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Veículos elétricos “Made in China” deixam de ter incentivos em França

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O governo francês decidiu alterar as regras e os valores de atribuição de incentivos para a aquisição de viaturas elétricas, abrindo uma “guerra” comercial com a China.

 

Isto porque as autoridades gaulesas definiram uma lista de veículos abrangidos pelos novos valores e exclui os automóveis elétricos fabricados na China, mesmo que sejam de marcas não chinesas.

A lista de VE elegíveis para receber subsídio abrange cerca de 60 veículos que custem até 47 mil euros, para os quais estão disponíveis apoios por automóvel de €5.000 (€7.000 para famílias de baixos rendimentos).

Os veículos elegíveis devem atingir a pontuação mínima de 60 pontos numa escala de 80, de acordo com uma grelha desenvolvida pela Ademe, Agência de Gestão de Meio Ambiente e Energia (decreto de 19 de setembro de 2023, JO de 20). Isto inclui os materiais utilizados (aço, alumínio, etc.), a produção da bateria, a montagem e até o transporte até aos concessionários, tendo em conta os diferentes meios (barco, comboio, camião, etc.). A pontuação ecológica dos veículos pode ser revista trimestralmente.

No total, 22 marcas de automóveis elétricos fazem parte da lista divulgada pelo executivo, que inclui grandes fabricantes franceses como Citroën, Peugeot e Renault mas também outras marcas europeias como BMW, Fiat, Mercedes-Benz, Smart, Volkswagen e Volvo.

Estão disponíveis até 78 modelos diferentes. Entre eles, o Q4 45 e-Tron da Audi, bem como o BMW iX1, BMW iX2 e o ë-C4 da Citroën.

A razão para desta lista não fazerem parte modelos “Made in China” diz respeito à pegada carbónica da produção. Mais especificamente: as regras que estabelecem quais os carros com direito a subsídios estatais para a sua compra excluem modelos produzidos onde a eletricidade é gerada e transportada através da queima de carvão.

“Não subsidiaremos mais veículos que emitem muito CO2”, diz o Ministro das Finanças, Bruno Le Maire.

“OS FABRICANTES DE AUTOMÓVEIS SERÃO INCENTIVADOS A DESCARBONIZAR OS SEUS PROCESSOS DE PRODUÇÃO PARA TEREM ACESSO AO BÓNUS”, REFORÇA O GOVERNO FRANCÊS.

A agência Ademe, que supervisiona o processo, estudou a elegibilidade de quase 500 modelos e suas variantes para inclusão no esquema. De acordo com a Reuters, cerca de 65% dos VE vendidos em França permaneceram na lista, incluindo 24 produzidos pelo grupo Stellantis e cinco pela Renault. O Model Y da Tesla será elegível (é feito em Berlim), mas não o Model 3 (feito na China).

Ao ficarem excluídos deste bónus ecológico, automóveis como o Tesla Model 3, o Dacia Spring ou o MG4, produzidos na China, serão penalizados em comparação com os concorrentes produzidos na Europa.

A marca de veículos elétricos MG Motors, da chinesa SAIC, afirmou esperar que as novas regras afetem as vendas: “Há automóveis que perderão completamente a sua competitividade”, disse um porta-voz da MG à Reuters, acrescentando que a marca decidiu não solicitar o esquema de bónus para o seu modelo MG4 porque esse esquema foi “projetado para nos excluir”.

A INDÚSTRIA AUTOMÓVEL DA CHINA DEPENDE MUITO DA ELETRICIDADE GERADA A CARVÃO, O QUE SIGNIFICA QUE MUITOS ELÉTRICOS “MADE IN CHINA” DEIXARÃO DE TER INCENTIVOS.

Esta decisão representa um importante sinal que visa forçar à mudança para um fabrico mais sustentável por parte de economias como a chinesa, cuja produção está muito dependente de combustíveis fósseis e da queima de carvão para obter uma vantagem competitiva sobre a França, neste caso.

“A regulamentação na Europa torna os carros elétricos fabricados na Europa cerca de 40% mais caros do que os veículos equivalentes fabricados na China”, disse o CEO da Stellantis, Carlos Tavares, à Automobilwoche em Las Vegas no início deste ano. “Se a União Europeia não mudar a situação atual, a indústria automóvel da região sofrerá o mesmo destino que a indústria europeia de painéis solares”, diz Carlos Tavares, referindo-se a um conflito comercial anterior com Pequim, que viu a China dominar uma indústria de painéis solares que tinha sido largamente desenvolvida na Europa. “Acho que já vimos esse filme antes… É um cenário muito sombrio.”

Penetração de marcas chinesas, na quota de mercado de automóveis novos de passageiros vendidos na Europa Ocidental durante os primeiros quatro meses de 2023.

Estas novas regras afetam mais duramente os VE produzidos na China, onde uma grande parte da produção de eletricidade é baseada na queima de carvão, mas outros países serão afetados, como a Índia.

O governo francês já oferecia aos compradores de elétricos um incentivo em dinheiro entre 5.000 e 7.000 euros, com um custo total de mil milhões de euros por ano.

No entanto, um terço de todos os incentivos estava a ser canalizado para consumidores que compram VE fabricados na China, afirmam autoridades do Ministério das Finanças francês. Essa tendência ajudou a impulsionar um aumento nas importações e uma crescente lacuna competitiva com os produtores domésticos.

Que aumentos irão ter os modelos de fabrico chinês?

O Dacia Spring fabricado na China, que representa 1 em cada 10 carros elétricos vendidos em França, verá o seu preço subir de €15.800 para €20.800 sem bónus, de acordo com Les Echos. Também excluído da lista está o MG 4, um sedan elétrico de marca britânica de propriedade da SAIC Motor da China. Com preço de €30.000 antes do bónus, o VE atualmente detém 61,4% do mercado francês em termos de matrículas desde o início deste ano, relatou Les Echos.

O Model 3 da Tesla, que para a Europa é exportado da fábrica da Tesla em Xangai, também não é mais elegível para incentivos fiscais em França. No entanto, o Model Y, o VE mais popular do mundo, fez parte da lista, pois a sua montagem ocorre na Alemanha.

Outros exemplos: o Atto 3 e Dolphin da BYD deixarão de ser elegíveis. O Niro da Kia (montado na Coreia do Sul) e o Kauai da Hyundai (fabricado na República Checa) ainda são elegíveis para o bónus.

Quantos veículos ficarão de fora?
A maioria dos modelos EV premium não são elegíveis porque estão acima do limite de preço de 47.000 euros (por exemplo, Audi Q8 e-tron, BMW iX3, Mercedes EQE). Juntos, esses modelos representam cerca de 26% dos modelos ou 5% das vendas em França, de acordo com a Transport & Environment.

Carbon Border Adjustment Mechanism

Estas novas regras, que entram em vigor em França em 1 de janeiro, são um exemplo do tipo de medidas que a Europa adotará com a implementação do Mecanismo de Ajuste de Fronteira de Carbono (CBAM – Carbon Border Adjustment Mechanism), que taxará fortemente a produção industrial importada que emite carbono.

Inicialmente, o CBAM é um mecanismo que afetará principalmente a produção de cimento, ferro e aço, alumínio, fertilizantes, eletricidade e hidrogénio e as suas emissões de carbono. Mas à medida que o mecanismo for implementado, toda a produção industrial e o seu transporte deverão vir a ser integrados no CBAM, que irá taxar fortemente o carbono emitido. A produção industrial limpa e sem emissões de carbono será isenta de qualquer taxa de carbono.

ESTE TIPO DE MEDIDAS É UMA MENSAGEM PARA O MUNDO DE QUE A EUROPA ESTÁ A LEVAR A SÉRIO AS POLÍTICAS INDUSTRIAIS QUE POLUEM MENOS.

E se, a partir de 2024, os carros fabricados na China serão os mais penalizados pelas regras antipoluição da França, a partir de 2030, serão todos os tipos de produtos e serviços importados para a Europa que serão penalizados pelas políticas industriais não poluentes da Europa.

O que pode daqui resultar?

Os analistas da Schmidt Automotive Reserach declaram que esta medida vigorosa da França sobre os preços dos VE também pode fazer parte de uma estratégia Macron, com o objetivo de aumentar os custos de importação de VE para forçar os fabricantes de automóveis chineses a estabelecerem a produção no continente.

Na realidade, há fabricantes de automóveis chineses que já estão a fazer compras na Europa para encontrar localizações para as suas fábricas. A Ford, por exemplo, irá vender a sua fábrica de montagem em Saarlouis, Alemanha, e a BYD é um dos três licitantes.

Outro dado: a China ainda detém uma quota de 76% de toda a capacidade global de produção de baterias, de acordo com um estudo do Tribunal de Contas Europeu, e as suas empresas estão a começar a construir fábricas de células de baterias em toda a Europa.

Esta política de incentivos introduzida pela França poderá ser replicada por outros países europeus. A Itália, por exemplo, já manifestou interesse nesta abordagem.