“Se pensas que estás velho para o rock & roll é porque estás”. Recordo a máxima de vida de Lemmy, lendário líder dos Motörhead, ao sentar-me, com alguma dificuldade, admitamos, na baquet Sabelt com estrutura leve, em couro do Alpine A 110S, pela primeira vez. O “S” serve para avisar que se trata da versão mais “salgada” do desportivo: 15% mais potente, mais rápido e eficaz. A carroçaria (rebaixada 4 mm nesta versão S) e o chassis são em alumínio; exibe um piso plano integral e um difusor traseiro e o tejadilho, em carbono e Dinamica, tem um acabamento brilhante. São vários os logótipos da Alpine, para nunca nos esquecermos da sua natureza. As jantes, em liga leve, são Fuchs de 18 polegadas, em cinza escura brilhante, deixando ver as pinças de alta performance da Brembo, em laranja, como para destoar com o branco pérola que compõe a carroçaria. Na traseira, destaca-se o generoso e audível escape desportivo ativo.
Todo o ambiente interior, de resto, reflete a agressividade exterior. Um ambiente pautado pelo couro preto com acabamentos mate e um nível de equipamento de topo, onde não falta um sistema multimédia com ecrã tátil de sete polegadas. Nos tempos modernos, a um desportivo lendário, não basta mostrar as suas competências na estrada, é preciso dar cartas na qualidade de vida a bordo, para justificar os quase 80.000 euros reclamados pela Renault para esta versão A110S do Alpine.
A premissa é a mesma. Se pensas que estás velho para um Alpine A 110S, no fundo, é porque estás. Por isso, não penses, penso, enquanto ligo o motor 1.8 Turbo de 292 cv.
O som rouco emitido pelo motor combina, na perfeição, com a voz de Lemmy. Tudo faz sentido. Como extra, esta versão, conta com um sistema de som focal, premium, capaz de satisfazer o mais purista dos sonoplastas.

Na coluna central do habitáculo encontram-se três vistosos botões: D, N e R. O primeiro, aciona o modo automático da caixa de dupla embraiagem, uma garantia de estabilidade e racionalidade na condução, perfeito para uma condução urbana; mas que, quando carregado uma segunda vez, ganha um círculo azul e transfere o comando e a responsabilidade das relações de caixa para as nossas mãos, através do recurso às pastilhas colocadas atrás do volante. São três os modos de condução: Normal, Sport e Track. O último, de longe, o mais adequado ao rock & roll.
Dos alpes franceses à Peninha
O Alpine está umbilicalmente ligado aos alpes franceses. Jean Rédélé, fundador da marca, em 1955, escolheu o nome do modelo como forma de homenagear o prazer que sentia, na juventude, ao conduzir o seu “4 cv, com caixa de cinco”, pelas estradas de montanha. “Nunca me diverti tanto”, garantiu em entrevistas. Dos alpes franceses à serra de Sintra vai um pulo de imaginação. O orçamento para o ensaio não permite mais. Peninha. É o que temos. Serve perfeitamente para fazer umas curvas e fica sempre bem nas fotos. Com sorte, há poucos automóveis pela matina e posso experimentar os dotes do Alpine 110S, que, segundo a marca, alcança os 260 km/h e cumpre a aceleração 0-100 km/h em apenas 4,4 segundos. Não tenho essa sorte, claro. E ainda antes de esgotar esses escassos segundos, já tenho colado à traseira um desportivo “rival” – faço questão de não o mencionar – conduzido por um entusiasmado jovem. O fenómeno é difícil de explicar. Mas muitos devotos do Fast & Furious sentem no ar uma espécie de química quando se cruzam com outro desportivo igualmente perto da casa dos 300 cv. Nesta altura entra o fator idade e a falta de paciência que a acompanha. Faço pisca para o deixar passar, mas logo percebo que ele quer brincar. Ou não esteja a abanar a traseira como um cão a correr sem trela. Não me orgulho muito dos minutos seguintes. Não muitos. Mas os suficientes para perceber a capacidade de fogo do Alpine A110 S. E para ganhar distância de picardias.

Com os 292 cv de potência todos colocados no asfalto, é possível sentir o nervo do desportivo. O binário de 320 Nm entre as 2000 e as 6400 rpm não deixa margem para dúvidas. A suspensão é firme e a direção, extremamente precisa, parece desenhar as curvas como um compasso. Mantém sempre a aderência, nunca foge de traseira (mantenho o controlo de estabilidade ativo, embora possa ser desligado), proeza a que não são alheios os pneus Michelin Pilot 4 Sport 4. Decido acabar com a brincadeira pouco depois. Dispenso a companhia. Encosto. E vejo o jovem entusiasta passar e desaparecer na neblina da Peninha, dois dedos acima das suas reais capacidades de piloto.
Rock & roll para sempre
Para o último dia de ensaio tinha a mais complicada das missões. Levar a minha velhota a uma consulta médica. Aos 88 anos tem todo o direito a reclamar sempre que a convido a entrar para um desportivo baixinho. Curiosamente, não blasfema quando entra e se senta, a três tempos, nos bancos desportivos. Garante-me que gosta da “bomba”, mas tem sérias dúvidas sobre a cor branca. Isso é cor de “frigorífico”. Do que ela gostara mesmo era do laranja vivo do Megane RS, onde eu um dia a levei a dar um passeio. Isso sim é uma “cor bonita para um carro”. Talvez isto não tenha nada a ver com a idade.
Alpine A110S
Motor 4 cilindros em linha
Cilindrada (cc) 1.798
Potência máxima (cv/rpm) 292/6.400
Binário máximo (Nm/rpm) 320/2.000-6.400
Velocidade máxima (km/h) 260
0-100 km/h (s) 4,4
Consumo combinado (l/100 km) 6,5
Emissões de CO2 (g/km) 166