A MUBI – Associação pela Mobilidade Urbana em bicicleta e a Associação Zero apresentaram uma queixa contra a Câmara Municipal de Lisboa ao Ministério Público por estar a remover uma infraestrutura da Rede Ciclável Principal com o propósito de devolver 70 lugares de estacionamento. Estas duas associações consideram que esta ação viola o Plano Diretor Municipal (PDM), contradizendo ainda o MOVE 2030 “e afasta-nos dos Compromissos internacionais firmados pela autarquia”.
ESTA INTERVENÇÃO “AFASTA-NOS DO OBJETIVO DE CRIAR UMA CIDADE JUSTA, SAUDÁVEL E SEGURA PARA TODOS OS UTILIZADORES DO ESPAÇO PÚBLICO”, DIZEM OS QUEIXOSOS
Em comunicado conjunto, estas duas entidades referem que, diariamente, passam pela ciclovia da Avenida de Berna quase 700 pessoas em bicicleta, incluindo muitas crianças a caminho da escola. “Se esta for removida, haverá uma rutura na rede, hoje contínua, colocando-se em perigo quem hoje circula de bicicleta e reduzindo-se a viabilidade deste modo de transporte em Lisboa”.
MUBI e Zero acusam a autarquia de Lisboa de estar a fazer isto “com o propósito de devolver estacionamento onde este não é permitido, não é necessário e não é recomendado, pois prejudicará a velocidade comercial dos autocarros, numa via estruturante da rede de corredores dedicados à circulação de transportes públicos rodoviários, em implementação”.
Estas duas associações afirmam que “é com estupefação e tristeza” que assistem “a uma obra inadmissível em pleno século XXI, quando a emergência climática é amplamente reconhecida e as externalidades do abuso da utilização do automóvel privado, irrefutáveis”.
Normas violadas por autarquia
MUBI e Zero declaram que a obra que a autarquia está a realizar viola várias normativas essenciais para Lisboa. “Primeiramente, a obra viola o PDM de Lisboa (aprovado em 24 de julho de 2012 pela Deliberação n.º 47/AML/2012), ao desconsiderar as diretrizes que proíbem estacionamento em vias de 2º nível sem regulamentação específica. Além disso, a intervenção contradiz o MOVE 2030 – Visão Estratégica para a Mobilidade em Lisboa (aprovado em Assembleia Municipal a 28/01/2020), a qual indica a Av. de Berna como um dos Eixos de Hierarquia Principal da Rede Ciclável e define metas para a mobilidade sustentável na cidade, das quais a cidade se tem vindo a afastar. Contradiz também o Manual do Espaço Público desenvolvido pela própria CML e que reúne ‘recomendações e boas práticas’ a seguir por aqueles que ‘têm como missão e responsabilidade a construção e a gestão do espaço público’, no que aos espaços de circulação em bicicleta se refere. Esta obra de ‘anulação’ parcial da ciclovia da Av. de Berna contraria ainda as boas práticas e recomendações da União Europeia e afasta-nos dos Compromissos assumidos pela Cidade (Missão Cidades – 100 cidades com impacto neutro no clima e inteligentes até 2030 e European Covenant of Mayors for Climate and Energy)”.
De acordo com MUBI e Zero, a Câmara Municipal de Lisboa (CML), “sem ‘ouvir as pessoas’ e antes de concluir a auditoria à rede ciclável que ela própria encomendou, iniciou uma obra que ‘prevê a anulação da ciclovia unidirecional no lado norte da Avenida de Berna, em toda a sua extensão, e no lado sul, entre o Largo Azeredo Perdigão e a Avenida da República’, por onde passam quase 700 pessoas em bicicletas por dia. Incrédulos assistimos agora ao avançar da obra de remoção da ciclovia, apesar de uma petição com mais de 1000 assinantes, dos protestos ocorridos e de toda a polémica que esta obra, ilegal e em contramão, tem gerado”.
Assim e na sequência de diversos comunicados “que mostram preocupação em relação às políticas de mobilidade que vêm sendo seguidas no país, na cidade de Lisboa e na Avenida de Berna em particular; a indiferença por parte da CML em relação à petição ‘Avenida de Berna intervenção a pensar nas pessoas’ que conta com mais de mil assinaturas (mais de 800 online e mais de 200 em papel); e de manifestações públicas cabalmente ignoradas, face à continuidade dos trabalhos de remoção da ciclovia na Avenida de Berna que podemos observar, a MUBI e a Zero decidiram apresentar queixa da CML ao Ministério Público”, através de uma ação popular que deu entrada a 25/10/2023 no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
A MUBI e a Zero reivindicam a reposição imediata dos balizadores, para que aquele espaço não volte a ser ocupado com estacionamento tarifado, nem seja invadido por estacionamento indevido/gratuito.
Outra exigência é que a CML tome provisoriamente medidas mitigadoras que reduzam os conflitos naquele espaço-canal, tais como remoção de postes de sinalização e alteração do pavimento nas zonas de passeio que se inserem no referido espaço-canal, tornando claro para quem circula em bicicleta que devem circular devagar, dando prioridade ao peão, entre outras.
Enfatizam as associações que, “ao beneficiar o estacionamento automóvel em prejuízo da mobilidade em bicicleta e da fluidez do transporte público, a obra em causa contribui para uma cidade onde o tráfego e o congestionamento têm vindo a aumentar, a par com a poluição atmosférica – a qual recentemente valeu ao Estado Português uma condenação pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, pelo reiterado incumprimento dos limites à concentração de dióxido de azoto (NO2) em Lisboa Norte, Porto Litoral e Entre Douro e Minho”.