Um em cada dois consumidores afirma que o seu próximo carro será híbrido ou elétrico. Nove em cada 10 estão dispostos a pagar, no máximo, 35 mil euros por uma viatura elétrica. Estas são duas das principais conclusões de um estudo divulgado hoje pela Associação Automóvel de Portugal (ACAP), sobre a situação atual das preferências dos compradores de automóveis em Portugal para os próximos anos.

O estudo ‘As redes de retalho automóvel em Portugal – O presente e o futuro do sector [SIC]’ foi elaborado com base num inquérito realizado junto dos consumidores nacionais, com a ajuda de uma equipa de investigadores do ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade de Lisboa, sendo nesse documento bem evidente que a aposta em soluções de mobilidade mais verde e em tecnologia são cada vez mais uma tendência à qual as marcas e concessionários não poderão ficar indiferentes.

Os dados do estudo revelam que, num cenário mais favorável à eletrificação, o parque automóvel de veículos de passageiros ligeiros deverá, em 2025, ser composto por 12,6% de veículos elétricos e híbridos e por 87,4% de veículos movidos a gasolina e a gasóleo. Apesar da tendência crescente, e de os veículos híbridos e elétricos representarem mais de 50% das vendas de novos veículos ligeiros de passageiros em 2025, a substituição do parque automóvel far-se-á a um ritmo muito lento.

Refira-se, aqui, que as vendas anuais rondam as 200 mil viaturas, mas a dimensão do parque já ultrapassa os 5.2 milhões de viaturas, com uma idade média do parque automóvel de ligeiros de passageiros já nos 12,8 anos em 2020, muito acima dos números da média europeia ou da Áustria e Reino Unido (que ronda os oito anos).

A totalidade dos consumidores incluídos na amostra, por sua vez, está disposta a pagar um acréscimo de preço para poder usufruir de tecnologia adicional (conectividade, condução autónoma e entretenimento).

Reforço da aposta no digital

No que se refere às principais tendências futuras do consumidor português na aquisição e utilização dos produtos e serviços automóveis, a ACAP aponta que as conclusões revelam que 60% dos inquiridos está a considerar comprar um veículo nos próximos cinco anos e que, no processo de compra, 40% aposta numa combinação online/presencial. Por outro lado, 60% refere que prefere comprar virtualmente a um concessionário autorizado da marca e 30% diretamente no site do fabricante.

A expressão crescente da digitalização neste setor está já a alterar o modelo de funcionamento das marcas a operar em Portugal, que revelam, neste inquérito, a intenção de investir na digitalização dos processos, em lojas online e, também, em novos conceitos de retalho.

As marcas e concessionários terão, agora e mais do que nunca, de investir quer numa mudança de paradigma na forma como estão estruturados – e como atuam – quer na formação dos seus recursos humanos, que terão de estar preparados para dar resposta às tendências futuras do setor automóvel para 2025, que colocam em destaque a conectividade e a digitalização, a eletrificação, a mobilidade, a transformação ágil e o foco no cliente.

O impacto da pandemia

Nas duas últimas décadas, o volume de negócios do setor do comércio automóvel registou grandes oscilações, explicadas pela evolução do contexto económico internacional. É o caso da pandemia, que originou uma quebra considerável do volume de negócios no setor: utilizando o modelo ‘input-output’ para a economia portuguesa, pode concluir-se que a quebra na procura final dirigida ao setor do retalho automóvel ultrapassou os 3500 milhões de euros.

O valor da produção de todos os setores reduziu-se em mais de 5500 milhões de euros, o VAB (ou seja, o impacto no PIB) diminuiu quase 2500 milhões de euros e a receita fiscal sofreu uma diminuição de 16 milhões de euros, em resultado da diminuição do IVA.

Como se posiciona Portugal em relação a Espanha e Reino Unido?

O estudo ‘As redes de retalho automóvel em Portugal – O presente e o futuro do sector [SIC]’ integra, ainda, uma completa análise estratégica da situação atual do sector em países como Espanha, Reino Unido e Áustria. Ao analisar a questão da fiscalidade, por exemplo, Portugal é, comparativamente a Espanha e Reino Unido, o país com maiores encargos no registo automóvel ou no que se refere ao total de impostos indiretos no primeiro ano de consumo automóvel.

O documento incorpora, ainda, um plano estratégico para a competitividade do setor numa nova conjuntura e detalha como deverá ser realizado o ajustamento interno ao novo contexto e o que deve ser proposto ao Estado português. As principais necessidades passam, desde logo, pelo investimento na transformação de informação em conhecimento (‘big data’ ou ‘data analytics’) e pela adoção de metodologias ágeis para melhoria dos processos, para potenciar a inovação e para reduzir desperdícios.

Alargar a oferta de serviços de mobilidade, investir em tecnologia que permita aproveitar o potencial das áreas de serviço e peças, investir na requalificação das equipas para responder aos desafios digitais e, ainda, contratar talento – com destaque para três competências: digitais, análise de dados e transformação organizacional – estão, também, na lista de prioridades deste contexto de transformação e reajustamento.

O estudo contempla, ainda, e em função da evolução do sector e dos desafios que se perfilam, um conjunto de medidas no domínio fiscal, de incentivos estatais, da desburocratização dos procedimentos e da legislação laboral, como a alteração do modelo de transferência da carga fiscal, do momento da aquisição para o momento da circulação, a eliminação da dupla tributação (do IVA sobre o ISV) ou o impacto da pós-descarbonização na tributação automóvel. Destaque, ainda, para a recomendação que propõe que as alterações fiscais relativas às reformas dos incentivos à eletrificação passem, como acontece em Espanha, por uma forte expressão dos investimentos no sector, com apoio do Fundo Ambiental.

Um setor estratégico para a economia portuguesa

O setor automóvel agrega cerca de 32.900 empresas e apresenta, em Portugal, um volume de negócios significativo – equivalente a 7,9% da faturação total das empresas – e um cariz fortemente exportador, ao representar 14% das exportações nacionais. Além disso, o setor emprega mais de 160 mil trabalhadores, que se destacam pela sua qualificação, com acesso a formação profissional contínua e substancialmente acima da média portuguesa.