Hyundai Kauai Electric: É tão bom dizer adeus à ansiedade da autonomia

29/10/2018

O estilo nas imagens não lhe faz jus ao dinamismo que apresenta ao vivo. O novo Hyundai Kauai tem uma pose irreverente, que não é diminuída pela sua motorização elétrica, mas, ao invés, reforçada por isso mesmo. No entanto, o que sobressai mesmo é a proficiência tecnológica concedida por um conjunto motor/bateria de última geração que, acima de tudo, contribui para a eliminação da malfadada ansiedade da autonomia.

Para quem não está a par do termo é a designação que se convencionou dar à sensação constante de angústia pela perda de autonomia dos veículos elétricos, sobretudo muito presente nos modelos do início da década de 2010. Muitas vezes, o esvaziamento da bateria ocorria a uma velocidade muito mais rápida do que aquela que era esperada e isso, aliado, a uma rede de carregamento ineficiente e esparsa, ampliava então a tal ansiedade de autonomia.

No entanto, a evolução tem sido enorme nos últimos anos, com os fabricantes de veículos e de baterias a melhorarem tecnologias e a produção das mesmas. Chegamos a este Hyundai Kauai, então, um dos mais recentes membros da ‘comunidade’ automóvel elétrica, que deriva do Kauai a combustão, mas que recorre a um dupla opção de motores: a mais acessível debita 135 CV e autonomia no ciclo WLTP para 312 quilómetros e, a mais potente, que tivemos a oportunidade de ensaiar, uns muito frenéticos 204 CV (150 kW) e 482 quilómetros de autonomia, também apresentados no ciclo WLTP. Esta será, aliás, a única versão à venda em Portugal.

Natural expectativa para perceber se é mesmo possível cumprir uma vida normal com este novo Kauai elétrico sem estar constantemente a olhar para o painel de instrumentos e a congeminar cenários desastrosos de paragens indesejadas.

Ponto 1: Um valor encorajador

O primeiro indicador que salta à vista (no novo painel de instrumentos digital com ecrã de 7″) assim que carregamos no botão de ignição é o da autonomia: 457 quilómetros possíveis em modo ECO, fruto de uma bateria de polímeros de lítio com 64 kW. Encorajador, mas será que o valor pode ser realista? Os primeiros trajetos indicam que sim. O Kauai tem um funcionamento suave e a autonomia não desaparece a velocidade alarmante. Antes pelo contrário, replica quase de forma fidedigna os quilómetros percorridos. Quase.

Rapidamente se percebe que o Kauai é evolução na autonomia. Com este novo SUV é perfeitamente possível fazer uma vida normalíssima, sem padecer do já referido efeito de ansiedade da autonomia. Ora, ao cabo de 100 quilómetros, a autonomia oferecida pela instrumentação era de 371 quilómetros. A média de consumo energético foi de 11.7 kWh/100 km, isto sempre com o modo ECO ativado e sem consumos de ar condicionado, além de utilização ostensiva das patilhas de regeneração de energia atrás do volante.

Depois do teste de consumo de 100 quilómetros, já com ar condicionado e ativação do modo Sport, que permite acelerações dignas de desportivo (mas algumas incongruências de suavidade de condução), o consumo subiu para ainda assim muito elogiáveis 12.4 kWh/100 km, aqui num percurso com cerca de 25-30 quilómetros. Note-se que o ar condicionado ativado ‘rouba’ algumas dezenas de quilómetros de autonomia.

Ponto 2: Faísca McQueen

O trocadilho pode até parecer forçado, mas o Kauai EV tem mesmo uma ‘faísca’ no andamento, sendo super-reativo quando se pressiona o modo Sport de condução (através de um botão). A aceleração dos zero aos 100 km/h cumpre-se em 7,6 segundos, o que não é espetacular num sentido lato, mas que para o modelo em questão traduz prestações sempre muito vivas. Mas são as recuperações que realmente se destacam, tirando partido do binário elétrico (395 Nm) disponível no momento em que se pressiona o acelerador com mais força, fazendo mesmo patinar as rodas com a entrega mais repentina da potência, o que nem sempre é uma sensação agradável mesmo quando já se vai com alguma velocidade. Esta é uma das particularidades que poderá não agradar a todos, denotando algumas dificuldades de motricidade no eixo motriz, embora não seja nada que assuste quem procura um pouco de adrenalina.

É através das patilhas atrás do volante que se pode aumentar ou anular a força de regeneração de energia decorrente das travagens ou desacelerações.

Ultrapassagens ou arranques não têm qualquer tipo de dificuldade, mesmo que o uso continuado dessas façanhas lhe retire autonomia, como seria de supor. A relação única de caixa (que é manuseada a partir de quatro botões na consola central) também contribui para essa mesma rapidez de reações.

Se no modo Sport parece ganhar uma faceta desportiva, o modo Comfort e, sobretudo, o ECO conferem-lhe maior suavidade e eficiência na atuação, moderando a entrega da energia e dando mais primazia à poupança da bateria. Com frutos, como já se pôde ler anteriormente.

Ponto 3: O jogo das patilhas

Um dos truques para o bom aproveitamento deste motor elétrico e das capacidades da grande bateria está no manuseamento das patilhas atrás do volante, como se fossem as de uma caixa automática. Contudo, aqui, são para a regeneração da energia decorrente do rolamento.

Do lado esquerdo, incrementa-se o poder de regeneração, fazendo com que em cidade, por exemplo, seja um aliado constante na redução da velocidade, quase mais do que a utilização do travão convencional (pode reduzir velocidade em até 0.25 g). Do lado direito, reduz-se o poder de regeneração. Há quatro níveis e, entre o mais forte e o nulo, os efeitos na condução são notórios. Por exemplo, no nível mais baixo (que na verdade é o nível zero) não existe qualquer retenção e o Kauai pode deslizar livremente, sem perda de velocidade, mas também sem recuperação de energia.

Ponto 4: Nem tudo é ótimo

Apesar da eficiência da bateria e da força do motor elétrico, que parecem resolver a equação da autonomia, importa perceber que uma bateria de maior capacidade tem como contrapartida tempos de carregamento maiores, sobretudo quando se tem de apostar em tomadas domésticas. Já lá iremos.

Primeiro, num posto de carga rápido (DC) de potência de 100 kW, a bateria de 64 kWh carrega 80% em 54 minutos (numa estação de 50 kW, o tempo de carregamento é de 75 minutos), enquanto o carregador de bordo, de 7.2 kW, permite carregar em AC (corrente alternada) em pouco menos de dez horas (9h35m, para maior precisão).

Porém, numa tomada doméstica de 230 V, a espera é longa, rondando as 31 horas! Ou seja, não havendo alternativa poderá ficar com o veículo ‘ligado à tomada’ por muito tempo…

Além disso, contrariando de certa forma a noção elétrica de silêncio na condução, o Kauai Electric emite um chiar algo incomodativo, sobretudo quando tudo em redor está em absoluto silêncio.

Ponto 5: Confortável, mas ágil

Com 4,18 metros de comprimento, 1,80 metros de largura e 1,57 metros de altura, o Kauai oferece boa habitabilidade, mas não deslumbra neste aspeto, sobretudo quando se entra nos lugares traseiros. Ainda assim, permite viagens com conforto meritório para quatro adultos. A bagageira, com os seus 332 litros, oferece espaço mais do que suficiente para viagens curtas de fim de semana, havendo ainda que notar o espaço disponibilizado sob o patamar de carga na bagageira e que alberga o cabo de carregamento. Uma boa solução por parte da Hyundai.

O interior replica em grande parte o dos modelos com motor de combustão interna, mas varia na oferta de mais espaço para arrumação de objetos na consola central – uma vez que não há necessidade de túnel de transmissão – e do já referido painel de instrumentos digital que varia as informações apresentadas consoante o modo escolhido de condução. A boa construção é fator positivo de apreciação, mas não oculta a excessiva utilização de plásticos rijos no habitáculo, sobretudo quando se pensa no preço final acima dos 40 mil euros.

A colocação das baterias de polímeros de lítio sob o piso em posição central e ocupando quase todo o fundo do Kauai permite-lhe registar um baixo centro de gravidade e isso ajuda na dinâmica, dando-lhe agilidade em combinação com conforto. Todavia, em piso muito irregular, sente-se alguma secura do amortecimento, o que não desvirtua por aí além a apreciação geral de agradabilidade e de solidez ao volante com uma direção bem afinada.

No equipamento, o Hyundai também está em muito bom nível, com sistema de navegação de 8.0 polegadas com possibilidade de conexão ao Apple CarPlay, Android Auto e Bluetooth (adicionalmente, inclui subscrição gratuita de sete anos para LIVE Services, que oferece informação atualizada e em tempo real sobre meteorologia, trânsito e radares). De modo a melhorar a operacionalidade do veículo, o sistema também vem equipado com uma câmara de marcha atrás com orientações dinâmicas. Nos itens de segurança, o Hyundai SmartSense inclui a Travagem Autónoma de Emergência (FCA) com Deteção de Peões e Sistema de Manutenção à Faixa de Rodagem (LKA). O preço de 43.355€ não é propriamente acessível, mas veja-se o conceito geral e poderá ser contornável para quem procura, sobretudo, apelar a um lado mais sustentável da mobilidade.

VEREDICTO

O Hyundai Kauai Electric mostra que a marca coreana está a encarar de forma bastante séria a aposta elétrica. O SUV compacto de segmento B tem na autonomia um forte argumento, não só pelo valor que apresenta (é de crer que uma condução muito regrada pode fazê-lo chegar aos 500 quilómetros), mas sobretudo pela fidelidade com que a bateria é descarregada em condução.

As prestações eletrizantes traduzem uma forma de conduzir sempre despreocupada, capaz de mostrar uma energia desportiva quando assim é necessário – embora, em nossa opinião, não valha muito a pena abusar deste modo porque os modos Comfort ou ECO são mais do que suficientes para o quotidiano.

O preço pode ser o seu maior óbice, assim como sucede com uma grande ‘fatia’ dos elétricos no mercado, mas atendendo ao que oferece em termos de equipamento, economia e experiência de condução, este assume-se como um dos melhores modelos do género para quem olha para a eletromobilidade com ambição real de futuro. Que, afinal, está mesmo ao ‘virar da esquina’.

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