite ainda assim boas doses de conforto para os ocupantes.

Com poucas partes do percurso adequadas para ‘libertar’ o potencial deste A110 R, nas que existiam comprovou-se a enorme aderência, a motricidade quase sobrenatural e a poderosa competência de travagem. Mas, essencialmente, uma imensa sensação de confiança e de diversão que pode colocá-lo facilmente num patamar de discussão de ritmos e de sensações com outros modelos mais dispendiosos e, teoricamente, mais exclusivos.

Em suma…

A Alpine tem aqui uma das primeiras boas surpresas de 2023, com um desportivo mais focado no comportamento desportivo, mas que não esquece a vivência do dia-a-dia. Os 105.000€ podem parecer muito, mas depois de compreender todo o arsenal de tecnologia e de engenharia que foi levado a cabo em prol de maior dinamismo, estamos convictos de que a Alpine criou, sem margem para dúvidas, um automóvel de colecionador para mais tarde recordar como eram os bons desportivos com motor de combustão interna.

FICHA TÉCNICA
Alpine A110 R
Motor: Quatro cilindros em linha, 1798 cc, injeção direta, turbo, intercooler
Potência: 300 CV às 6300 rpm
Binário: 340 Nm entre as 2300 e as 6000 rpm
Transmissão: Traseira, caixa de dupla embraiagem de sete velocidades
Aceleração 0-100 km/h: 3,9 s
V. Máxima: 285 km/h
Consumo médio (WLTP): 6,7 l/100 km
Emissões CO2 (WLTP): 153-156 km
Dimensões: (C/L/A) 4526/1798/1252 mm
Distância entre eixos: 2420 mm
Pneus: 215/40 R18 (D) – 245/40 R18 (T)
Peso: 1082 kg
Bagageira: 100-96 litros
Preço: 105.000€

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