Com aspiração a ser uma marca automóvel premium de alcance global, a Zeekr instala-se este ano na Europa, com um plano de produto ambicioso que inclui modelos para os segmentos mais importantes. Portugal também está nos planos, mas não antes de 2025.

Criada apenas em 2021, a Zeekr já é um caso de sucesso na China, com mais de 100 mil automóveis vendidos em tão curto espaço de tempo. Agora, apresta-se a chegar à Europa com vontade de desafiar as principais marcas premuim, preparando uma ofensiva de produto totalmente elétrica que irá começar com a carrinha estilizada 001 e com o SUV compacto X.

Embora seja uma marca novata na indústria, a Zeekr é mais um produto do gigante chinês Zhejiang Geely (comummente apelidado de Geely), cujo alcance na indústria automóvel supera fronteiras, sendo atualmente detentora de marcas como a Volvo Cars, Polestar, Lotus, Lynk & Co, Proton ou smart (esta numa parceria de 50/50 com a Mercedes-Benz). Beneficia, por isso, de um manancial de recursos bastante vasto (como a plataforma SEA utilizada em modelos da Volvo e da smart), mas também de um apoio financeiro que lhe permite desenvolver os seus próprios caminhos em matéria de design e de tecnologia, investindo fortemente na criação de um ‘hub’ multifacetado em Gotemburgo, na Suécia, onde beneficia de ferramentas de última geração (sobretudo, digitais) para o desenvolvimento dos seus automóveis ao gosto dos europeus.

Por esta mesma conjugação de fatores, Spiros Fotinos, CEO da Zeekr Europe, posiciona a marca num patamar vincadamente vanguardista e muito focado na tecnologia, com o seu próprio espaço dentro do Grupo Geely.

“No caso da Geely, as marcas são geridas horizontalmente, ok? Têm a Volvo, que é uma marca histórica com um longo legado, com um foco muito claro na segurança, muito conhecida e que é também uma companhia pública, com uma estratégia separada, com os seus acionistas e as suas próprias escolhas em termos de direção de portefólio de produto. Depois, têm a Polestar, muito mais orientada para o design, apontando para um cliente mais novo do que talvez o da Volvo e que também está cotada, o que quer dizer que os investidores na Polestar têm expectativas para que a companhia cresça e evolua, tendo as suas próprias escolhas no que podem ou não fazer. Há ainda a Lynk & Co, por exemplo, que está focada, primariamente, na experiência de partilha de mobilidade, uma marca que foi desenhada aqui ao lado, depois têm a Lotus, que não precisa de apresentações e por aí fora”, começa por explicar Fotinos, executivo grego que conta com um largo passado na indústria, destacando-se os 24 anos que passou ao serviço do Grupo Toyota.

“A Zeekr nasceu de uma folha em branco como uma marca puramente elétrica focada na mobilidade eletrificada avançada ou inteligente, o que quer dizer que o nosso posicionamento é um pouco mais orientado para a tecnologia, se assim posso dizer”, refere o grego.

“E dou dois pequenos exemplos desse posicionamento: o primeiro é que se olharem para o produto mais avançado que temos no grupo em termos de mobilidade autónoma é o robotáxi de Nível 4 [de autonomia] criado em parceria com a Waymo. É um produto da Zeekr. O outro é que se olharem para o conjunto de software disponível, esse não é da Google. É 100% da Zeekr, o que quer dizer que o investimento que fazemos nas capacidades de software, tal como a Tesla, por exemplo, é exclusivamente interno e que controlamos o nosso próprio ecossistema”, acrescenta, adiantando que isso se reflete, também, em aspetos como as atualizações ‘over-the-air’ esperadas de forma frequente para melhorar os automóveis e serviços.

Expansão faseada

A entrada da Zeekr na Europa faz-se de forma faseada, com os Países Baixos e a Suécia a serem os primeiros a receberem os 001 e X, no último trimestre deste ano. O plano prevê, depois, outros mercados, criados em bloco para facilitar o processo. Embora sem indicar datas concretas, a estratégia apresentada por Spiro Fotinos dá espaço para pensar numa entrada em Portugal em 2025.

“Os dois primeiros mercados são fáceis de perceber, porque são as duas casas da marca, onde temos uma pegada substancial na perspetiva do design e desenvolvimento, com cerca de 1200 pessoas dedicadas à Zeekr. Quanto à vaga seguinte de mercados, estabelecendo-nos na Suécia, é natural que depois nos expandamos para Noruega e Dinamarca para termos esse ‘cluster’ do ponto de vista logístico. Depois, juntamos outros dois ‘clusters’, França e Alemanha, que são os passos para o próximo ano, permitindo-nos partir para os que estão à volta, como a Bélgica. Depois, o passo seguinte será olhar para o Sul da Europa, onde temos Portugal, Espanha e Itália, antes de olhar para o Leste”, revela, adiantando ainda que a entrada nos mercados será feita com vendas diretas e não com acordos de parceria, “o que seria mais fácil, mas é algo que não está em linha com as ambições da Zeekr”.

“Não estamos a dar prazos concretos para os mercados A ou B, embora digamos que já temos alguns mercados na calha, porque se fôssemos do tipo de negócio que quisesse assinar um acordo com a Emil Frey ou com a Salvador Caetano [NDR: distribuidoras de marcas] era fácil: assinávamos um acordo e pronto, feito, estávamos no mercado. Mas quando queremos um modelo de negócio direto ao consumidor a partir de raiz, se eu entrar num mercado e quiser uma ‘flagship store’, por exemplo, e a licença para isso se atrasar dois meses por parte das autoridades da cidade, todo o meu plano é atrasado por dois meses, pelo que é mais complicado para nós dizermos uma data em concreto”, acrescenta ainda.

Oportunidade não só para os chineses

A ‘invasão’ dos construtores chineses é cada vez mais uma realidade na Europa, trazendo consigo novas abordagens, mas o CEO da Zeekr Europe encara o cenário atual como uma “oportunidade para todos, não apenas para os chineses. Não interessa o país de origem. O mais importante é que, como nós dizemos que é a nossa missão, estamos aqui para acelerar a transição para a mobilidade sustentada. Para mim, acelerar a transição para a mobilidade sustentada não é tirar um cliente a outra marca de elétricos. Quer dizer, claro que fico satisfeito também com isso, mas nesse caso não aceleramos nada. Se queremos acelerar essa mudança, temos de ir buscar os condutores de carros premium Diesel, esse é o alvo”, refere, enquanto propõe também uma abordagem pensada e calculada de criação de serviços de carregamento, sobretudo mais focados em ambientes domésticos, que permitam retirar da equação muitos dos receios associados à vivência com automóveis elétricos em termos de autonomia.

Garantida, também, está a conceção de que a Zeekr será uma marca premium para os vários segmentos, alertando, no entanto, para a questão da acessibilidade dos automóveis como um todo, não se podendo pedir aos construtores de elétricos que resolvam essa questão. “Pergunta-se se é um problema do veículo elétrico e eu digo que não. Não é um problema do veículo elétrico porque estamos a falhar o ponto principal, que é o aumento de custos que os automóveis tiveram nos últimos anos, devido ao aumento do equipamento de segurança e de tecnologia incorporada”.

Os custos da autonomia “não são de borla”

Nessa mesma questão, a tecnologia embarcada relacionada com a dos veículos autónomos também desempenha uma questão fundamental, perante a qual é preciso esperar uma maior adaptação de todo o mercado.

“É um tema interessante, porque quando falamos sobre condução autónoma, se perguntarmos a cinco pessoas diferentes, iremos obter cinco respostas sobre aquilo a que se referem em concreto. Penso que se for enquadrar o tema, de um lado temos o nível L4 de condução autónoma, que está a empurrar os limites na direção da autonomia. Do outro lado, temos o nível L2+, que significa ainda ‘mãos no volante’ na maior parte do tempo. O nível L2+ sabemos o que significa, proporcionando comodidade avançada ou características de segurança melhoradas, mas em que o condutor continua a ser o principal responsável pelo controlo e é isso que se vê nestes veículos. Depois, o nível L3 torna as coisas mais complexas, porque se olharmos para o L3 em termos de requisitos de hardware, passamos imediatamente de um sistema de câmara e de radar para um sistema LiDAR. Certo, adicionar um LiDAR não é muito difícil e temos essa capacidade, mas alguém tem de pagar por isso, neste momento. Se eu disser a alguém que pode comprar este carro com LiDAR e que a utilização do sistema permite ir de um sítio da autoestrada ao outro a 60 km/h ou a 80 km/h, essa pessoa irá dizer ‘sabe que mais, acho que ainda não está bem no ponto’”, especifica.

“Penso que o que vamos ver é essa capacidade rumo ao nível L3 a desenvolver-se à medida que o tempo passa e em que pode ser usado em mais cenários, mas não é apenas uma questão dos fabricantes OEM, é destes em primeiro lugar, porque temos de mostrar que temos essa capacidade, mas também é dos próprios governos. No que toca às políticas e regulamentações apenas a Alemanha e a França abriram um pouco as suas opções. O terceiro ponto é o do cliente, para que este confie o suficiente no seu veículo para se recostar e relaxar e para que faça sentido, porque, uma vez mais, alguém tem de pagar por isso e não é de borla”.

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