Do Oregon a Seattle com a polícia à perna

18/04/2018

Pelo meio destas paisagens fantásticas da costa do Oregon encontramos pequenas vilas com casas e pequeno comércio quase sempre em madeira, pintada de cores suaves, que formam conjuntos típicos e bem enquadrados na paisagem.

Ao fim do segundo dia a percorrer o Oregon cheguei à pequena vila de Cannon Beach a que se segue Seaside, onde tinha reservado um hotel essa manhã. Era, dos baratos, o que estava mais bem cotado no booking e valeu a escolha. A miúda que me recebeu, mascarada de girafa por ser fim de semana de Halloween, prontificou-se logo a ajudar-me a carregar o saco para o quarto: “eu sou uma girafa, mas sou forte”. Numa pequena sala junto à receção tinham chocolates, bolachas e fruta que ela disse para tirar à vontade e anunciou que o pequeno-almoço podia ser tomado até às onze da manhã o que me soou lindamente, após vários motéis por onde passei em que acabava às nove. Depois apanhei a cama mais cómoda que encontrei no ultimo mês. Nesse dia deitei-me à meia noite, adormeci logo, como é meu costume, e só acordei às dez da manhã.

Tinha começado a chover durante a noite e não parou mais. Deixei o hotel ao meio dia e meia e, antes de partir de Seaside, ainda passei na praia a visitar um aquário local. Não tinha grande interesse para além de uns peixes estranhos e um grupo de focas que pareciam ter pouco espaço onde nadar. Fiquei a saber que as focas, antes de mergulharem, ao contrário do que fazem os humanos, expelem o ar dos pulmões, passando parte do oxigénio de que necessitam a ser fornecido pelo sangue e músculos, enquanto o ritmo cardíaco baixa das 100 pulsações por minuto que têm à superfície para 10.

Arranquei depois a caminho de Seattle, a trezentos e poucos quilómetros, onde ficaria essa noite. Escolhi uma estrada pelo meio do campo com as mesmas paisagens deslumbrantes que tinha visto nos dois dias anteriores, agora com menos costa mas mais lagos. Só que passei o dia sempre debaixo de chuva. Nas primeiras horas foi fraca e não representava um problema mas depois começou a aumentar de intensidade e, quando entrei na autoestrada, a 150 quilómetros de Seattle tornou-se torrencial. Para agravar a situação estava muito trânsito, com camiões a levantarem uma nuvem enorme de água, agravada por nevoeiro. Mantive-me à velocidade do trânsito compacto, cerca de 120 Km/h, e só esperava não apanhar uma daquelas carcaças de pneu de camião que às vezes saltam para a via pois, quando a visse, não teria tempo para me desviar.

Passava do Estado de Oregon para o de Washington, que não tem nada a ver com a cidade do mesmo nome e capital do país, que fica do lado Oriental.

A certa altura o trânsito abrandou muito, quase parando e, como em qualquer outro lado, comecei a passá-lo pela larga berma alcatroada. Até que comecei a ver, pelos retrovisores, umas luzes azuis e encarnadas que piscavam e passavam entre o trânsito ao som de uma alta sirene. Será que ele vem atrás de mim?

Passei para as faixas de rodagem e tentei portar-me com juízo, como se não fosse nada comigo. O carro à paisana, mas forrado de pirilampos veio até trás de mim e ali ficou, a fazer barulho. Perdi as dúvidas e encostei na berma. Desliguei a moto, mas fiquei sentado à espera que viessem ter comigo mas eles pararam atrás sem saírem do carro. Até que, por um altifalante me indicaram:

-“SAIA DA MOTO, SAIA DA MOTO”.

Desmontei e fiquei ao lado. O polícia que vinha ao volante saiu então do carro e veio ter comigo.

-Tem alguma arma consigo?

-Não

– Sabe que aqui em Washington não se pode andar na berma da estrada, nem andar a passar de uma faixa para a outra.

Só faltou dizer: Isto não é a balda da Califórnia. Aqui cumprem-se as leis.

-A sua carta de condução, por favor.

Olhou para a minha carta e disse:

– Você está a dar a volta ao mundo de moto?

– Sim

-Escreve para um blogue?

-Sim

-Conheço o seu nome. Um amigo meu segue-o.

Achei que o homem estava a delirar mas dei o ar que achava a coisa mais normal do mundo.

-Tem que tomar cuidado, disse-me, porque a última coisa que queremos é que tenha um acidente.

E pediu-me para esperar afastado da moto.

Ali fiquei uns cinco minutos à chuva a tentar imaginar quanto seria o valor da multa enquanto ele voltou para dentro do carro. Quando saiu, estendeu-me a carta de condução e disse:

Eu não o vou multar mas por favor tome mais cuidado e…não ande nas bermas.

Tinham-me dito que eles aqui nunca perdoavam e, por isso, não queria acreditar no que ouvia. Agradeci, disse-lhe que Washington era lindo e voltei à estrada.

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*Francisco Sande e Castro está a dar a volta ao mundo de moto e M24 publica o seu diário de bordo. Acompanhe-o nesta grande aventura

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