Uma manga picante e uma tigela de água para o banho

12/03/2017

Hoje acordei ainda não eram seis com o movimento de barcos no cais mesmo junto ao pequeno hotel. Acabei por voltar a adormecer e pelas nove da manhã fui a um restaurante ao lado, tomar o pequeno almoço e ver os mails. Parti para a praia onde embarcam a moto só às onze e meia. Por sorte estava lá um dos barcos de transporte que acabara de descarregar mercadoria para os restaurantes e bares da ilha.

Para atravessar a praia foi um festival parecido com o da chegada, mas desta vez correu melhor porque era a descer. Embalei de cá de cima e passei primeiro a parte em que tínhamos posto as pranchas para depois entrar na areia mole onde acabei por cair mas já perto da margem. O barqueiro ajudou-me a levantar a moto e a partir daí foi fácil.

A menina do bar da praia, com quem tinha acabado a noite no dia da festa, veio ao terraço da esplanada despedir-se com um ar amuado, por eu partir sem dizer nada.

Na margem do lado continental a subida de saída não tinha tanta areia mole, mas era muito íngreme. Tomei balanço e, estava quase no topo quando a roda da frente prendeu numa raiz de árvore e voltei a cair. Desta vez empenei a maneta do travão e magoei-me numa perna que no fim do dia estava com um inchaço.

Fui direito a uma bomba de gasolina pois já estava no fim da reserva depois dos passeios a três pela ilha e parti rumo à fronteira com o Cambodja, a uns 30 Km.

Pediram-me o Carnet para a moto, que já não usava desde a Índia. Tratei do visto e despachei-me com bastante rapidez.

Quando saí perguntei ao guarda de que lado da estrada circulavam ali pois eu tinha acabado de atravessar dois países onde se circula à direita, mas sabia que, pelo menos na vizinha Tailândia, circulam à esquerda. O guarda não percebeu a minha pergunta e mandou-me seguir pela esquerda, creio que para dizer que eu não precisava de entrar nas instalações da Alfândega, do lado direito.

Arranquei pelo lado esquerdo de uma estrada deserta e, passados uns quatro quilómetros, por sorte, o primeiro veiculo que encontrei era uma moto que circulava no mesmo sentido que eu mas do lado direito da estrada. Passei para o lado direito e, um ou dois quilómetros à frente um jipe em sentido contrário veio confirmar que agora é que estava na faixa certa.

Tinha percorrido uns dez quilómetros desde a fronteira  quando surgiu o desvio para a estrada que pretendia apanhar, a caminho de uma floresta que é reserva natural e que tinha curiosidade de visitar.

A estrada era de terra com algumas partes em bom piso mas outras bastante degradadas. Seria impensável passar aqui na época das chuvas. Nas partes em que o piso estava melhor podia rodar a 70/80 Km/h em quinta, mas às tantas apanhei um buraco maior sem estar à espera e a mala esquerda, a tal que tem o suporte inferior partido, saltou do sítio e voltou a raspar no pneu.

Rapidamente a recoloquei na posição certa e segui viagem. Pelas duas e meia da tarde parei junto a uma barraca onde vendiam bebidas e pouco mais. Comprei uma manga verde e uma garrafa de sumo que foram o meu almoço. A menina, quando me viu a fazer uma careta pela acidez da manga, ofereceu-me um frasco com uma colher do que me pareceu ser açúcar. Achei boa ideia e pulverizei a manga com aquilo. Acho que também tinha açúcar só que além disso tinha qualquer coisa muito picante. Dei uma dentada e fiquei-me por ali, com o ar divertido da miúda da loja e de outra que, do outro lado da mesa, dava de mamar ao filho.

O mapa indicava que a estrada iria melhorar mas, passados uns 60 Km cheguei a uma vila, junto a um rio, em que as ruas eram todas em terra batida. Pus gasolina em mais uma bomba manual ligada a um bidão e preparava-me para atravessar o rio de barco quando um rapaz me indicou que já era muito tarde para passar para o outro lado pois a estrada nessa outra margem estava em muito pior estado, com muita areia solta e o percurso até à cidade mais próxima eram perto de cem quilómetros. Decidi então ficar por ali a dormir, num pequeno “guest house” onde o banho é tomado com uma tigela com que se recolhe água num tanque existente na casa de banho e se entorna por cima. Soube-me bem depois de um dia muito suado.

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*Francisco Sande e Castro está a dar a volta ao mundo de moto e M24 publica o seu diário de bordo. Acompanhe-o nesta grande aventura

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