Ciclomotores e Motociclos que marcaram uma geração – Yamaha DT 125R

06/06/2022

Recuando algumas décadas, a Dual Terrain da Yamaha chegou ao mercado no final da década de 60 com a sua DT-1 e o sucesso foi imparável, tal como as declinações que foi tendo em termos de cilindrada: 50, 80, 125, 175, 200, 250, 350 e até 400, mas sempre com motores a 2 tempos! Em todas elas a ideia-chave era uma moto fácil, ágil, capaz de prestações interessantes fora da estrada, ajudada por suspensões de maior curso, elevada altura ao solo, pneus mistos e posição de condução endurista.

Aproveito, desde já, para esclarecer um equívoco muito comum e que já ouvi por diversas vezes: a Yamaha que Rambo (Silvester Stallone) “rouba” no filme “Rambo – a Fúria do Herói”, de 1982, e com a qual foge para as montanhas não é uma DT 250! É antes uma XT 250! Ainda que haja algumas semelhanças, a moto tem um motor 4 a tempos! Fica o reparo! Em caso de dúvida, vejam com atenção o vídeo!

Consoante os mercados em que era comercializada, a Yamaha adaptava-se aos gostos e regras vigentes, o que explica que nem todas as cilindradas tenham estado disponíveis em todos os mercados. Aliás, em Portugal apenas foram comercializadas as 50 e as 125, mas a vizinha Espanha já tinha as 80cc. De lamentar que nunca tenhamos tido a DT 175 ou, melhor ainda, a DT 200R, disponível em alguns países europeus ou América Latina, já que tem um motor bastante mais “cheio”. A olho nu mal se distinguem!

Mais estranho ainda, a sua concorrente Kawasaki KMX, além da versão 125, chegou a comercializar cá uma versão 200 e as diferenças são notórias já que o incremento na cilindrada torna o motor mais “redondo”, com muito mais energia (binário) logo nas rotações mais baixas e sem perder grande fulgor nos regimes mais altos. Eu próprio estive em vias de comprar uma, em vez da DT 125R!

Mesmo na atualidade a GNR continua a contar com os bons serviços da DT 125R em muitos dos seus postos. A que partilho está no Posto da GNR de Mação (obrigado pela simpatia e disponibilidade), é de 1995 e já ultrapassou os 50.000 kms, sendo bastante apreciada pelos vários guardas que a conduzem sempre que necessário. Os UMM partiram, mas as DTR ficaram e, imagino eu, vão continuar a prestar bons serviços à sociedade!

N.º 10: Yamaha DT 125R

A versão 125 da DT iniciou a sua comercialização exatamente no ano da nossa Revolução. Era ainda uma versão AC (air cooled), com travões de tambor em ambas as rodas, mas já com bomba de óleo (autolube) para a mistura. Pouco depois recebeu algumas melhorias, sobretudo ao nível de suspensões e a designação MX, sendo que o sucesso era já frenético.

Rapidamente conseguiu muitos entusiastas e foi o despertar para as motos de fora de estrada para muita gente, incluindo ao nível da competição, já que era perfeitamente possível melhorar a moto sem gastar uma fortuna, continuando a ter um motociclo legal para circular na via pública.

O sucesso era de tal ordem em Portugal que, no início da década de 80, a SiS (Sociedade Irmãos Simões de que já falámos) chegou a produzir no nosso mercado alguns exemplares com o objetivo de abastecer o mercado nacional e até proceder a alguma exportação, mas as coisas não correram bem com os japoneses e, infelizmente, o projeto teve vida curta. Era ainda uma versão AC, quando a LC (Liquid Cooled) já estava a chegar ao mercado. Ainda vão aparecendo algumas das montadas pela SiS.

Aliás, há quem diga que foi uma destas que inspirou o célebre tema dos Trovante “125 Azul”, publicado no álbum de 1987 “Terra Firme”. Também há quem diga que a musa foi uma Casal K270 azul de que já falámos. Infelizmente não sei a verdade e faço o mea culpa porque falei uma vez com o Luís Represas e me esqueci de perguntar-lhe!

Se alguém tiver oportunidade de falar com ele ou com o João Gil e esclarecer a dúvida… fico muito grato, a bem da cultura motociclística nacional. Se algum deles ler esta crónica e decidir partilhar… tanto melhor! Era a cereja no topo do bolo! Por enquanto, vivo na ignorância!

Ainda na primeira metade da década de 80 a DT 125 teve uma importante evolução e não apenas estética: passou a ser LC, ganhou um disco de travão dianteiro, uma válvula de escape YPVS (Yamaha Power Valve System), um “cérebro” YEIS (Yamaha Energy Induction System), sistema elétrico de 12 volts e, claro, mais uns pozinhos de motor, algo que dá sempre jeito, já para não falar nas melhorias de quadro e suspensões…

De qualquer modo, a “revolução” dá-se em 1988 com a chegada da DT 125R (mais conhecida simplesmente por DTR). Fora questões de cosmética, plásticos, suspensões… foi melhorada em especial a travagem com a chegada de um disco também atrás. Daí por diante o mercado das 125 em Portugal nunca mais foi o mesmo e a DTR tornou-se, tal como a DT 50, um caso de estudo! O sucesso foi de tal ordem que a comercialização se prolongou até ao fim do século XX sem grandes mudanças!

Só mesmo já neste milénio ocorreram algumas, caso do arranque elétrico ou de uma versão “supermotard” (X), mas já fica fora do alcance da nossa crónica, sendo que deixou de ser produzida em 2008, mas certamente que foram ainda vendidas unidades em 2009 e talvez até 2010. A saída do mercado acabou por se dever, essencialmente, a questões de natureza ambiental já que procura sempre existiu, mesmo para as versões catalisadas, com a potência bastante reduzida (15 cv).

A desta crónica é um exemplar de 1991 e apesar de não estar 100% original (algo cada vez mais complicado) está lá bastante próximo, como atestam os pequenos autocolantes originais no guarda-lamas traseiro ou na escora, junto à cremalheira. O grande mérito de estar em tão bom estado (não foi alvo de qualquer restauro “até ao osso” e, por exemplo, a pintura do quadro é a original) é ter sido do mesmo proprietário durante 29 anos!

Porém, nem tudo está (ainda) tão fiel como seria de desejar! Os autocolantes do porta-farol e laterais são algo duvidosos (acabam de chegar Inglaterra uma réplica dos originais, mas ainda não foram aplicados), as tampas laterais do radiador e depósito de óleo são as replicas da HP (corte arredondado na zona superior e não reto) e mesmo os foles cor-de-rosa tiveram que vir de Itália!

Os próprios manómetros são de uma moto dadora (os originais estavam já em muito mau estado e quase ilegíveis) e foram ali colocados com zero km’s. Aliás, como na DT 50, é vulgar retirar uma série de “coisas que só fazem peso”, caso dos manómetros, piscas, porta-couves, retrovisores, suporte da matrícula gigante (também conhecido por bacalhau ou rabeira), que ficam guardados ou servem para vender ou colocar mais tarde, se for caso disso.

A nível de motor mudou-se pistão e segmentos, após retificação do cilindro (o material do mesmo é bastante macio e permite várias retificações). O resultado é que em cada uma delas a cilindrada vai sempre aumentando ligeiramente. Levou ainda discos de embraiagem e o resto foi apenas limpo e verificado, caso do carburador, radiador, bomba de óleo ou da válvula de escape.

O escape (balão e ponteira) são os originais, coisa rara, mas não há como negar que existem muitas ofertas no mercado que permitem melhorar a performance do motor. Só montando outra ponteira já se consegue uma ligeira melhoria. Acresce que, com o passar do tempo, o balão acumula bastantes resíduos dificultando a saída dos gases de escape, aumentando os consumos e piorando o desempenho do pequeno motor, mas há solução para isso, nem que seja abrindo e voltando a fechar. Um bom soldador faz um trabalho de mestre…

Por falar em motor, com pequenas variações, foi também utilizado na TZR (versão carenada e naked) e até na TDR 125 (aqui com motor de arranque), sendo um motor caraterizado por uma resposta limpa e saudável e até bastante fiável, mas que exige cuidados, por exemplo ao nível da refrigeração, do filtro de ar bem limpo ou do uso de óleo de mistura da melhor qualidade possível. A caixa de 6 velocidades é um primor, tal como a facilidade de colocar em funcionamento.

Tomando como referência o ano de 1994, a DTR custava 588 contos, a TZR 765 e a TDR 555, sendo esta a mais acessível de todas. O sucesso era de tal ordem que, por exemplo em 1996, foi a moto mais vendida (646 unidades), seguida pela Honda CBR 600 F (554 unidades) e pela Honda CB 500 (529 unidades)

Continua a ser uma “motinha” adorável e é incrível a forma como consegue manter o seu valor com o passar dos anos. Esta seria ainda mais “valorizada” se fosse a versão de 11 kW, mas já lá vamos porque existe uma explicação, mais ou menos rebuscada para isso.

11 kW ou 16,9 kW?

Para muitos de nós esta pergunta pode não fazer sentido e quando ma colocaram pela primeira vez assumo que fui apanhado de surpresa, mas depois lá me explicaram: 11 kW são 14,75 cv e 16,9 kW são cerca de 22 cv. Ora, a carta de categoria A1 (obtida a partir dos 16 anos) permite conduzir motociclos de categoria 125, desde que não excedam os 15 cv!

Já nem vou entrar nos detalhes da relação peso/potência e o fator idade, mas o facto é que quem tiver a categoria A1 ou a carta de condução de ligeiros (B/B1) pode legalmente conduzir uma DTR, que tenha a indicação no DUA de 11 kw, mas se tiver 16,9 kw já não o pode fazer. E esta, hein? Como diria o saudoso Fernando Pessa!

Ora, em termos práticos, as motos são iguais e os limitadores, se é que existiram, há muito que foram retirados pelo que a performance também é a mesma, mas o número 1 ou o número 6 fazem toda a diferença! Mais engraçado ainda: há DUA em que no campo potência o que aparece não é 11, nem é 16,9 é apenas XXXXX.

Para ajudar à festa, parece nem sempre se consegue saber o que vai acontecer quando se efetua a mudança de propriedade. Quando fui fazer o Registo da mesma, no Livrete Original nada constava sobre a potência, mas o que me “calhou na rifa” foram 16,9 kW, mas podia ter tido sorte e constar antes 11 ou XXXXX, como já vi!

Mesmo as posteriores a 1998 nem sempre são de 11 kW, apesar Norma Europeia ligada às emissões poluentes, e à possibilidade de condução por detentores de carta de condução de automóveis, a chamada “Lei das 125”, que só foi adotada em Portugal com a Lei n.º 78/2009 de 13 de agosto! Apenas 11 anos depois!

Mesmo neste momento existe um incrível número de DTR’s à venda nos sites habituais, bem como toda a espécie de material, seja para lhe melhorar a performance ou simplesmente para a deixar um pouco mais original ou, pelo menos, com um aspeto mais próximo da origem, mas a esmagadora maioria das que existem estão bastante diferentes de como vieram ao mundo. Além disso, há bastantes importadas, por exemplo da Suíça, que servem apenas como “dadoras” de peças!

Muitas, ao longo da sua vida, sofreram imensas agruras, incluindo participações em passeios e provas de TT, bem como testes inolvidáveis à sua resistência, onde se incluem longas viagens com pendura ou a acompanhar motos mais potentes pelo que o pequeno motor circulava praticamente sempre de válvula de escape “aberta”.

Por falar nesta, é fundamental que a mesma esteja em bom estado e não vale a pena fazer com que “abra” muito mais cedo. Em caso de aquisição de uma DTR “perceber” o estado da válvula é simples. Ao rodar a ignição “ouve-se” o barulho do servofreio e a mesma a abrir e a fechar. Numa voltinha rápida sente-se o pequeno “coice” ali por volta das 6.000 rpm. Na dúvida, retirar tampa da mesma e observar a olho nu o funcionamento.

A performance, já de si aceitável, pode ser facilmente melhorada, por exemplo com este kit a 170 da Athena e demais periféricos, também ao nível da carburação e escape (esqueçam o escape original nestes casos), mas há quem vá mais longe e é bem conhecido o caso de alguém que, simplesmente, fez um swap completo de um motor de uma TZR/TDR 250! Sobre a performance nem comento, mas faço uma pequena ideia. Há até quem recorra ao motor de uma YZ 125 ou mesmo da YZ 250!!!

Recordam-se de na crónica 1 em que apresentámos a DT 50 do P. Oliveira com cerca de 100 cc e uma performance ao nível de uma DTR stock? Ora os resultados “equivalentes” conseguem-se “kitando” este motor até aos 200 cc (aproveitando até o kit original da Yamaha 200), mas o risco em termos de fiabilidade é real implica alterações noutras partes do motor, caso da embraiagem ou refrigeração.

Para terminar, a DTR é uma verdadeira clássica (até porque já existem muitas com 30 anos ou mais) e vai continuar a ter um lugar especial no coração dos portugueses. Mesmo as gerações mais jovens continuam a adorá-la e o material para a personalizar/melhorar/customizar, muito produzido em Portugal e até exportado, é abundante e a preços mais ou menos aceitáveis.

Assumo que não tenho planos de me “desfazer” da minha e que a “perder a cabeça” só mesmo talvez para uma TDR 250 (havemos de falar nela), mas sou o primeiro a dizer que não era a mesma coisa e que a DT 125R faz parte da nossa história motociclística e tem uma forte tendência para valorizar! Aliás, não considerando o fator inflação, chegam a aparecer à venda exemplares com custo superior a novas! Se são vendidas ou não por esse preço, essa já é outra questão!

Já fui abordado mais que uma vez a perguntar se tinha interesse em vender e já ouvi vários comentários abonatórios acerca da mesma, mas tem um lugar especial no meu coração. Até para a encontrar, tendo presente que queria uma num estado que fosse ao encontro do que procurava e a um preço razoável, demorei bastante tempo e fui ver várias antes de fechar negócio com esta! O objetivo é ficar mesmo similar à da foto.

Para este modelo em concreto existem várias fontes de informação em português, mas também referências noutras línguas e muita gente que “mexe” nelas quase de olhos fechados:

Revista Motojornal n.º 370 (1995): comparativo com as suas principais concorrentes;

Clube DTR: referência nacional incontornável;

Clube DTR Portugal: Na rede social Facebook, também com muita informação e material;

DT125R.UK: mais um bom ponto de acesso, em língua inglesa;

DT125.active board: novo recurso, também em inglês:

Yam2stroke.fr: fórum francês sobre as várias 2 tempos da marca;

Offroadingpro: conta a história completa do modelo, com muitos detalhes;

Para o próximo número vamos deixar as “oitavo de litro”, mas manter-nos nos país das gueixas. Pela primeira vez vamos debruçar-nos sobre um modelo a 4 tempos! Será uma pequena moto dual, mas com um perfil estradista. Resta esperar pela próxima sexta-feira!

Texto: Pedro Pereira