Poucos automóveis exibem um conjunto tão forte de atributos como o Alfa Romeo Giulia Quadrifoglio: o seu belo fato italiano de mais fino corte, o acerto exemplar do chassis, a construção requintada e uma potência que, em abono da verdade, o atira para terrenos de superdesportivo. Apenas detalhes o separam a perfeição. Mas nós vivemos bem com isso.

O Giulia faz parte da história recente da Alfa Romeo por ser o primeiro modelo da sua ‘Renascença’, ou seja, do esforço levado a cabo pelo malogrado Sergio Marchionne, anterior CEO da Fiat Chrysler Automobiles (FCA), para colocar a marca italiana no patamar de destaque que merece. Da sua plataforma nasceu ainda o Stelvio, que é uma espécie de ‘meio irmão’ em formato SUV, com muitos componentes partilhados entre ambos.

Esta berlina italiana apontava a uma faixa de clientes que tem na condução o seu predicado principal de aquisição num automóvel, mas esmerou-se na conceção de um carro belíssimo, ao qual a passagem do tempo não retirou um grama de magnetismo desde que foi lançado em 2016. Especialmente, quando envolto na apaixonante cor vermelho Alfa ‘tricamada’ (opcional por 2500€) do modelo ensaiado.

O seu desenho permanece como um dos mais cativantes, se não mesmo o mais cativante do segmento (as marcas rivais Premium têm de admitir que este Alfa Romeo é de uma beleza singular), merecendo piropos e polegares estendidos em sinal de aprovação. Os pequenos detalhes apaixonam, como as entradas de ar no capot, os para-choques agressivos com elementos em fibra de carbono à frente (o splitter de atuação dinâmica) e atrás (o spoiler discreto na tampa da bagageira), o logótipo do trevo verde nas laterais (um claro aceno aos míticos Alfetta que dominaram a Fórmula 1 nos seus primórdios) e as exuberantes saídas de escape (duas em cada lado) que coroam um imponente difusor.

Porém, se o exterior pouco necessitou de melhorias, limitando-se a marca italiana a dar alguns retoques, como por exemplo, ao escurecer os farolins e a insígnia ‘Giulia’ na traseira, o interior foi alvo de maiores atenções. Assim se eliminou aquela que era uma das principais críticas que se poderiam fazer ao modelo desde o seu lançamento – agora, há um novo sistema de infoentretenimento com base num ecrã central tátil de 8.8 polegadas, para uma utilização muito mais intuitiva, embora se mantenha o comando rotativo entre os bancos da frente. Tudo melhor, muito melhor.

Além disso, o volante ganhou também um novo desenho (combinando pele e Alcantara no seu revestimento), enquanto o visual desportivo é reforçado pelos pespontos em verde e branco presentes no tablier e nos painéis das portas, num simbolismo de associação à identidade italiana, o mesmo que pode ser encontrado com a pequena bandeira junto à alavanca da caixa automática. De resto, o ambiente desportivo é intenso com uma tonalidade escura dominante, com couro preto combinado com fibra de carbono em diversas partes – por exemplo, no tablier. O túnel central exibe a sua fibra de carbono de forma orgulhosa, mostrando ‘ao que vem’.

Os bancos desportivos, de ajuste elétrico opcional, são de exímio suporte do corpo, com pele e Alcantara como revestimento. Em curva são valiosos aliados de condução dinâmica, mostrando-se fundamentais.

Como familiar, o Giulia permite que quatro adultos partilhem as emoções das viagens, ainda que a altura interior não seja brilhante e o túnel central seja melhor definido como uma divisória entre os lugares traseiros. No entanto, são apenas pequenos pecadilhos que não desvirtuam a sua competência para berlina familiar, até porque a bagageira também é profunda (ainda que o bocal seja relativamente estreito).

Orquestra das emoções

Por mais cativante que seja o seu exterior sensual, o lugar do condutor é especial. Uma prova de que a Alfa Romeo sabe como alinhar a sua filosofia desportiva com a atualidade. O volante tem uma pega excelente, destacando-se as imponentes patilhas fixas na coluna de direção atrás do volante para as passagens de caixa em modo sequencial.

O Giulia Quadrifoglio recorre a um motor V6 bi-turbo de 2.9 litros com 510 CV de potência, concebido pela ‘prima’ Ferrari em alumínio, que se assume como o elemento mais apaixonante de toda esta orquestra italiana. Mas, ao contrário do que qualquer um pensará, este motor é uma obra de arte extremamente adaptável a cada momento e não uma unidade embrutecida incapaz de viver com as mais simples tarefas do dia-a-dia.

Graças aos acertos específicos dos modos de condução D.N.A. (escolhidos a partir de comando rotativo no túnel central que tem ainda botão para o amortecimento variável), o motor tanto pode ser um ótimo companheiro de viagem nos modos ‘Natural’ e ‘Advanced Efficiency’, com respostas suaves e progressivas, sem brusquidão capaz de aborrecer os outros passageiros, como um superdesportivo balístico de reação pronta e intensidade máxima ao escolher os modos ‘Dynamic’ e, sobretudo, o ‘Race’.

É neste que reside a total impetuosidade da mecânica. A suspensão endurece, a sonoridade do escape torna-se bruta, a direção fica mais pesada e as passagens da caixa automática de oito velocidades desenvolvida pela ZF ficam com outro mapa de funcionamento. Além disso, a refrigeração entra logo em funcionamento, assumindo que a ‘música’ vai ser outra.

No modo ‘Race’, o Giulia Quadrifoglio torna-se numa real fera de circuito, desativando ajudas eletrónicas para deixar o condutor a sós com os seus instintos (e com as suas boas ou más decisões…). O que quer dizer que à intensidade da subida de regimes e recuperações (600 Nm de binário máximo), o chassis do Giulia revela a sua impecável conceção – uma outra obra de arte escondida pela obra de arte que é o exterior. É fácil ganhar entrosamento com a direção e com a coordenação do chassis (muito por culpa do trabalho de avaliação contínuo da condução pelo Alfa Chassis Domain Control), deixando o condutor experimentar um pouco mais em curva, testando mais um pouco dos limites. É aqui que percebemos como as suspensões são exímias e como a distribuição de peso equitativa em 50/50 joga a seu favor.

Graças à sua enorme estabilidade direcional, as passagens em curva são rápidas, mas o excesso no pedal do acelerador traz consigo uma tendência para sair de traseira. Natural, atendendo à configuração de tração traseira com vetorização de binário. Sem ‘rede de segurança’, a experiência de condução revela como é impressionante a capacidade mecânica deste automóvel e traduz, verdadeiramente, a definição de prazer de condução (pobres são aqueles que não acreditam neste termo) numa fase em que cada vez mais parece em extinção.

A disponibilidade do motor torna tudo muito mais rápido. Em percurso sinuoso, o que estava longe depressa se torna perto. O Giulia Quadrifoglio exige reflexos e leitura das condições do piso. As passagens de caixa são exemplares e a caixa parece estar sempre na relação certa para ganhar ritmo. Acelerando a fundo, o exercício dos zero aos 100 km/h cumpre-se em meros 3,9 segundos – melhor do que muitos superdesportivos há cerca de duas dezenas de anos. A travagem fica a cargo de poderosos discos perfurados em sistema desenvolvido pela Brembo, resistentes à fadiga.

Mas o carácter deste motor surpreende, tal como também já foi referido, pela sua versatilidade. Os modos ‘Normal’ ou ‘Advanced Efficiency’ permitem uma viagem com conforto e pacatez, como se não houvesse a brutalidade de 510 CV ‘ali’ à frente. Uma solidez de rolamento que também agrada, porque, apesar de termos um desportivo, nem sempre queremos andar em modo ‘quebra-costas’. E o Giulia é exatamente um bom companheiro de viagem também. Confortável e sólido na sua abordagem quotidiana.

Nem tudo é perfeito, sendo que apenas duas críticas lhe podem ser feitas, uma mais factual e outra mais subjetiva. A primeira é de que os consumos são elevados, o que é natural quando se lhe exige mais, mas nem tanto quando se envereda por uma condução mais pacata e regrada. Dificilmente baixará dos 12 l/100 km, sendo antes muito frequente andar pelos 13-14 l/100 km, mesmo com tecnologia de desativação de cilindros do bloco V6. A segunda prende-se com a sonoridade algo esbatida em praticamente todos os modos com exceção do ‘Race’. O modo ‘Dynamic’ também poderia beneficiar da abertura de ‘borboleta’ do escape para maior emotividade sem ter de optar pelo modo mais extremo.

O preço pedido pela Alfa Romeo para este Giulia Quadrifoglio é de 110.171€ e, embora muitos possam considerar elevado, ajusta-se perfeitamente ao que é oferecido – um manancial de sensações muito especial e com a capacidade de não ser extremista quando assim é preciso. Nota para o reforço nos assistentes de segurança, que incluem assistente de condução em autoestrada, assistente de saída de faixa e travagem autónoma de emergência, a que se junta ainda o reconhecimento de sinais de trânsito. Último reparo ao custo de alguns opcionais, que elevam o preço final nalguns milhares de euros.

VEREDICTO

Diz-se que o momento do adeus é o mais difícil em tudo. O momento de devolver o Giulia Quadrifoglio ao importador foi um desses momentos. Um automóvel que reúne as notas certas para uma melodia inesquecível – a beleza visual, a funcionalidade familiar e a conjugação de prestações com o chassis de atuação quase sobrenatural são dos itens que perduram na memória depois de sair desta máquina italiana de emoções fortes.

A motorização V6 é explosiva quando necessário, com uma atuação irrepreensível da caixa automática de oito velocidades que serve de coadjuvante perfeito. Depois, há a direção, que se deixa ler como um dos melhores livros e uma sensação de que há mesmo uma mecânica das emoções – uma que cativa, que clama e que exalta o prazer de condução. E, no final da viagem, estacionado, fica o sorriso rasgado do condutor e o olhar para trás na admiração daquela que é uma obra de arte da condução.


MAIS
Prestações extasiantes
Qualidade geral
Condução desportiva irrepreensível
Caixa automática
Funcionalidade
Reforço da tecnologia

MENOS
Custo dos opcionais
Bagageira com bocal estreito
Largura nos lugares posteriores
Consumos elevados

FICHA TÉCNICA
Motor Gasolina, 2891 cc, V6 a 90º, injeção direta, biturbo, intercooler
Potência 510 CV às 6500 rpm
Binário 600 Nm entre 2500-5000 rpm
Transmissão Traseira, caixa automática de oito velocidades
Dimensões (C/L/A) 4639 mm/ 1873 mm/1426 mm
Distância entre eixos 2820 mm
Aceleração 0-100 km/h 3,9s
Velocidade máxima 307 km/h
Consumo médio 10,4 l/100 km
Emissões CO2 236 g/km
Peso 1695 kg
Bagageira 480 litros
Pneus 245/35 R19 (frente) – 285/30 R19 (atrás)
Preço base 110.171€

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